Bloqueio de caminhoneiros reflete gargalos da logística e infraestrutura do País

Em algumas partes do Brasil, a paralisação dos caminhoneiros já dura três semanas. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
Em algumas partes do Brasil, a paralisação dos caminhoneiros já dura três semanas. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

O bloqueio dos caminhoneiros em diversas estradas do País, que continua em alguns pontos do Brasil, como na Região Sul, refletem os gargalos da infraestrutura e logística nacional. A principal reclamação da categoria gira em torno do alto custo do transporte rodoviário: combustível caro, altos impostos, pedágios com preços elevados, entre outros. E de quem é a responsabilidade?

“Na verdade, a culpa (em relação aos transtornos causados pela greve dos caminhoneiros) surge a partir de um conjunto de fatores. Um deles é a questão da nossa infraestrutura, o que logicamente recai sobre o governo que não tem um planejamento adequado e que deixa acontecer esse tipo de situação. Outro fator é o modelo de modal implantado no Brasil, um modelo que é basicamente rodoviário e com poucas alternativas de transporte”, ressalta Bartolomeu Braz, vice-presidente institucional da Federação da Agricultura do Estado de Goiás (Faeg) e presidente da Associação dos Produtores de Soja (Aprosoja Goiás).

Ele ressalta que na Europa, Ásia e América do Norte, por exemplo, é possível ver estruturas e modelos diferentes e que dão certo. “Já no Brasil existe essa dependência assustadora do modelo rodoviário, que vem sofrendo crises e desgastes que se acumulam durante os anos. Hoje, cerca de 80% do que é transportado é por meio rodoviário. Se nós tivéssemos modelos hidroviários e ferroviários fortes para auxiliar neste momento, mesmo com a ineficiência e com os altos custos que o governo federal vem implantando, não estaríamos passando por essa situação”, acredita Braz.

 

Vice-presidente institucional da Faeg e presidente da Aprosoja Goiás, Bartolomeu Braz aponta que um dos reflexos do bloqueio dos caminhoneiros "é a questão da nossa infraestrutura, o que logicamente recai sobre o governo que não tem um planejamento adequado e que deixa acontecer esse tipo de situação. Outro fator é o modelo de modal implantado no Brasil, um modelo que é basicamente rodoviário e com poucas alternativas de transporte”. Foto: Fredox Carvalho/Faeg
Vice-presidente institucional da Faeg e presidente da Aprosoja Goiás, Bartolomeu Braz aponta que um dos reflexos do bloqueio dos caminhoneiros “é a questão da nossa infraestrutura, o que logicamente recai sobre o governo que não tem um planejamento adequado e que deixa acontecer esse tipo de situação. Outro fator é o modelo de modal implantado no Brasil, um modelo que é basicamente rodoviário e com poucas alternativas de transporte”. Foto: Fredox Carvalho/Faeg

Na opinião dele, os empresários, as pequenas empresas e os autônomos têm razão em suas reivindicações: o custo está muito alto em relação ao que recebem. “Está difícil para todos gerir seus próprios negócios. A alta linha de custo do Brasil em relação aos impostos, manutenção dos caminhões e agora o alto preço do combustível dificultam essa gestão equilibrada. Além disso, o mercado já não consegue absorver um número maior de fretes, uma vez que está muito caro”, destaca o vice-presidente da Faeg.

Braz aponta que os efeitos negativos para o agronegócio já são claros. “Houve desabastecimento, máquinas paradas no campo por conta do óleo diesel que não chegou às propriedades e a soja que deveria ter chegado, mas não chegou, ao primeiro armazém para a classificação e secagem, para prepará-la para exportação. Também tivemos exemplos de aves que não conseguiram chegar ao abate, assim como a falta de rações e embalagens nas indústrias de avicultura”, salienta.

 

PERDAS

Em relação à avicultura, a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) já estima os prejuízos, que podem passar de R$ 700 milhões. De acordo com cálculos da entidade, cerca de 70% da capacidade de abate do Sul (que é a maior produtora de aves e suínos do País) foi afetada nos dias mais graves do bloqueio.

Segundo a ABPA, a distribuição da ração para as granjas, a entrega de aves e suínos para o abate e a liberação das cargas prontas para exportação e para o abastecimento das gôndolas dos supermercados no Brasil foram afetados. “Desde o início dos impactos dos bloqueios, registrados pelas agroindústrias em 21 de fevereiro, cerca de 60 unidades frigoríficas apresentaram desaceleração ou suspensão total da produção”, destaca a entidade, em nota.

Diante do cenário, já que a Polícia Rodoviária Federal continua registrando bloqueios em algumas estradas brasileiras, as agroindústrias produtoras de aves e suínos continuam em estado de atenção, ressalta Francisco Turra, presidente-executivo da ABPA.

