Recuperação judicial de produtor rural ainda provoca controvérsia

A Recuperação Judicial (RJ) de produtores rurais pessoas físicas continua gerando controvérsias no setor produtivo e instigando a busca por uma solução definitiva entre juristas e magistrados. O caminho nessa direção, contudo, ainda parece longo.

Segundo o ex-ministro da Agricultura Blairo Maggi, acionista da Amaggi, maior trading de grãos de capital nacional, parte do problema deriva da existência de uma “indústria” de pedidos de RJ incentivada por advogados em Mato Grosso.

Em evento virtual promovido pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), Blairo afirmou que, enquanto alguns produtores enfrentam problemas e recorrem à ferramenta para proteger os negócios, outros estão enriquecendo de forma ilícita com a “relativização” feita nos processos na Justiça das garantias oferecidas sobretudo nos financiamentos obtidos junto a tradings.

Para o ex-ministro, a situação causa “temor” e “intranquilidade” no setor. Alguns advogados, disse ele, chegam a participar de feiras agropecuárias para oferecer o serviço de Recuperação Judicial a produtores.

Priscila Camargo, sócia do escritório Ernesto Borges Advogados, afirma que o cenário é de “total relativização das garantias” nos processos de recuperação de produtores pessoas físicas, sobretudo nas CPRs (Cédulas de Produto Rural) e alienação fiduciária de bens e imóveis.

Regras

No mesmo evento, Camargo defendeu a criação de uma lei específica para RJs no agronegócio como forma de proteger os financiamentos do setor. “Garantias que davam solidez para a relação se desmontam da noite para o dia. O mercado de crédito não atua nesse formato”.

Já a juíza da vara especializada em Falência e Recuperação Judicial de Cuiabá (MT), Anglizey Solivan de Oliveira, sugeriu a criação de regras detalhadas para o acesso dos agricultores ao sistema de insolvência com mudanças na Lei 11.101/2005, que trata de recuperações judiciais de forma geral.

A medida já esteve em debate no Congresso, mas não avançou por causa da pandemia. “Também devemos pensar na criação de câmaras privadas para a solução de litígios do agro. Nos EUA, 95% das demandas são resolvidas fora do judiciário”, acrescentou a juíza.

Para ela, o modelo pode gerar economia ao poder judiciário e maior cumprimento das medidas consensuadas entre as partes privadas.

Aumentos ilícitos

O Valor já informou que o número de RJs no campo pode dobrar neste ano em função da crise. Conforme projeção do escritório ERS Consultoria e Advocacia, o número de pedidos poderá se aproximar de 400.

Na mesma linha, a desembargadora Marilsen Addário, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, reforçou que é preciso cautela na aplicação do instrumento para não gerar um “aproveitamento indevido” de alguns empresários. Ela afirmou que já identificou aumentos ilícitos de patrimônio em diversos pedidos de RJ, não só no agronegócio.

Blairo Maggi disse ainda que o sistema oficial de crédito protege quem teve perdas na produção por causa de problemas climáticos, por meio do Manual do Crédito Rural.

Segundo ele, a prática também é aplicada por financiadores privados, que hoje respondem por 70% do “funding” do setor no País. Para o ex-ministro, não há crise generalizada no agronegócio que justifique tantos pedidos de RJ.

 

Fonte: Valor Econômico

Equipe SNA

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