Em qualquer região do mundo, há dez anos, o bambu era considerado uma praga, afinal, trata-se de uma planta que o fogo não mata, que a formiga não come, que um eventual hospedeiro indesejado não afeta a produtividade. Mas hoje vale dinheiro nos Estados Unidos, Europa, Ásia e Brasil.
A afirmação de Guilherme Korte, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Bambu (Aprobambu), mostra que as atenções estão voltadas para o potencial econômico desta cultura, tanto que a entidade, em conjunto com a Rede Brasileira do Bambu, entrou com um pedido, na Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), para a normatização da construção com bambu, conforme outras normas em vigor em mais de 30 países. Isto porque “a madeira da planta é resistente, inclusive, a terremotos”.
“A ABNT já está com a norma em andamento”, informa Korte, acrescentando que, de olho no potencial do bambu, o governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Agricultura e Abastecimento (SAA), firmou um convênio com a Aprobambu, o Instituto Interamericano de Cooperação Agrícola e o Instituto Jatobás. Ainda criou a Unidade de Pesquisa e Desenvolvimento do Agronegócio do Bambu, em uma fazenda do Estado, no município de Tatuí (SP).
“No local, existe a maior coleção de bambu do Brasil, para o fomento aos micro, pequenos e médios produtores rurais de São Paulo”, informa.
No último dia 14 de setembro, a Universidade Mackenzie realizou o Dia do Bambu, na capital paulista, com a presença de mais de cinco mil estudantes participantes, em sete auditórios e 14 palestras com especialistas sobre o tema.
Pesquisadora do Instituto de Botânica e uma das palestrantes, Maria Tereza Grombone Guaratini ressalta que a utilização do bambu como alternativa de madeira, com alto valor agregado, pode gerar uma boa renda para pequenos, médios e grandes produtores. Eles ainda podem exportar esta matéria prima para países europeus onde o uso deste material deve ser estabelecido nos próximos anos.
“Tenho a convicção de que a cultura do bambu é economicamente viável, em razão do baixo investimento, e por ser uma planta perene, que rebrota anualmente, com tolerância à grande variação térmica e que se adapta a vários tipos de solo. Acredito que, em alguns anos, o mercado para exportação de bambu vai crescer, devido ao apelo sustentável do uso deste material”, prevê a pesquisadora.
O Brasil possui, atualmente, 36 gêneros e 254 espécies nativas de bambu distribuídas entre a Mata Atlântica (62%), Amazônia (28%) e Cerrado (10%).
“Desde o descobrimento do Brasil, o bambu é conhecido e utilizado, copiando moldes asiáticos, africanos e centro-americanos. As primeiras indústrias de papel já utilizavam o bambu para fabricar este produto”, relata o presidente da Aprobambu.
MAIOR PLANTAÇÃO COMERCIAL
Segundo Korte, a maior plantação comercial desta planta, em todo o mundo, fica no Brasil e pertence ao Grupo João Santos, com áreas em Pernambuco, Alagoas, Piauí e Maranhão – todos na região Nordeste do País.
“Há mais de 30 anos, o grupo produz papel, polpa e sacos de cimento, 100% de bambu, além de cavaco para biomassa para a geração de energia, aquecimento de caldeiras, fornos de siderúrgicas, cerâmicas e gessarias, principalmente devido à rápida perda de umidade. Em 15 dias, o bambu perde 50% de sua água, quase o dobro de outras biomassas disponíveis”, relata.
Conforme o presidente da associação de produtores, “o bambu é uma gasolina no mix com o eucalipto, pois economiza e melhora o rendimento da tonelada de biomassa para a produção de vapor na caldeira, tanto que empresas de secagem de grãos, cerâmicas, complexos industriais necessitados de vapor, calor ou energia, hoje, estudam realizar plantios experimentais em todo o Brasil”.
Ele ainda destaca que, no Brasil, onde há bastante área degradada disponível, incidência solar abundante e chuvas suficientes, o bambu pode crescer em qualquer região, com espécie nativa ou exótica, entre 1,5 mil conhecidas e cerca de 38 bem estudadas pelas universidades mundo afora.
“Segundo a Embrapa, toda propriedade rural possui, no mínimo, entre 10% e 20% de sua área com baixo retorno econômico ou em estado degradado. É nestas áreas que recomendamos o plantio de bambu – no mínimo, um hectare de uma espécie de bambu com broto para alimentação e produção de colmos de boa qualidade.”
