Fruticultura orgânica em larga escala é foco de projeto inédito na Bahia

A cultura do abacaxi é uma das que apresentaram melhores resultados até o momento no projeto. Foto: Tullio de Pádua
A cultura do abacaxi é uma das que apresentou melhor resultado a partir de projeto de experimentos da Embrapa, em parceria com a Bioenergia Orgânicos, de sistemas orgânicos de produção de diferentes frutas, na Bahia. Foto: Tullio de Pádua

A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em parceria com a empresa Bioenergia Orgânicos, está realizando uma iniciativa pioneira no município de Lençóis, na Chapada Diamantina, Estado da Bahia. Tratam-se de experimentos de sistemas orgânicos de produção de diferentes frutas, visando encontrar soluções para a produção em larga escala. O projeto, com duração de cinco anos, começou em 2011 e poderá ser renovado.

“A previsão é que a indústria entre em funcionamento em 2016”, afirma Osvaldo Araújo, um dos sócios da Bioenergia, empresa que fará o processamento de polpa integral para abastecer o mercado de suco. “Encontramos um parceiro (a Bioenergia) que nos colocou à disposição uma área de 80 hectares para pesquisa, que se tornou a nossa grande estação experimental de fruticultura orgânica, com a infraestrutura disponível e mão de obra”, conta o pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura, Zilton Cordeiro, coordenador do trabalho.

Segundo ele, a escolha da região deve-se ao clima favorável, água e solo mais adequados à fruticultura orgânica, com disponibilidade de terras virgens. Dos 80 hectares destinados aos experimentos da Embrapa, há 22 hectares de manga, 10 hectares de maracujá, dez hectares de abacaxi (essas três primeiras áreas já para escala comercial), três hectares de Spondias (nome científico da família do umbuzeiro e do umbu-cajazeiro), cinco hectares de acerola, três hectares de goiaba, três e meio hectares de citros, além de um hectare para experimentos de solos. Há ainda dois e meio hectares de viveiros.

Segundo a Embrapa, os primeiros resultados do cultivo de abacaxi e a de maracujá mostraram níveis de produtividade superiores ao convencional. As pesquisas estão desenvolvendo um sistema de produção para duas cultivares, a pérola, a mais plantada no País, e a BRS Imperial, da Embrapa, que não contém espinhos na coroa e na folha, o que facilita o manejo, além de ser mais resistente à fusariose, doença que chega a causar 100% de perda dessa cultura.

O pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura, Tullio de Pádua, afirma que a qualidade dos frutos tem surpreendido a equipe. “Os frutos do abacaxi Pérola, por exemplo, apresentaram média de peso entre 1,6 kg e 2 kg, o que difícil de ser conseguido até no plantio convencional”, comenta. “Acreditamos que o clima da região, tropical semiúmido, propicia o bom desenvolvimento da cultura.”

Pádua considera os primeiros resultados positivos, principalmente pela ocorrência de poucos problemas com a fusariose no Pérola. “O controle dessa doença é um desafio maior no sistema orgânico.” Já o BRS Imperial, apresenta baixa taxa de florescimento natural, por isso é feita a indução floral.

“Como essa cultivar parece responder melhor em relação a peso de fruto a um ciclo vegetativo mais longo, em vez de 12 meses, que é o padrão, fizemos a indução em 14 meses. O peso médio dessa variedade no sistema convencional é 1,2 kg. Obtivemos frutos acima desse peso no orgânico”, compara.

Inicialmente, a área destinada aos experimentos com abacaxi era de um hectare. As mudas produzidas estão sendo transferidas para uma área de dez hectares, já com o objetivo comercial, onde serão plantadas agora 300 mil mudas.

MARACUJÁ

Em relação ao maracujá, cuja meta era avaliar os melhores materiais genéticos para o sistema orgânico, considerando produtividade e resistência a doenças, a primeira etapa já foi concluída. Foram analisados 14 híbridos do programa de melhoramento da cultura, que envolve pesquisas da Embrapa Mandioca e Fruticultura e Embrapa Cerrados.

Os dois híbridos selecionados, BRS Sol do Cerrado e BRS Rubi do Cerrado, vão compor a área comercial de dez hectares. Para minimizar a ocorrência de vírus, principal obstáculo para a cultura do maracujá, os pesquisadores pretendem utilizar variedades precoces. Está em teste um sistema de produção em que se clona uma planta muito produtiva no campo. Dela é retirada uma estaca que é enraizada em ambiente protegido.

