A Sociedade Nacional da Agricultura (SNA) sediou, na última sexta-feira (28/4), o seminário “Autocontrole: alternativas para assegurar a Saúde Pública e Animal”, organizado pela Sociedade Brasileira de Medicina Veterinária (SBMV) e pela Academia Brasileira de Medicina Veterinária (Abramvet).
O evento recebeu especialistas para discutir a importância da Lei nº 14.515, de 29 de dezembro de 2022, aprovada em janeiro deste ano, que determina às empresas que atuam na produção agropecuária a criação de sistemas de autocontrole sanitário.
Na abertura do seminário, Carlos Alberto Bastos Reis, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Veterinária (SBMV), considerou a aprovação da lei um avanço importante, mas admitiu que “a legislação ainda terá de passar por algumas regulamentações”. Reis destacou ainda a evolução da inciativa privada no âmbito da atuação médico-veterinária.
Josélio de Andrade Moura, presidente da Academia Brasileira de Medicina Veterinária (Abramvet), ressaltou a importância da atuação dos auditores fiscais veterinários para o desenvolvimento da pecuária no Brasil com qualidade e segurança sanitária. “O parque industrial brasileiro, de carne, peixe, aves, leite, está entre os melhores do mundo”, disse Moura. “Não devemos a país nenhum em questão de qualidade dos alimentos que chegam à mesa do consumidor”.
Parceria com o setor privado
A diretora do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal (Dipoa) do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa), Ana Lucia de Paula Viana, afirmou que “os mecanismos de autocontrole na pecuária brasileira não são novidade e vêm sendo adotados com sucesso desde 1950”. Ela destacou que, hoje, o Brasil conta com 3300 estabelecimentos registrados pelo Serviço de Inspeção Federal (SIF) e outros 4348 estabelecimentos para produção de alimentação animal registrados.
Segundo Ana Lucia, “dividir as responsabilidades de monitoramento com a inciativa privada é uma maneira de otimizar o trabalho de inspeção”. Além disso, para a diretora do Mapa, a tecnologia adotada pelas empresas do setor agropecuário deve ser valorizada e aproveitada pelo setor público. “O serviço oficial tem de repensar a sua atuação no processo produtivo para otimizar suas atividades. O que a informatização e a certificação eletrônica vão propiciar é focar, racionalizar e atuar de maneira mais assertiva”.
Ana Lucia lembrou ainda que a Lei nº 14.515 não substitui o trabalho dos auditores fiscais do Mapa. “O serviço oficial avalia se a verificação e monitoramento dos processos produtivos da empresa estão adequados”.
Saúde e sustentabilidade
Sula Alves, diretora técnica da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), declarou que há “um mal-entendido” sobre o conceito de autocontrole, justificando que tais mecanismos não diminuem a enorme a importância da pecuária brasileira em relação aos critérios sanitários em sua produção. A diretora da ABPA lembrou que a sustentabilidade, “tema tão importante no mercado internacional”, também envolve a questão da sanidade animal. “Somos um país que alimenta o mundo. Saúde pública e saúde animal são responsabilidade de todos nós. Sem saúde animal, não existe sustentabilidade. Sem fiscalização, não existe sustentabilidade”.
Vigilância nas fronteiras
A Lei nº 14.515 instituiu também o Programa de Vigilância em Defesa Agropecuária para Fronteiras Internacionais (Vigifronteiras). José Luiz Ravagnani Vargas, diretor do Departamento de Serviços Técnicos (DTEC) do Mapa, destacou que o Vigifronteiras envolve parcerias com grandes órgãos e instituições. “O controle de fronteiras é responsabilidade do Governo Federal. Trabalhamos de maneira integrada com a Polícia Federal, Polícia Rodoviária, Forças Armadas, Ibama, e governos estaduais”, explicou.
Integração de serviços
No painel “Integração dos serviços veterinários oficiais e privados”, o diretor do Departamento de Saúde Animal (DAS) e auditor fiscal agropecuário do Mapa, Eduardo Azevedo Pedrosa Cunha, falou sobre o universo de atuação dos médicos veterinários na saúde animal, considerando atividades como prevenção e controle de doenças, rastreabilidade, resistência antimicrobiana, bem-estar, coordenação dos insumos pecuários, registro genealógico, dentre outras.
“Desde o início da produção primária no Brasil, as responsabilidades entre serviços veterinários privados e oficiais são compartilhadas, por meio de decreto, com poder de lei, publicado em 1934, que regulamentou o registro de defesa sanitária animal vigente até os dias atuais. Posteriormente, surgiram outros decretos, leis, legislações ministeriais e da Secretaria de Defesa Agropecuária tratando sobre esta integração de serviços”, ressaltou Pedrosa.
Além disso, ele citou números referentes a rebanhos e propriedades das 27 unidades da federação e mais de cinco mil municípios. Segundo o auditor, há mais de cinco milhões de propriedades rurais no País, além de cerca de 218 milhões de bovinos bubalinos, 39 milhões de suínos, mais de seis bilhões de aves, 35 milhões de ovinos e caprinos e cerca de sete milhões de equinos.
Corporativismo positivo
O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários (ANFFA Sindical), esteve representado no evento por seu diretor, Antônio Araújo Andrade Júnior, que mostrou sua visão de corporativismo positivo, onde “os interesses da carreira são similares aos do interesse público”.
Ao comentar a Lei nº 14.515, Andrade destacou, como pontos positivos, “a obrigatoriedade, por parte dos agentes privados, de desenvolverem um programa de autocontrole, e o registro único para estabelecimentos e produtos”.
“Como quesitos que merecem atenção, cito a regulamentação, uma vez que, pela lei, é criada uma Comissão Especial de Recurso formada por cinco componentes, sendo dois da iniciativa privada e três do serviço público. Para que se mantenha a lisura dos trâmites, os componentes públicos devem ser servidores de carreira”, defendeu o sindicalista.
Em relação aos principais gargalos da Lei, Andrade observou que o texto não impõe limites no credenciamento de pessoas jurídicas ou habilitação de pessoas físicas para a prestação de serviços técnicos ou operacionais relacionados às atividades de defesa agropecuária. “Também é preocupante a grande carência de informatização em todas as áreas do Mapa e a dificuldade de implantação de novos sistemas, segundo dados do TCU”, enfatizou.
Alinhamento de conduta
Por fim, a diretora do Sindicato dos Médicos Veterinários do Paraná (Sindivet), Andréia de Paula Vieira, abordou a questão da ética profissional, comentando sobre os procedimentos profissionais que devem ser adotados no autocontrole, segundo a lei atual.
“Do ponto de vista de análise de risco, ainda temos muito o que desenvolver para realmente representar a saúde única nas questões de defesa agropecuária. Discutir este tema é extremamente necessário para que consigamos mapear a situação real. Também é de fundamental importância o alinhamento de conduta, a troca de saberes entre os níveis federal, municipal e estadual para desenhar este mapeamento”, concluiu Vieira.