“Dezenas de empresas foram afetadas pela paralisação. Falta ração nas granjas, linhas de produção estão paradas, exportações foram afetadas. A greve tem custado caro ao setor produtor de alimentos no Brasil. Já temos relatos de animais mortos pela falta de insumos. Tudo isto coloca em risco a segurança alimentar da população brasileira", alerta o presidente-executivo da ABPA, Francisco Turra. Foto: Divulgação
“Dezenas de empresas foram afetadas pela paralisação. Falta ração nas granjas, linhas de produção estão paradas, exportações foram afetadas. A greve tem custado caro ao setor produtor de alimentos no Brasil. Já temos relatos de animais mortos pela falta de insumos. Tudo isto coloca em risco a segurança alimentar da população brasileira”, alerta o presidente-executivo da ABPA, Francisco Turra. Foto: Divulgação

“Dezenas de empresas foram afetadas pela paralisação. Falta ração nas granjas, linhas de produção estão paradas, exportações foram afetadas. A greve tem custado caro ao setor produtor de alimentos no Brasil. Já temos relatos de animais mortos pela falta de insumos. Tudo isto coloca em risco a segurança alimentar da população brasileira, com a eventual falta de alimentos nas gôndolas. Esta já é uma questão de segurança nacional. Entendemos o lado dos caminhoneiros, mas é preciso que o protesto respeite a segurança alimentar do brasileiro”, alerta Turra.

Em Mato Grosso do Sul, onde as paralisações já foram encerradas, Lucas Galvan, gestor técnico do Sistema Famasul (Federação da Agricultura de MS), avalia que os “efeitos das paralisações são de curto prazo, pois interrompem o fluxo de escoamento de nossa produção – soja, carnes, hortifruti, entre outros – e dificulta a chegada de insumos importante para o manejo nas fazendas, dentre eles o óleo diesel é o principal neste momento de colheita da soja e plantio do milho safrinha”.

Ele ainda diz que, “considerando que não haja mais bloqueios, não teremos grandes prejuízos, além dos que tivemos até o momento e que foram localizados”. “Não vejo efeitos em médio e longo prazo, pois para que isso acontecesse precisaríamos de meses de paralisação”, diz Galvan.

 

"Considerando que não haja mais bloqueios, não teremos grandes prejuízos, além dos que tivemos até o momento e que foram localizados. Não vejo efeitos em médio e longo prazo, pois para que isso acontecesse precisaríamos de meses de paralisação”, diz Lucas Galvan, gestor técnico do Sistema Famasul. Foto: Divulgação Famasul
“Considerando que não haja mais bloqueios, não teremos grandes prejuízos, além dos que tivemos até o momento e que foram localizados. Não vejo efeitos em médio e longo prazo, pois para que isso acontecesse precisaríamos de meses de paralisação”, diz Lucas Galvan, gestor técnico do Sistema Famasul. Foto: Divulgação Famasul

O QUE ESPERAR DO FUTURO

“Em médio e longo prazo, precisamos construir uma pauta em conjunto com todos os envolvidos na produção e venda, porque o transporte e a logística fazem parte dessa cadeia. Hoje a maioria dos produtores rurais tem seus caminhões e suas frotas, mas eles também vêm passando por essas mesmas dificuldades. Então, o futuro pode ser obscuro caso haja continuação nos aumentos de custos, o que pode atrapalhar toda a logística rodoviária, que já é precária e ineficiente”, alerta Bartolomeu Braz, vice-presidente institucional da Faeg e presidente da Aprosoja Goiás.

De acordo com ele, no que diz respeito à logística, os custos no Brasil são um dos maiores do mundo, exatamente por causa da “falta de modelos modais diversificados, causando complicações caso não haja um replanejamento e busca de outras alternativas de transportes”.

“Essas complicações serão mais diretas e, com essa economia em frangalhos, vários outros protestos poderão surgir e prejudicar a todos da sociedade. Imagine só se todos os caminhões do Brasil pararem, ficaremos sem alimento. É hora de se organizar e tratar toda essa problemática com mais seriedade”, afirma Braz.

 

AÇÕES DO GOVERNO

Pego de (certa forma) de “surpresa” pelo bloqueio dos caminhoneiros, o governo federal teve de agir de imediato. “A presidente (Dilma Roussef) já colocou alguns pontos: este de manter o preço do diesel por um período de seis meses é um deles e sancionou a lei (dos Caminhoneiros) sem vetos”, destaca o vice-presidente da Faeg.

“Entre os principais pontos, o fato de não cobrar pedágio quando o caminhão estiver vazio; perdão das multas por excesso de peso expedidas nos últimos dois anos; ampliação de pontos de parada para descanso e repouso; aumento da tolerância máxima na pesagem dos veículos e o fato de o caminhoneiro não ser responsabilizado por prejuízos patrimoniais, se uma ação for de terceiros são pontos que estavam nas demandas e foram atendidos”, pontua Braz.

Na avaliação dele, o aumento nas tarifas da energia elétrica também impacta de uma maneira ou de outra na questão dos transportes. “Em si, todos os setores demandados precisam se unir para que possam construir o planejamento de suas ações, delimitando períodos e se preparando para a variação dos preços das commodities, com o objetivo de impedir que os impactos cheguem à mesa do consumidor”, salienta.

 

SOLUÇÕES

“Nesse momento, as soluções seriam a diminuição do preço do combustível, dos tributos e dos preços dos pedágios. Mas também não podemos ficar presos a soluções momentâneas, como baixa dos custos, por exemplo. Devemos buscar soluções positivas e duradouras, mostrando que o setor precisa de reajustes de acordo com a inflação, afinal, tanto os empresários e caminhoneiros quanto o setor produtivo não devem absorver todos os custos sozinhos”, aponta Braz.

O vice-presidente da Faeg e presidente da Aprosoja Goiás afirma que “o governo deve entender esse processo de como é transportada nossa produção e ver sua ineficiência em não possuir modelos diversificados, tendo, às vezes, que subsidiar ou dar apoio a esse setor que é tão importante para o Brasil”.

Por equipe SNA/RJ

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