Política indigenista de inserção econômica diminui conflitos no campo

Xingu, floresta, comunidade indígena
Parque Indígena do Xingu. Foto: Pedro Biondi/Agência Brasil, CC BY 3.0 BR

A entrega de títulos de terra a produtores rurais pelo governo brasileiro colaborou com uma grande diminuição dos conflitos no campo. Da mesma forma, a partir de 2019 houve um processo de pacificação em relação à questão indígena, afirmou a advogada e produtora rural em Mato Grosso do Sul, Luana Ruiz.

“A política indigenista séria não é aquela baseada na demarcação de terras, a torto e a direito, sem critérios, para que depois tudo caia nas mãos do poder judiciário, se estendendo por décadas. A política indigenista séria é aquela que vem com projetos, com inserção, onde há produção agrícola, exploração econômica das terras. É essa política que faz com que os conflitos, lá na base, diminuam”.

Para a especialista em Direito Agrário, “o direito territorial indígena está previsto na Constituição e precisa ser respeitado”. No entanto, disse ela, “o que preocupa são os estudos (de demarcação) elaborados por profissionais que acabam demarcando propriedades privadas que não são terras indígenas, com se fossem propriedades destinadas a essa população”.

“Se todas as propriedades no Mato Grosso do Sul fossem de terras indígenas, que estão em conflito desde o início da década de 90, por que ainda não foram entregues aos índios? Se nós estamos há 25 anos segurando nos processos, é porque temos direitos. Nesse caso, o erro está na forma de realização desses estudos (de demarcação)”, reforçou Luana.

Novo cenário

Nesse contexto, a advogada questiona o que poderá ocorrer com a política indigenista diante do novo cenário político, considerando discussões de interesse como o Marco Temporal.

“O Marco Temporal considera como terra indígena o espaço onde os índios estavam até 1988. Pela tese do indigenato, os índios são os primeiros habitantes e donos naturais dessas terras, portanto, qualquer centímetro quadrado pode ser demarcado porque eles estavam no Brasil desde o seu descobrimento. Essas duas teses estão sendo discutidas no STF em recurso extraordinário”, explicou a advogada.

“O desfecho desse processo está nas mãos do novo presidente da República. O resultado irá refletir em todos os processos que tratam da questão indígena no Brasil.  Tudo o que acontece no cenário político, econômico, jurídico, reflete no comportamento dos brasileiros”.

Expectativas

Francisco Basílio, diretor técnico da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), espera que a questão indígena seja discutida, respeitando o Marco Temporal previsto na Constituição de 1988. “O atual governo deveria evitar decisões baseadas em ideologia e fazer uma ampla revisão dos estudos de demarcação que servem de base à desapropriação e obtenção de terras”, disse.

“Além disso, é necessária uma ampla discussão de quais são os limites razoáveis para insistir em novas demarcações. O Brasil conta com 123 milhões de hectares já demarcados, para uma população de 800 mil indígenas. Como comparação, nos EUA há 22 milhões de hectares de reservas para uma população de 2.2 milhões de indígenas”.

Segundo Basílio, “não é razoável imaginar que novos processos de reassentamento humano sejam para criar reservas indígenas, áreas de quilombolas ou assentamentos eternos”. Somando os três casos, disse ele, “25% do território brasileiro já foi redefinido. A prioridade deveria ser como tornar estas áreas produtivas para seus ocupantes”.

Invasões

Outro problema levantado por Luana Ruiz é a questão da invasão de terras. “Nós não temos histórico de reintegração de posse. No Mato Grosso do Sul, o último grande conflito, nesse sentido, ocorreu em 2016. De lá para cá, o governo do estado tem atuado de forma muito consciente, intermediando os conflitos e fazendo com que as invasões diminuam”.

A advogada reconhece que “o cidadão tem o direito de proteger sua propriedade, mas quando isso acontece há retaliações por conta de um contexto não jurídico e sim ideológico que existe em torno dos conflitos fundiários”.

Procedimentos

Para o diretor jurídico da SNA, Frederico Price Grechi, “é recomendável, com prioridade, na busca de uma solução consensual dos conflitos fundiários coletivos, a exigência, desde cedo, da criação de uma comissão especializada, e da adoção de técnicas eficazes de mediação e de conciliação, a exemplo do Cejusc-Fundiário (Centro Judiciário de Soluções de Conflito), criado em 2019 pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná”.

Grechi ressalta que a finalidade deste Centro “é a realização de audiências de mediação ou conciliação em ações que envolvem conflitos fundiários em que litigam grupos de pessoas hipossuficientes, com ou sem liderança organizada, cuja ocupação de área urbana ou rural é causadora de relevante impacto ambiental, urbanístico, social e econômico”.

Missão

Segundo o diretor da SNA, o poder judiciário “tem a importante missão de promover uma constante interlocução entre os atores litigantes, as entidades da sociedade civil (amicus curiae/interessadas), com a participação dos poderes legislativo e executivo, para a obtenção de uma autocomposição desse litígio estrutural.”

Além disso, completou Grechi, “deve ser fomentada a criação pelos tribunais de varas especializadas classificadas em entrância especial com competência, preferencialmente, exclusiva para apreciar (processar e julgar) impasses fundiários complexos”.

Resiliência

“Eu que venho de um contexto de 158 propriedades rurais invadidas e cerca de 4 mil propriedades impactadas por processos de demarcação no Mato Grosso do Sul, em especial pelo Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) de 2008, que previa a demarcação de 38 terras indígenas, impactando 22 municípios do estado, posso dizer que o produtor rural nunca perde a esperança. Eles são o exemplo da resiliência. Mas o novo quadro político nos preocupa muito”, concluiu Luana.

Fonte: Canal do Boi
Equipe SNA
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