Cultivo de cana em áreas de pastagens melhora a qualidade do solo, diz pesquisador

Pesquisador Maurício Cherubin afirma que, “no Brasil, a questão do aumento da produção de bioenergia derivada de biomassa deve estar associada necessariamente ao aumento da produção de cana-de-açúcar, e consequentemente da produção de etanol e bioeletricidade”. Foto: Divulgação

 

O cultivo da cana-de-açúcar em áreas de pastagens extensivas para atender à crescente demanda por biocombustíveis não provoca a degradação adicional do solo. Em alguns casos, promove benefícios, entre eles o incremento da fertilidade e da matéria orgânica, que são fundamentais para o bom funcionamento do solo e o crescimento das plantas.

A constatação é de um recente estudo do pesquisador Maurício Roberto Cherubin, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da Universidade de São Paulo (USP). A pesquisa foi realizada no âmbito do programa de pós-graduação em Solo e Nutrição de Plantas, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (USP/Esalq).

Segundo Cherubin, áreas de pastagens extensivas normalmente apresentam solo ácido e pobre em nutrientes, compactado pelo pisoteio contínuo dos animais e com baixa infiltração de água, fazendo com que fique suscetível à degradação por erosão.

No entanto, diz o pesquisador, “quando estas áreas são convertidas para cana-de-açúcar, ocorrem mudanças significativas, incluindo a correção da acidez e da baixa fertilidade do solo causadas pela aplicação de calcário e fertilizantes, descompactação temporária pelo revolvimento profundo do solo antes do plantio, controle de ervas daninhas, pragas e doenças, tráfego intenso de máquinas, entre outros fatores. Ou seja, todo o ambiente solo é modificado com práticas de manejo”.

 

EXPANSÃO DE ÁREA

De acordo com Cherubin, nos últimos dez anos o Brasil passou de pouco mais de seis milhões de hectares de cana-de-açúcar em 2006/07 para cerca de nove milhões de hectares em 2016/17, ou seja, um aumento de cerca de 30% na área cultivada. “Estima-se que cerca de 70% dessa expansão ocorreu a partir da conversão de áreas ocupadas previamente por pastagem”, afirma.

“Este aumento de área levou a um incremento de produção, no mesmo período, de cerca de 30%, fazendo com que atingíssemos cerca de 660 milhões de toneladas de colmo na última safra (2016/2017). Com a expansão da área, nos consolidamos como o maior produtor de cana e o segundo produtor de etanol do mundo”.

Na visão de Cherubin, os principais caminhos para a produção de bioenergias começam a partir da expansão de área ou da intensificação de cultivo. “A expansão de área é o modo mais rápido, embora existam preocupações ambientais de como e onde esta expansão será realizada. No Brasil, a questão do aumento da produção de bioenergia derivada de biomassa deve estar associada necessariamente ao aumento da produção de cana-de-açúcar, e consequentemente da produção de etanol e bioeletricidade”.

No entanto, para o pesquisador, as atividades de expansão devem levar em conta fatores relacionados ao equilíbrio dos ecossistemas. “Não se pode pensar em expansão da cana-de-açúcar sobre áreas de floresta ou outras vegetações nativas, as quais devem ser preservadas pelos inúmeros benefícios ao planeta. De mesmo modo, é pouco promissor converter grandes áreas agrícolas para cana-de-açúcar, uma vez que haveria uma competição de terra entre a produção de biocombustíveis e a produção de alimento”.

Deste modo, conclui Cherubin, “o cenário mais promissor de expansão do cultivo de cana-de-açúcar é a partir da conversão de áreas atualmente ocupadas com pastagens extensivas, de baixa produtividade”.

 

RECUPERAÇÃO

O pesquisador afirma que as áreas de pastagem ocupam cerca de 200 milhões de hectares do território brasileiro e que grande parte dessas áreas apresenta algum estágio de degradação. “Assim, uma pequena melhoria na produtividade dessas pastagens poderia liberar uma grande quantidade de área, e isso é uma grande oportunidade para aumentarmos tanto a produção de cana-de-açúcar, quanto à área de outras commodities, tais como a soja e milho”, destaca.

Para Cherubin, o principal entrave para a expansão é a qualidade do solo nestas áreas. “A grande maioria das áreas com solo fértil é de alto potencial produtivo já estão sendo cultivadas com a cana-de-açúcar ou outras culturas agrícolas. Portanto, as áreas de expansão são até então consideradas ‘marginais’, de solo normalmente mais arenoso, pobres em nutrientes e com fraca estrutura física. Cultivar estes solos de modo sustentável e com retorno econômico torna-se um desafio ainda maior ao setor”.

Por outro lado, o pesquisador reconhece que atualmente o Brasil possui grandes extensões de terra abandonadas ou degradadas que poderiam ser incorporadas à produção de cana-de-açúcar, soja, milho e outras culturas bioenergéticas, sem necessidade de aumentar o desmatamento.

“Acredito que falta capacidade e viabilidade de investimentos do produtor rural para aumentar a área de cultivo, ou mesmo intensificar as áreas que estão sendo cultivadas para aumentar a produtividade”, diz Cherubin.

“Não tenho dúvidas que, à medida que o mercado se tornar mais atrativo para a produção de biocombustível, o Brasil terá condições de expandir sua produção. Entretanto, investimentos em pesquisas básicas e aplicadas, como esta que realizamos na USP, são fundamentais para que esta expansão da produção seja realizada de modo sustentável”, conclui.

 

Por equipe SNA/Rio

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