Ex-ministro da Agricultura do primeiro governo Lula, no período de 2003 a 2006, o agrônomo Roberto Rodrigues considera que não há conflito de interesses nas novas atribuições do Ministério da Agricultura. No primeiro dia de governo, o presidente Jair Bolsonaro editou medida provisória determinando que a responsabilidade de realizar a reforma agrária e demarcar e regularizar terras indígenas e áreas remanescentes dos quilombos passa a ser do Ministério da Agricultura, reunida na nova Secretaria Especial de Assuntos Fundiários.
Além disso, na sua nova estrutura, o ministério vai absorver unidades que estavam abrigadas nos ministérios do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Social, na Secretaria Especial de Agricultura Familiar e Desenvolvimento Rural, da Casa Civil, e na Secretaria de Mobilidade Social e Cooperativismo da própria Agricultura.
Na visão de Rodrigues, é “positiva” a medida de atribuir o trabalho da reforma agrária à Agricultura. Antes, a função era realizada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). “Há 30 anos, havia a visão de que seria a raposa cuidando do galinheiro, de que poderia ter um conflito de interesses na união das funções de promover a agricultura e desapropriar terra para reforma agrária. Mas hoje, com todas as tecnologias adotadas nas atividades agrícolas, o problema acabou. É possível, sim, combinar as duas funções”, disse Rodrigues, que é coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (GV Agro), em entrevista ao Estadão/Broadcast.
Segundo o ex-ministro, a adoção da medida foi possibilitada pelo fortalecimento da estrutura do órgão nos últimos anos e pela mudança de lógica para uma visão de reforma agrária como desenvolvimento rural.
“Essa reforma ministerial é compatível com os novos tempos da agricultura e foi capitaneada por uma ministra que conhece o tema. Tereza Cristina foi secretária do setor em um dos maiores Estados produtivos do País (Mato Grosso do Sul)”, disse Rodrigues.
Sobre a absorção das operações da Secretaria Especial de Agricultura Familiar e Desenvolvimento Rural pela Agricultura, Rodrigues concorda com a opinião da ministra Tereza Cristina de que a agricultura empresarial, quanto a familiar são o mesmo negócio.
“São profissionais da mesma atividade, da mesma função, entretanto, exigem diferentes demandas. Todos são produtores rurais, independentemente do porte de sua propriedade. Mas, em determinadas circunstâncias, requerem políticas específicas ou mais empreendedoras ou mais sociais”, disse o ex-ministro.
Terras indígenas
Após a atribuição de novas funções à Agricultura, o governo pretende regulamentar a liberação de produção agrícola em terras indígenas. Se adotada, a normativa autorizará parcerias entre índios e produtores rurais para cultivo e criação de gado em terras já demarcadas.
“Essa atividade já existe, que é o arrendamento de terras, mas é ilegal, portanto, inaceitável. Com a medida, o governo legaliza a atividade e cria o progresso da ação, tornando viável ao produtor familiar, que tem uma área de terra restrita, ampliar a sua produção”, disse Rodrigues.
O Estado de S.Paulo