Queda de 60% no preço do milho preocupa agricultores de Mato Grosso

O clima não era dos melhores entre os produtores rurais que participaram da Abertura Nacional da Colheita do Milho Segunda Safra, na Fazenda Jaqueline, do agricultor Zilto Donadello no município de Cláudia, em Mato Grosso, nesta quarta-feira (12/7). Os motivos não eram o sol forte e o tempo firme que favoreceram o trabalho das colheitadeiras no campo, mas o semblante de preocupação dos produtores com a queda acentuada nas cotações do milho.

Quando cultivaram as lavouras do cereal, até meados de fevereiro, os produtores mato-grossenses tinham esperança de que a safra fosse rentável, a exemplo dos últimos anos. O aumento das exportações para a China e a expansão da indústria de etanol de milho no Estado davam sustentação ao consumo, mas o mercado virou e o preço da commodity desabou cerca de 60% nos últimos três meses. A realidade é semelhante em outras regiões do País.

O evento realizado pela Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho) no Norte de Mato Grosso buscou orientar os agricultores sobre a importância de fazer um bom planejamento financeiro da atividade, já de olho na próxima safra. A avaliação do Diretor-Executivo da entidade, Glauber Silveira, é que o setor vive um momento de transição com esse movimento dos preços dos grãos, o que vai demandar resiliência para quem vive no campo.

“Há sete anos também tínhamos uma grande produção e preços baixos, isso faz parte, é cíclico. Tivemos momentos bons nos últimos três anos com alta produtividade e bons preços, agora é um momento de transição”, disse à reportagem. Segundo ele, o cenário exige cautela e muita matemática por parte dos produtores. “Não é momento de arriscar. É preciso fazer as contas e não extrapolar para ter rentabilidade”.

Mato Grosso já colheu metade das mais de 50 milhões de toneladas de milho que o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (IMEA) estima para a segunda safra do Estado. No município de Cláudia, que tem pouco mais de 10.000 habitantes, o cereal foi cultivado em 120.000 hectares.

Zilto Donadello deve colher 115 sacas de milho em cada um dos 300 hectares cultivados nesta safra. Mas a maior parte da produção, estimada em 2.000 toneladas do cereal, será estocada em silos-bag à espera de uma reação do mercado, já que o preço na região chegou a R$ 27,00 nesta semana. A próxima safra é uma dúvida e ele pode optar pelo cultivo de braquiária para cobertura do solo ao invés de apostar na cultura novamente.

A preocupação de Donadello e dos vizinhos que acompanharam o evento na fazenda dele nesta quarta-feira é porque está difícil fechar a conta da safra. O custo para implantação e manejo da lavoura foi formado com a expectativa de venda do milho a R$ 60,00 por saca na colheita.

Quem não travou preços ainda busca alternativas para estocar a produção que sai do campo, mas enfrenta o problema do déficit de armazenagem. Há relatos também de algumas quebras de contrato no Estado por parte de empresas compradoras devido ao derretimento das cotações do cereal.

Próxima safra

O Conselho das entidades representativas já mira o planejamento da próxima safra, que deve ser ainda mais desafiadora por causa do El Niño, que pode atrasar o plantio da soja em algumas regiões do país e, consequentemente, do milho.

“O clima preocupa muito porque não é hora de colher mal. O produtor tem que comprar bem os seus insumos, vender bem a produção e tem que colher bem. Se fizer bem esses três fatores, ele terá sucesso”, disse Glauber Silveira.

O Presidente da Associação dos Produtores de Soja de Mato Grosso do Sul (Aprosoja-MS), André Dobashi, disse que uma das alternativas será diversificar o cultivo na segunda safra, com culturas como amendoim, feijão e sorgo.

“Temos que fazer a diversificação de culturas. É a única opção que tem: reduzir área de milho plantado, principalmente na segunda safra, e lançar mão de outras culturas que possam capitalizar o produtor na mesma proporção.”

A atenção dos produtores de milho agora é com a formação dos custos da próxima safra. “O produtor tem que saber negociar. A cada semana, o preço dos insumos tem caído e vai cair mais. O produtor tem que comprar melhor”, disse Silveira.

A visão do Presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), Antonio Galvan, é a mesma. “Quem ainda não comprou seus insumos, espera mais um pouco. Quem já comprou vai ter que amargar mais essa safra”, disse.

Galvan confia que os preços das commodities vão reagir. “Os preços estão aviltantes e hoje não cobrem os custos de produção. Mas isso não se sustenta para sempre. O consumo deve aumentar. Tem notícias de seca na Europa, sobre o clima na Ásia e nos Estados Unidos também. Temos fé que esse milho vai ter um preço um pouco melhor para o final do ano para o produtor que puder esperar”, disse.

