Na fazenda Seriema, a paisagem foi modificada nos últimos meses com a implantação de seis caixas de abelhas numa área de mata ao lado de uma lavoura de grãos, com o objetivo de que elas contribuam para a melhoria da produtividade no campo.
A técnica, embora conhecida há décadas, está sendo difundida cada vez mais em Canarana (MT) num projeto que envolve produtores rurais, uma fundação e a Prefeitura e que, além de gerar até 30% de ganhos no entorno das caixas, tem como objetivo também propiciar renda a assentados.
O fazendeiro Sergio Pasqualotti, da Seriema, tem 520 hectares em produção e usou uma pequena área para testar a polinização assistida neste ano.
Os ganhos na produtividade são de pelo menos 12%, conta o especialista em abelhas Heber Pereira, doutor em zootecnia, dependendo de como é feito o manejo e também do local em que as caixas são instaladas. Um estudo da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) aponta o mesmo percentual.
Segundo ele, o ideal é que sejam usadas até duas colmeias por hectare (10,000 metros quadrados) para que a polinização seja eficiente.
Apicultores do País têm sofrido perdas de milhões de abelhas devido ao uso irregular de fipronil, agrotóxico que não deve ser lançado por aviões agrícolas. Foram ao menos 80 milhões de abelhas mortas na Bahia e 100 milhões em Mato Grosso, na região de Sorriso.
Pereira disse que quem faz pulverização da forma correta não precisa fazer nenhuma alteração em sua propriedade para utilizar a técnica.
Iniciado no 1º semestre, o projeto Semêa distribuiu até aqui 200 caixas de abelhas, das quais 160 foram entregues pela Fundação Bunge e 40 pelo governo estadual, segundo o Secretário da Agricultura e Meio Ambiente de Canarana, Cleyton Dias de Souza.
O agricultor Aparecido dos Santos Pereira, que vive no assentamento Suya, criado há 15 anos, é um dos que receberam caixas e disse ter visto resultado prático desde o início de sua participação, em 17 de março.
Os assentados utilizam as caixas recebidas de duas formas: ou instalam nas áreas em que produzem ou de forma consorciada em propriedades como a de Pasqualotti, numa proposta de ganha-ganha.
“Nas fazendas que produzem soja, vamos lá, montamos o apiário para eles, que nos dão suporte e ficamos com o lucro do mel. Eles ganham com o aumento da produtividade e a gente com o mel. Para eles [fazendeiros], o importante é a abelha”, disse o assentado.
Canarana é considerada a capital nacional do gergelim, que propicia um mel considerado “muito bonito” pelos pequenos agricultores. O litro é comercializado por preços entre R$ 80,00 e R$ 100,00, segundo Pereira. Cada assentado tem uma área de 12 hectares, 4 deles de reserva legal.
A cidade mato-grossense tem área de cerca de 75,000 hectares (105,000 campos de futebol) de cultivo do gergelim, 30% mais que na safra anterior.
A intenção do Semêa, segundo Cláudia Calais, Diretora-Executiva da fundação, é que os assentados obtenham renda para contribuir para que efetivamente fiquem em seu território e que o desenvolvimento seja saudável.
Ela disse que, no passado, os enxames de abelhas existentes na cidade eram exterminados e que a parceria envolvendo todos os participantes se constituiu em uma política pública.
O programa em Canarana inclui ainda o treinamento de indígenas xavantes para o uso de drones como forma de tentar detectar focos de incêndio no cerrado com maior rapidez e, ao mesmo tempo, ter acesso a práticas sustentáveis e tecnologias de ponta para potencializar receitas com a agricultura.
Executado inicialmente em três aldeias xavantes e da etnia boe bororo a um custo de R$ 1.6 milhão, o projeto deve chegar a 30 aldeias de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Tocantins nos dois próximos anos, com investimento de R$ 3 milhões.