A proposta em estudo no governo de indexar os juros do crédito rural à taxa básica de juros (Selic) no Plano Safra 2017/18, revelada ontem pelo Valor, já provoca forte reação contrária do Ministério da Agricultura.
A proposta é defendida pelo Banco Central e pelos ministérios da Fazenda e do Planejamento e está ganhando força, pois com a trajetória de queda da Selic e da inflação o Tesouro poderia reduzir seus gastos com a equalização dos juros do crédito rural. Nessa frente, a equipe econômica vê com bons olhos limitar os gastos a R$ 11 bilhões em 2017/18, R$ 2 bilhões a menos que o montante estimado para o ciclo 2016/17.
O Ministério da Agricultura prefere, porém, insistir no modelo atual, no qual as taxas de juros das linhas do Plano Safra são definidas antes do início das temporadas – que vão de julho de um ano a junho do seguinte -, como já se habituou a fazer há mais de uma década. E, para 2017/18, quer juros de, no máximo, 7,5% ao ano para as operações de custeio agropecuário, contra os 9,5% em vigor neste ciclo 2016/17. Para linhas de investimento como o PCA (armazenagem), defende 6,5% ao ano.
“O setor tem os pés fincados nas cotações de mercado internacional e não é atrelado à Selic”, disse o secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Neri Geller. “E vamos, sim, batalhar para reduzir os juros”.
Ao longo das discussões em torno do Plano Safra 2017/18, que começaram em janeiro, a Agricultura também chegou a defender um “gatilho” para a fixação dos juros do crédito, mas atrelado à inflação. Mas acabou desistindo da demanda, pelo desgaste político de ter que conviver com a regra no futuro ou mesmo ter que brigar para derrubá-la em tempos de Selic em ritmo de alta.
A Secretaria Especial de Agricultura Familiar (Seaf), vinculada à Casa Civil e que substituiu o Ministério do Desenvolvimento Agrário, também participa dessas discussões, e tem uma posição cautelosa sobre uma eventual mudança como a pretendida pela equipe econômica.
“Em princípio, achamos mais coerente que os juros do Pronaf [programa que reúne as linhas de crédito voltadas à agricultura familiar] sejam baseados num índice mais concreto da economia, como a inflação, e não num índice mais abstrato, do mundo financeiro, como a Selic”, disse José Carlos Zukowski, diretor de Financiamento e Proteção da Produção da Seaf.
Até agora, a equipe econômica do governo trabalha com a ideia de fixar em um percentual de 85% da Selic a taxa de juros das operações de custeio e investimento do próximo Plano Safra. Para o Pronamp (linha destinada a médios produtores), sinaliza 70%, e para as operações do Pronaf, 55%.
Alguns economistas e analistas de mercado sustentam, ainda, que vincular o crédito agrícola à Selic faz sentido somente num cenário de juros baixos. “A medida é importante, mas desde que seja transitória e excepcional, porque vivemos num momento de crise e instabilidade econômicas”, disse Ademiro Vian, consultor que atua na área de crédito há mais de 30 anos. Vian alerta para o “cheiro” de indexação da economia que uma medida dessas faria ressurgir.
Para ele, o ideal seria que o Brasil continuasse com taxas fixas para os juros do crédito rural. “E se a Selic não cair? E se houver desarranjos políticos ou repiques inflacionários que levem o BC a não reduzir a Selic na velocidade que se esperava?”.
Já Rafael Baldi, diretor adjunto de Negócios da Febraban, entidade que representa os bancos no País, não vê riscos operacionais ou de insegurança jurídica na aplicação de uma regra com base num percentual da Selic para os contratos de financiamento ao setor rural. “Entendemos que a oscilação da Selic causa preocupação no setor, mas para os bancos é indiferente. Não haveria nenhum óbice, da forma como o BC está colocando, de que não vai haver variação de taxas de juros ao longo da safra”, disse.
Fonte: Valor