Armazenagem

A falta de armazenagem é o fator a se lamentar ainda mais em tempos como esse, disse Galvan. “Essa é a grande preocupação. Não temos armazenagem nem somente para o milho no Estado. O acesso aos financiamentos para construir dentro das propriedades tem que ser facilitado, ainda tem muita burocracia”, disse. “Já temos milho a céu aberto aqui na região, milho no chão. Isso é culpa da falta de política para armazenagem”, disse Glauber Silveira, da Abramilho.

Antonio Galvan disse que a compra de 500.000 toneladas de milho pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) pode ajudar para a reação dos preços, mas que o volume ainda é pequeno. Ele ressaltou o pedido para que o cereal seja levado para outros Estados para não agravar o déficit de armazenagem local. “O governo tem que contratar frete e remover para regiões de falta do produto, como a região Sul. Que se remova o quanto antes para não agravar o problema de armazenagem”, disse.

Reforma tributária

A aprovação da reforma tributária na Câmara dos Deputados na semana passada foi outra preocupação expressa pelos produtores rurais de Mato Grosso durante o evento, em Cláudia. Em uma safra marcada por preços achatados das commodities combinados com a falta de armazenagem para estocagem de grãos e o descompasso entre os custos de produção do início da temporada e os valores recebidos na colheita, a falta de previsibilidade sobre a carga tributária que será cobrada do setor é o assunto que domina as conversas dos agricultores no interior do Estado.

Os produtores reclamaram do limite de R$ 3.6 milhões de faturamento bruto anual como prerrogativa para não ser contribuinte do Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Segundo o Presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT), Fernando Cadore, quem produz mais de 300 hectares no Estado já ultrapassa essa linha de corte na renda, segundo a análise do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (IMEA), e terá que contribuir com o imposto, o que pode impactar grande parte da classe produtora.

A burocracia para a manutenção de serviços contábeis para operacionalizar o sistema de crédito e débito do imposto vai gerar mais dificuldades, disse Cadore. “Muitos produtores ficam nervosos apenas de ter que falar com um advogado, quanto mais montar estrutura contábil. Essa medida vai aumentar a concentração de área dos grandes grupos, dos grandes conglomerados, devido à parte burocrática”, disse.

Cadore também reclamou da falta de previsibilidade sobre a alíquota que será, de fato, cobrada do setor ao final da aprovação da PEC. Ele também questionou o momento para a votação da reforma tributária. “Duvido que alguém acredite que caiba uma redução de tributos em um ambiente de aumento de gastos da máquina pública, com um governo que aumenta o número de ministérios, fura teto de gastos”, disse. “Ninguém sabe o que está sendo discutido. Qual será a alíquota? Onde está o estudo de impactos da atual carga e da seguinte? É impossível avaliar benefício ou prejuízo sem fazer a conta matemática”, completou.

Vilmondes Tomain, Presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso (FAMATO) disse que a reforma tributária foi votada de forma “atropelada” e que ela não gera equilíbrio na sociedade. “Eu vejo uma preocupação muito grande, pois não sabemos onde isso vai chegar. Não podemos pensar que vamos ficar sem pagar a conta. Vamos pagar sim, só não sabemos quanto”, indicou durante o evento. “Esperamos que o Senado coloque equilíbrio na reforma, que venha para simplificar e não sacrificar”.

Tomain também disse que o governo preferiu uma reforma tributária para “encher o caixa” ao invés de realizar uma reforma administrativa para enxugar os gastos públicos.

Presidente do Instituto Pensar Agropecuária (IPA), o ex-Deputado Nilson Leitão disse que, segundo um estudo da Receita Federal, 98,70% dos produtores rurais terão direito à isenção. O dado contraria a indicação do IMEA sobre a possibilidade de impacto para agricultores com mais de 300 hectares.

Leitão afirmou que Senadores da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) garantiram que o texto não sairá do Senado igual ao que foi aprovado na Câmara. Alguns temas deverão ser mexidos, como os fundos estaduais e o imposto sobre as heranças.

Segundo ele, os Senadores vão tentar reduzir a alíquota final ao setor agropecuário. O texto aprovado na Câmara prevê a redução de 60% da alíquota geral. A intenção é chegar a 70% ou 80%, segundo proposta original do setor.
“Não há possibilidade de o texto permanecer como saiu da Câmara. É zero a possibilidade de permanecer na questão da herança e dos fundos. O projeto entra de um jeito e vai sair de outro”, disse.

O Presidente da União Nacional do Etanol de Milho (UNEM), Guilherme Nolasco, disse que o tratamento diferenciado dado aos biocombustíveis no texto da reforma tributária aprovado na Câmara agradou, mas que é preciso equilíbrio em toda a cadeia produtiva.

Fonte: Globo Rural
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