Os preços do açúcar têm espaço para avançar ao longo da recém-iniciada safra 2018/19 do centro-sul do Brasil, como resultado do foco na produção de etanol na região, ajustes de posições na Bolsa de Nova York e perspectivas de uma oferta menor.
O movimento, caso se confirme, reverteria o atual cenário de pressão sobre as cotações, que começaram a temporada na menor cotação em mais de dois anos na Bolsa de Nova York, perto de US$ 0,12 por libra-peso, enquanto no mercado doméstico estão 28% abaixo do registrado há um ano, na casa dos R$ 54,00 por saca.
Um eventual fortalecimento da commodity também seria benéfico para as usinas da região, a maior produtora e exportadora do mundo e que ainda sofre os efeitos de anos de crise.
O atual momento de preços enfraquecidos é basicamente reflexo da ampla oferta mundial, que caminha para um superávit neste ano após dois ciclos de déficit, apesar de uma queda acentuada na produção no Brasil. Fortes produções na Índia, Tailândia e União Europeia (UE) irão impulsionar a oferta global.
Esse fundamento, entretanto, tende a dar lugar em breve às especulações sobre o balanço de oferta no próximo ano, a qual pode ficar abaixo do esperado, fornecendo algum suporte aos preços a partir de meados do ano, disse o analista João Paulo Botelho, da INTL FCStone.
“A partir de junho, julho, o mercado começará a olhar para a safra global 2018/19”, afirmou ele, referindo-se ao ciclo que começa em outubro. No centro-sul do Brasil, o calendário é diferente, com a temporada indo de abril a março.
“Existe a perspectiva de um novo superávit (em 2018/19), mas há riscos (…) Por mais que a tendência seja isso, (o excedente) pode ser menor que o registrado atualmente e dar sustentação aos preços, que penderiam para uma alta no segundo semestre”, declarou o analista, citando a previsão de menor área plantada com beterraba na Europa e possíveis recuos de produção na Ásia após o recorde deste ano.
O diretor da Archer Consulting, Arnaldo Luiz Corrêa, segue a mesma linha, avaliando ainda que a queda dos contratos futuros na Bolsa de Nova York foi “exagerada”. Só em 2018 o recuo já é de quase 20%. “Acho que os preços exageraram na queda”, disse ele, frisando que o atual patamar do açúcar, em relação à paridade com o etanol, está subvalorizado.
“Poderemos ver a partir do segundo semestre ou do último trimestre do ano, uma recuperação de preços (do açúcar) de maneira até exacerbada. O preço-alvo para esse mercado teria de ser 14,50 centavos de dólar (por libra-peso) para ficar perto da paridade”, afirmou Corrêa.
Etanol em alta
Ao contrário do açúcar, o etanol iniciou a temporada 2018/19 no centro-sul do Brasil com preços mais altos na comparação anual. Segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Esalq/USP, a cotação do hidratado na usina está 21,5% maior, enquanto a do anidro, quase 14% superior.
Essa situação é resultado da demanda fortalecida e da melhor competitividade frente à gasolina, após alterações tributárias aplicada no ano passado.
Para o diretor da comercializadora Bioagência, Tarcilo Rodrigues, a expectativa é de que o consumo siga firme ao longo de 2018 em razão do crescimento da economia do país.
“Os combustíveis tendem a pegar carona e crescer também. No caso do etanol, esse crescimento pode ser ainda maior, dada a elasticidade que tem para avançar sobre a gasolina”, disse, se referindo à frota de carros flex, veículos que utilizam tanto o derivado de petróleo quanto o biocombustível à base de cana.
A oferta de álcool tende a aumentar com força a partir de agora, uma vez que a safra começou no centro-sul. Mas, para Rodrigues, o preço mínimo do etanol praticado nas usinas neste ano deve ficar acima do mínimo da safra passada, de R$ 1,62 por litro, observado em julho, justamente em razão da demanda firme.
“Variável-chave”
A preferência das unidades produtoras pelo etanol é, portanto, outro fator que deve dar sustentação aos preços do açúcar. Por causa de uma oferta de cana estagnada, a maior alocação de matéria-prima para o biocombustível deve resultar em queda de cerca de cinco milhões de toneladas na produção do adoçante em 2018/19 no centro-sul, segundo algumas consultorias.
“No começo da safra vamos testar os limites alcooleiros no centro-sul. Assim como fomos surpreendidos pelo potencial de mix açucareiro na safra passada, agora teremos o mix alcooleiro. É possível que o mercado seja surpreendido pelo potencial de queda na produção de açúcar”, afirmou Botelho, da INTL FCStone.
Tanto ele quanto Corrêa, da Archer Consulting, ponderam, contudo, que esse cenário pode ser alterado em razão de uma commodity: o petróleo. “Existe uma variável-chave, que é o petróleo (…) Não estamos vendo nada agora, mas ainda assim sempre há um risco para os dois lados (açúcar e etanol)”, disse, referindo-se a oscilações bruscas nas cotações do óleo.
Um petróleo mais caro tornaria a gasolina também mais cara, e isso levaria as usinas a impulsionar a produção de etanol em detrimento do açúcar. O inverso também é verdadeiro: caso os valores do óleo caiam, o estímulo ao biocombustível diminuiria, e as unidades direcionariam mais cana para o adoçante.
Fonte: Reuters