Em 2025 e 2026 o Brasil deverá manter a hegemonia no mercado internacional de açúcar
Apesar das dificuldades climáticas que impactaram o setor sucroenergético no atual ciclo de moagem, o Brasil continuará sendo o principal protagonista no mercado internacional de açúcar em 2025. Embora fluxos comerciais no primeiro semestre do próximo ano estejam vulneráveis a choques de oferta, a dependência global pelo produto brasileiro continuará robusta, ainda mais se as expectativas sobre um bom desempenho da produção na Ásia e União Europeia (UE) não se confirmarem.
Este é o consenso para três especialistas em análise de mercado que participaram da nona edição da série de Lives “Conexão SCA Brasil”, pelo YouTube. O CEO da SCA Brasil, Martinho Seiiti Ono, o head da Alvean para o Brasil, Júlio Adorno, e o diretor da Archer Consulting, Arnaldo Corrêa.
Segundo Martinho “As incertezas em relação à próxima safra em decorrência dos problemas enfrentados no processamento 2024-2025 suscitam muitas dúvidas em relação ao comportamento do açúcar, um produto precificado com muita antecedência. Portanto, em um período de encerramento de safra é sempre pertinente reavaliar dados e prever cenários futuros”.
Números da Alvean
Em relação à produção de açúcar no Centro-Sul do Brasil na temporada 2024-2025, cálculos da Alvean indicam um volume total de 39,5 milhões de toneladas, com possibilidade de queda, dependendo das condições climáticas e das decisões de encerramento das operações industriais. “Para 2025-2026, há algumas incertezas tanto sobre a moagem quanto o mix de açúcar, especialmente durante os primeiros quatro meses da nova safra, mas prevê-se a fabricação de 40 milhões de toneladas”, avaliou Júlio Adorno.
Segundo a Alvean, o Brasil é responsável por 50% do fornecimento mundial de açúcar. No ano passado, o País exportou 19 milhões de toneladas de açúcar bruto. Este ano foram 26 milhões de toneladas, um recorde histórico. De acordo com o executivo da empresa, uma das líderes no setor de açúcar, especializada na originação, comercialização e trading de açúcar bruto e branco, o movimento acelerado das exportações brasileiras do produto em 2024 se deve à eficiência da indústria açucareira nacional e ao maior espaço nos terminais de grãos.
Adorno detalhou a importância do Brasil na cadeia de fornecimento de açúcar, principalmente em relação aos estoques globais, que continuarão apertados: “O estoque no mundo não está aumentando, há dois anos não é remontado. Ou seja, os outros países não estão contribuindo de forma relevante para que o estoque seja reconstruído. Então, todo açúcar exportado pelo Brasil está sendo consumido rapidamente. Resumidamente, o mundo está conseguindo abastecer o consumo, mas não repor o estoque”.
Para o diretor da Archer Consulting, Arnaldo Corrêa, que trabalha com uma participação brasileira mais elevada, de 56,5% no mercado global de açúcar, o mundo está cada vez mais dependente do Brasil. “Eu costumo dizer que se o Brasil tiver uma gripe, o mundo do açúcar sofrerá uma pneumonia dupla”, enfatizou.
Em 2025 e 2026 o Brasil deverá manter a hegemonia no mercado internacional de açúcar. “A Tailândia não deve alcançar os níveis de fabricação registrados no passado face à baixa produtividade da cana e da mandioca, que teve um preço competitivo no passado. Para 2026-2027 é possível que ocorra uma recuperação relevante, mas não para a atual safra”, ressalta Adorno, da Alvean. Sobre a Índia, segunda maior produtora de cana depois do Brasil, o executivo não acredita em uma participação sólida no mercado internacional.
Consumo: O crescimento do consumo mundial de açúcar também foi explorado pelos especialistas durante a Live da SCA Brasil. Dados da Alvean indicam que os preços elevados em 2023-2024 levaram a um pequeno deslocamento do consumo em regiões como a América do Norte e Ásia. “No entanto, com os preços atuais, esperamos que o consumo de açúcar se normalize no curto prazo”, afirmou Adorno.
Caso haja um déficit no fluxo comercial do açúcar, a União Europeia (UE) tampouco resolverá o problema. “A UE precisa de subsídio para fabricar. No passado, já produziram em excesso e o mercado ‘caiu’, então os europeus não querem preço baixo, vão manter a produção deles em níveis para atender os mercados locais e cativos”, acrescentou Adorno.
