Safra recorde, velhos desafios

Mais um recorde está sendo batido na safra de grãos, com 227.9 milhões de toneladas estimadas para a temporada 2016-2017, volume 22,1% maior que o do período anterior. Principal fonte de dólares para o Brasil, o agronegócio deve garantir neste ano uma receita ainda maior de exportações. Além disso, a grande colheita deve injetar bom dinheiro em outros setores e ainda garantir bons preços para o consumidor. Mas grandes safras, no Brasil, são também acompanhadas de um desafio: a logística pode ser um pesadelo nas fases de maior movimentação de cargas.

Os quatro mil caminhões encalhados por vários dias na BR-163, no Pará, em fevereiro, foram mais uma comprovação desse problema bem conhecido e ainda longe de uma solução razoável. O agronegócio brasileiro tornou-se, nas últimas três décadas, um dos mais eficientes e competitivos do mundo, dentro das unidades produtivas. Fora das fazendas, cooperativas e indústrias de processamento, continua atolando na baixa qualidade da gestão pública.

O agronegócio faturou no ano passado US$ 84.9 bilhões com exportações, ou 45,9% de toda a receita comercial brasileira. O superávit comercial do setor, de US$ 71.3 bilhões, compensou com folga o déficit de outros segmentos produtivos e garantiu um excedente geral de US$ 47.7 bilhões. A principal fonte de receita do agronegócio foi o complexo soja, com vendas externas de 67.3 milhões de toneladas, no valor de US$ 25.4 bilhões. Os embarques desse item devem atingir neste ano 78.4 milhões de toneladas, com aumento de 16,5% em relação ao volume enviado ao exterior em 2016.

O aumento de produção estimado para a safra 2016-2017 deve resultar de maior plantio e maior produtividade em quase todas as culturas de grãos e oleaginosas. Numa avaliação ainda preliminar, o trigo, lavoura de inverno, deve ser uma das exceções, com redução de 3% da área e produção de 5.5 milhões de toneladas. Se esse número for confirmado, a colheita será 18,7% menor que a do ano passado, mas a variação do estoque final, de 2.1 milhões para dois milhões de toneladas, será muito pequena. Esperam-se maiores colheitas de algodão, amendoim, arroz, feijão, girassol, milho e soja.

Os ganhos devem ser especialmente importantes nas colheitas de algodão (14,2%), arroz (12,7%), feijão total (30,7%), milho (37,5%) e soja (15,4%). A boa produção de milho deve favorecer a produção de aves e suínos, com benefícios tanto para o consumo interno como para o volume e a receita de exportações.

O Brasil se consolidou há mais de duas décadas como um dos principais exportadores de carnes de aves. As vendas externas de carne de frango proporcionaram no ano passado uma receita de US$ 6.7 bilhões. O valor foi 4,4% menor que o de um ano antes, embora o preço médio tenha caído 6,2%. Isso foi possível porque o volume embarcado aumentou 1,9% e isso compensou parcialmente a baixa da cotação.

As vantagens competitivas do agronegócio resultaram de um grande esforço de modernização do setor, especialmente a partir da segunda metade da década de 1970. Houve ganhos de produtividade nas culturas e na produção animal. Esses ganhos foram possibilitados por importantes avanços tecnológicos.

A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) liderou o esforço científico. Outras entidades, tanto acadêmicas quanto empresariais (destaque para algumas cooperativas), participaram desse trabalho. Produtores ampliaram o uso de novos insumos e – ponto muito importante, mudaram as formas de manejo do solo, tornando-o mais fértil e, ao mesmo tempo, reduzindo o risco de erosão.

A política agrícola teve peso relevante nesse progresso. Mas outras áreas da administração foram incapazes de acompanhar a modernização. Parte da competitividade alcançada pelo agronegócio continua comprometida pelas deficiências da logística, pela burocracia e pela tributação ruim, para citar só alguns entraves. Mau planejamento e falhas de gestão e, é claro, boas doses de corrupção explicam grande parte dos problemas. Produzir bem é só uma parte, nem sempre a maior, dos desafios.

 

Fonte: Estadão

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