MULTIFUNCIONALIDADE
Pesquisadora do Instituto de Botânica, Maria Tereza defende a multifuncionalidade do bambu, com destaque para os mais variados efeitos biológicos, tais como anti-radical livre, antioxidação, anti-envelhecimento, antifadiga, antibactérias, antivírus e na prevenção de doenças cardiovasculares.
“Extratos de folhas e brotos de bambu podem ser utilizados como suplemento farmacêutico dietético, ingrediente cosmético e aditivo alimentar. Além disto, algumas espécies têm sido usadas nos países do sudeste asiático, desde a Antiguidade, como material de construção, na produção de papel, móveis, pisos, carvão, bebidas, barcos, bicicletas, artigos têxteis, instrumentos musicais e, comida.”
De acordo com a pesquisadora, atualmente, aspectos como o sequestro de carbono e o potencial de produção de biomassa de bambu têm recebido atenção cada vez maior.
“O bambu pode desempenhar papel importante no sequestro de carbono, devido ao crescimento vigoroso e à adição de biomassa acima e abaixo do solo, com vantagem significativa sobre outros recursos naturais, em razão do rápido estabelecimento e da adaptabilidade a diferentes condições de solo e clima.”
O presidente da Aprobambu reforça também que, por ser de fácil plantio, manejo e aproveitamento, com alta produtividade e baixo custo de implantação, o bambu é um “coringa” para o produtor rural.
“No campo, as aplicações do bambu são inúmeras: vão desde a sombra para o gado, cercas domésticas, cama de frango depois de picado, brotos para a alimentação suína, folhagem para as galinhas, até forragem para equinos e bovinos, se destacando como uma gramínea palatável aos animais de grande porte”, enumera Korte.
ECONEGÓCIO
Em meados de 2002, o Serviço Brasileiro de Apoio a Pequenas e Médias Empresas (Sebrae) apresentou uma nova proposta de aproveitamento de um ativo natural rico em possibilidades e alternativas, denominado “Econegócio do Bambu”.
“A proposta tem como tripé de desenvolvimento a organização social, a inovação tecnológica e o aproveitamento de vantagens comparativas”, informa Aldemar dos Santos Maciel, gerente da Unidade de Atendimento Coletivo em Comércio e Serviços do Sebrae-Acre.
Para atender a esta demanda, foi concebido o “Programa Sebrae de Econegócios”, com foco nos micros e pequenos empreendedores com atividades econômicas ambientalmente corretas, ao qual o bambu tinha consonância com esta temática.
Maciel relata que o Econegócio do Bambu começou a partir de um projeto de implantação de unidades produtivas de beneficiamento, voltado para o artesanato, conhecido como “Projeto Bambuzerias”. Na ocasião foram implementadas, no Estado de Alagoas, três unidades produtivas artesanais, com interação na confecção de artefatos e papéis feitos de bambu.
Um dos resultados deste trabalho foi a capacitação de cerca de 80 pessoas, em situação de risco, por unidade produtiva, e exportações realizadas para países da Europa, além de mostras, seminários e cursos sobre a construção civil em bambu.
RESERVA NATURAL
O Estado do Acre se destaca por ter uma das maiores reservas naturais em espécies nativas de bambu, no mundo. Por causa da grande ocorrência desta planta nativa do gênero Guadua, e considerando a versatilidade de uso em atividades econômicas, Maciel diz que a região possui vantagens comparativas e potenciais para a utilização de recursos da diversidade biológica, tanto na produção de riqueza quanto na inclusão produtiva.
“Em razão também da crescente demanda por produtos sustentáveis, o bambu reúne condições favoráveis ao desenvolvimento da criação de cadeia de valor deste produto no Estado”, ressalta.
O arranjo institucional para o fomento do bambu, via governo do Estado do Acre, inclui a participação do Sebrae e de instituições de pesquisa, ensino e órgãos ambientais (Embrapa, Fundação de Tecnologia do Acre, Instituto de Meio Ambiente do Acre, Secretaria de Ciência e Tecnologia, Instituto Federal do Acre, Universidade Federal do Acre).
“Trabalhando em sinergia para o desenvolvimento do setor, inclusive na elaboração e na aprovação de políticas públicas, com definição estratégica e organização da governança, foi criado o Plano Estadual de Desenvolvimento do Bambu”, informa Maciel.
Por equipe SNA/SP