Já Arnaldo Corrêa, da Archer Consulting, lembrou o crescimento do consumo de açúcar em países asiáticos, especialmente em Bangladesh, Paquistão e Indonésia, um mercado que soma mais de 1 bilhão de consumidores. “Na Indonésia, o consumo per capita aumentou sete quilos em dez anos, algo em torno de 700 gramas de açúcar por ano, o equivalente a vinte latinhas de Coca-Cola”, exemplificou.
Preços do açúcar
Em relação à previsão de preços do açúcar, o especialista da Archer Consulting apresentou levantamento dos últimos 20 anos, cuja base de cálculo leva em consideração os preços de Nova York, os transforma em Reais por tonelada e faz um ajuste final levando em conta o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). “Com isso, tem-se uma ideia mais clara de como os preços se movimentaram ao longo dessas décadas. De 2004 a 2024, em apenas 10% das vezes o mercado ficou acima de R$ 2.956,00 por tonelada, e em 90% das vezes ficou em R$ 1.609,00 por tonelada. São indicadores que servem de parâmetro para que as usinas avaliem se é o momento ou não para fixar preços”, observou Côrrea.
Sobre as cotações internacionais do açúcar, que variaram entre US$ 17 e US$ 23, com expectativas de oscilar entre US$ 19 e US$ 25 por tonelada, o especialista acredita que nas safras 2025-2026 e 2026-2027, o índice deverá aumentar. “Temos um potencial de elevar esse preço de 300 a 400 pontos. Ou seja, esse patamar de 18 centavos de dólar por libra-peso não vai permanecer”, avaliou Corrêa.
Efeito Trump
A eleição de Donald Trump nos Estados Unidos e reflexos nos mercados globais de commodities também estiveram em discussão. Arnaldo Corrêa analisou alguns pontos defendidos pelo próximo presidente americano, como o aumento nas tarifas de importação de produtos chineses. “De forma suscinta, é preciso entender que Estados Unidos e China vivem uma simbiose, ou seja, um precisa do outro. A China tem a maior reserva de dólares do planeta. Se ela quisesse utilizar essa reserva no mercado como medida de retaliação ao aumento de impostos, quebraria ambas as economias. Não haverá vencedores numa possível guerra comercial entre os dois países”, ponderou o executivo da Archer Consulting.
Corrêa complementou dizendo que um acirramento comercial entre as duas nações mais poderosas do mundo pode beneficiar o Brasil em certa medida. “O Brasil pode ganhar espaço nos grãos, que deixariam de ser comprados pela China dos Estados Unidos e viriam para nós. Então aí entra um ponto importante sobre como será a formação de preço do etanol de milho para responder a esse eventual processo”, afirmou.
Perspectiva de moagem
Considerando a deficiência hídrica da ordem de 400 a 500 milímetros em todas as regiões canavieiras, além dos incêndios de grandes proporções que atingiram 665 mil hectares (ha) de cana-de-açúcar em todo o Brasil, sendo que deste total mais de 465 mil ha foram no Estado de São Paulo, projeções da SCA Brasil indicam ao final da temporada 2024-2025 que a moagem poderá variar entre 606 e 608 milhões de toneladas.
Segundo Martinho Ono, o índice Tonelada de Cana por Hectare (TCH) vem apresentando uma tendência de queda. O TCH médio acumulado no final de outubro foi de 80,1%, uma queda de 10,4% em comparação aos 89,4% verificados em igual período de 2023. Até o final da safra, dados também apontam para uma expansão na área do canavial, chegando a 7.725 hectares (ha) versus 7.480 ha, um aumento de 3,3% em relação ao ano anterior.
O executivo da SCA enfatizou que os problemas verificados na atual safra impactarão o próximo ciclo agrícola, em 2025-2026, cujo processamento deverá ser de 565 a 585 milhões de toneladas de cana. “Haverá problemas com germinações desiguais, cana com menor TCH, em especial na primeira metade da safra, morte de soqueiras, pior qualidade de plantio e atraso do desenvolvimento da planta e pragas/doenças. Em síntese, em 2025 deve haver necessidade de mais replantio e menor área disponível para colheita”, disse Ono.