“Fizemos os clones das estacas na fase juvenil, assim rapidamente essa muda entra em processo de florescimento e frutificação. Quanto mais precoce o material, mais produzirá na ausência do vírus”, esclarece o pesquisador da Embrapa Raul Castro.

Pesquisador da Embrapa Raul Castro: “Nos experimentos, a produção de maracujá alcançou 36 toneladas por hectare, três vezes mais que a média nacional”. Foto: Tullio de Pádua
Pesquisador da Embrapa Raul Castro, em plantação de maracujá: “Nos experimentos, a produção de maracujá alcançou 36 toneladas por hectare, três vezes mais que a média nacional”. Foto: Tullio de Pádua

Na área, o plantio de maracujá também foi afetado pelo ácaro transmissor do vírus da pinta-verde, que dá uma aparência depreciativa ao fruto. “Estamos tentando controles com caldas e um inseticida orgânico, o enxofre, o mais antigo que se tem registro até hoje”, conta.

O pesquisador lembra que na medida em que se amplia a área de plantio, aumenta também a pressão de pragas e doenças. “Nos experimentos, a produção alcançou 36 toneladas por hectare, três vezes superior à média nacional”, destaca Castro. As avaliações dos experimentos com a manga, que é a cultura de ciclo mais longo da pesquisa, com cerca de três anos, ainda não foram concluídas.

“Das 22 variedades testadas, 3 apresentam maior potencial para processamento: a Ubá, a Palmer e a Imperial, porém há expectativas de que outras também sejam recomendadas,” prevê o pesquisador Nelson Fonseca. Segundo ele, o desafio da manga, no sistema orgânico, é a indução floral natural, que requer frio e o período seco.

“Na região de Lençóis, há um período frio, de maio a agosto, e nessa época também praticamente não chove. A união desses dois fatores seria como uma pré-indução. Isso pode favorecer em termos de florescimento e início de frutificação”, acredita. Um dos problemas da cultura nos experimentos é o controle da formiga (boca de cisco ou rapa-rapa).

“Testamos a manipueira (líquido que sai da mandioca durante a fabricação de farinha), no entanto temos dificuldade de obter o líquido novo, tirado na hora, para ser usado na área experimental. Também utilizamos cal virgem, mas não deu muito resultado”, relata o pesquisador, ressaltando que o uso da calda de sabão apresentou resultados no controle, porém, o custo de sua fabricação é alto.

A área destinada à manga está sendo ampliada de dez para 21 hectares. “Já temos cerca de 20 mil mudas para o plantio e vamos preparar 70 mil para 2015”, informa o outro sócio da Bioenergia, Evanilson Montenegro.

PARCERIA

A Bioenergia terá capacidade para processar 40 toneladas de frutas por dia em um turno. A empresa deve produzir 50% das necessidades e os outros 50% serão supridos por parceiros.

“Queremos desenvolver parceiros produtivos focados na agricultura familiar. Vamos fornecer a muda, o adubo a preço de custo e garantir a compra de 100% em contrato, e o produtor terá o compromisso de nos entregar, no mínimo, 50%”, diz Araújo.

Viveiro de mudas na Unidade de Pesquisa de Produção Orgânica em uma das fazendas da empresa Bioenergia, parceira da Embrapa. Foto: Alessandra Vale
Viveiro de mudas na Unidade de Pesquisa de Produção Orgânica em uma das fazendas da empresa Bioenergia Orgânicos, parceira da Embrapa. Foto: Alessandra Vale

Segundo o executivo, quando a empresa tiver as mudas em quantidade para distribuição, os parceiros serão selecionados a princípio em Lençóis e nos municípios em um raio de 100 quilômetros da indústria, como Bonito, Utinga, Andaraí e Piatã.

“Vamos começar com duas culturas entre um e três hectares para cada produtor, sendo o maracujá em consórcio com a manga. Enquanto as mangueiras crescem nos dois primeiros anos, o produtor tira duas safras de maracujá. Assim, o custo será reduzido e ele vai ter uma renda no fim do primeiro ano”, planeja.

A empresa Bioenergia assinou um protocolo de intenções com o governo do estado da Bahia para a instalação da unidade de processamento industrial, próximo às áreas de plantio. O projeto está sendo desenvolvido sob a orientação do Instituto de Tecnologia de Alimentos de Campinas (Ital).

Por equipe SNA/SP com assessoria

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