O impacto da greve dos caminhoneiros ainda pode ser sentido. Dentro e fora da porteira, as consequências, por mais que analisadas, ainda pegam muitos de surpresa. Enquanto o tabelamento do frete é debatido em Brasília (DF), o choque de oferta sobre a economia, como reflexo da paralisação, motiva seminário a cargo da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Para debater esta questão, a FGV Crescimento & Desenvolvimento realiza, nesta sexta-feira, 31, um seminário sobre Precificação de Combustíveis.
Segundo a organização, o ato vai reunir agências de regulação, distribuidores de combustíveis, representantes do agronegócio e especialistas na indústria do petróleo. Isso, em um momento em que a reação do governo gerou distorções que afetam negativamente a produtividade e, por consequência, o crescimento econômico. Vice-presidente da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), Helio Sirimarco (foto) é um dos palestrantes.
Na ocasião, serão propostas alternativas de precificação. O evento, que conta com o patrocínio da Plural, será composto por dois painéis coordenados pelo economista Roberto Castello Branco, diretor da FGV Crescimento & Desenvolvimento e membro do Conselho de Economia da SNA.
Sirimarco conversou, por e-mail, com a reportagem da Safra e disse que vai abordar, na palestra, os impactos do tabelamento de frete no setor agropecuário. A greve foi motivada, segundo os caminhoneiros, pela incompatibilidade dos aumentos dos combustíveis em relação ao valor dos fretes. Isso, em um mercado no qual a concorrência aumentou significativamente com o crescimento da frota dado o apoio de programas oficiais, o que causou sérios danos ao País.
“Como efeitos imediatos, a população enfrentou desabastecimento, alta de preços no varejo e os mais diferentes setores econômicos registraram impactos negativos pelo País, devido à dominância absoluta do modal rodoviário na matriz de transportes brasileira”, analisa.
Especificamente em relação ao tabelamento do frete, Sirimarco lembra que “é claro que a criação do frete mínimo fere os princípios da Constituição que versam sobre a livre concorrência, os valores sociais do trabalho e a ordem econômica”. Políticas de interferência de preço jamais funcionaram em nenhum segmento, diz ao acrescentar que “basta lembrar as experiências malsucedidas de 1980, que resultaram em um quadro de hiperinflação que perdurou por mais de uma década no País”.
Questionado se existe uma saída para o impasse entre governo e produtores, muitos desses já pensando em comprar frota própria para garantir rentabilidade nas propriedades, Sirimarco é taxativo: “A saída é a revogação da tabela pela sua inconstitucionalidade. Por outro lado, a greve fez com que as grandes empresas começassem a buscar alternativas para solucionar o problema. Uma delas é adquirir veículos e ter a sua própria frota.”
Mais adiante, o executivo fala sobre o atual momento, marcado pelo estrangulamento do setor logístico. Segundo ele, o Brasil priorizou o transporte rodoviário ao longo dos anos em detrimento do ferroviário e hidroviário. Conforme dados da Fundação Dom Cabral, 75% de tudo que é produzido no Brasil é transportado em rodovias. Apenas 9,4% passa pelo modal marítimo; 5,8% pelo aéreo; 5,4% pelo ferroviário; 3% via cabotagem e apenas 0,7% por sistema hidroviário. “O transporte rodoviário no Brasil continua a enfrentar problemas como a baixa qualidade das estradas, com apenas 200 mil quilômetros de pavimentação em 1,6 milhão de quilômetros de malha viária.”
O alto custo do transporte rodoviário no Brasil, diz o executivo, também é um dos entraves à competitividade e à exportação dos produtos brasileiros, que é considerada baixa em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), ficando em 12%, quando a média mundial é três vezes maior. “E o problema parece estar longe do fim.”
Sobre o valor dos combustíveis, Sirimarco não arrisca falar sobre possíveis medidas. De imediato, nenhuma, pois o preço dos combustíveis é determinado pelo mercado, por meio da combinação petróleo e câmbio. “A SNA propõe, para dar descontinuidade à dependência do País em relação ao transporte rodoviário, um maior investimento nos transportes ferroviário, marítimo e fluvial.”
Fonte: Safra