Pele curtida de peixes tem mercado promissor na produção de vestuário, acessórios e até móveis

Zootecnista Rosemeire de Souza em atividade na estação de piscicultura da Unoeste. “Após o curtimento, as peles de espécies como tilápia, pacu, curimba, tucunaré, piauçu e pintado podem ser transformadas em um tipo de couro tão resistente quanto o de bovino”, diz a especialista. Foto: Débora André

Muito valorizado no mercado, o couro de peixe pode se tornar uma fonte de renda para piscicultores e artesãos na confecção de calçados, roupas e acessórios como bolsas, colares e até móveis.

“Apesar de ser pouco explorado, esse segmento apresenta grande potencial em nossa região e em outros polos de criação de peixes”, afirma Rosemeire de Souza Santos, zootecnista responsável pela Estação de Piscicultura da Unoeste, em Presidente Prudente (SP).

Segundo a especialista, na maior parte das vezes a pele dos peixes é descartada após o abate. “Mas após o curtimento, as peles de espécies como tilápia, pacu, curimba, tucunaré, piauçu e pintado podem ser transformadas em um tipo de couro tão resistente quanto o bovino”, compara a zootecnista.

“Trata-se de um ótimo negócio para se investir, pois alia  as características mais valorizadas na construção de vestimentas e adornos, como ausência de odor, raridade e  exclusividade. Não há duas peles de pescado exatamente iguais. Além de ser um subproduto de  baixo custo de produção, tem alto valor agregado e baixo impacto ambiental”, salienta Amanda Lilian Vieira Hoch, consultora de couros e peles da Cooperativa de Trabalho e Assessoria Técnica e Extensão Rural (Coater), de Paraguaçu Paulista (SP).

“A produção de tilapicultura, principal produto aquícola do País, chega a 100 toneladas por ano em um hectare por lâmina de água na criação em tanques redes. Isto é cem vezes maior se comparado com a criação da bovinocultura no sistema a pasto com a mesma área”, calcula Amanda.

Ela acrescenta que o bom potencial brasileiro é, em grande parte, resultado do trabalho de melhoramento genético. Em sua opinião, o País poderá se tornar um dos maiores produtores de pescado no mundo, em médio prazo, pois reúne condições favoráveis à aquicultura, como clima, disponibilidade de grãos para a fabricação de rações, além de água.

Conforme explica, são 5,3 milhões de hectares de água doce em reservatórios naturais e artificiais, 8 mil quilômetros de zona costeira, além de uma extensa rede hidrográfica e mais de 1 mil reservatórios de água da União que serão disponibilizados pelo programa do governo federal, o que permitirá acesso de 0,5 % do espelho d’água e aumentará o potencial de produção para 20 mil toneladas por ano.

O Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA) tem apoiado novas políticas de criação de peixes e, em consequência, o aproveitamento de peles in natura tem aumentado.

“A demanda de peles curtidas com taninos naturais é  bem expressiva, em relação ao curtimento com sais de cromo, pois o mercado externo está disposto a pagar mais por produtos sustentáveis e de baixo impacto ambiental”,  destaca a zootecnista da Coater.

“Também não podemos esquecer que o couro de peixe, no caso a tilápia, é três vezes mais resistente que o do bovino, sem contar na agregação de valor do produto final, com um aumento expressivo de 40% na receita final.”

Amanda cita outras vantagens de se trabalhar com peles de peixe. “O ganho econômico é expressivo (30% a 100% superior aos artigos similares produzidos com couro bovino). O produto é encontrado em abundância nos parques aquícolas brasileiros e sua exploração não está condicionada às autorizações do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama). Além disso, o curtimento de pele de tilápia é feito de forma artesanal.”

O preço do quilo da pele in natura para se processar é de R$ 3,00 a R$ 4,00 por quilo. A consultora informa que o mercado de bolsas, carteiras, sapatos e vestuário prefere peles in natura de tilápias de um a dois quilos, devido ao grande aproveitamento de área após o processamento. Já o setor de bijuterias absorve peles de tilápias abatidas entre 400 e 800 gramas.

Amanda destaca que o preço do couro semiacabado e acabado de tilápias de 400 a 800 gramas (processado com taninos naturais, isentos de sais de cromo e solventes, semiacabado, com ou sem pigmentação e com apliques de brilhos) varia de R$ 4,00 a R$ 7,00  a unidade. Já o couro de tilápias de um a dois quilos, semiacabado e acabado (processado da mesma forma), vale de R$ 15,00 a R$ 25,00 a unidade.

O preço das mantas de Tilápia (processadas com taninos naturais, semiacabados, ou com acabamento que vai do brilho natural aos brilho metalizado, a nova tendência do mercado) alcança de R$ 350,00 a R$ 400,00 o o metro quadrado.

INICIATIVAS

O Instituto Nacional de Pesquisa da  Amazônia (INPA) é um dos pioneiros em curtimento de peles de peixes nativos e há anos vem realizando pesquisas e incentivando o aproveitamento de peles de pirarucu, bastante apreciadas no mercado interno e externo.

Já no Estado de Paraná, as peles de tilápia são o grande destaque. “Para atender a esse nicho de mercado, a Universidade Estadual de Maringá incluiu na grade de ensino, do curso de Zootecnia, a disciplina de Tecnologia de Aproveitamento de Produtos e Subprodutos de Origem Animal, inclusive ensinando o curtimento de peles de peixes”, relata Amanda.

O Estado de Rio Grande do Sul, que processa peles de tilápia, pirarucu, pescada amarela e salmão, possui tecnologias de curtimento, com os cursos técnicos, empresas fornecedoras de produtos químicos para essa finalidade e centros de pesquisas como o Laboratório de Estudos em Couro e Meio Ambiente (Lacouro), vinculado ao Departamento de Engenharia Química da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).  

De acordo com a consultora da Coater, Mato Grosso do Sul também se desponta no curtimento de peles de tilápia, surubim, pacu, entre outros, e possui entidades organizadas como a Associação de Mulheres Amor-Peixe, de Corumbá, que recebe muito incentivo dos governos federal e estadual.

“Em São Paulo, ainda é preciso realizar um trabalho de sensibilização para o aproveitamento deste subproduto tão valioso, mas infelizmente é pouco explorado”, observa Amanda.

Ela também cita o apoio financeiro do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), em 2013, para a construção do primeiro curtume de couro de peixe do Estado de São Paulo, em parceria com a Prefeitura de Suzanápolis (SP), cuja inauguração está prevista para o fim de 2015.

“O curtume  beneficiará a  Associação Nipo-brasileira de Pesca e Aquicultura do Noroeste Paulista (Anipa) e processará 4 mil peles por mês, com  técnicas sustentáveis de baixo impacto ambiental, pois serão utilizados taninos naturais no processo de curtimento dessas peles, além de reuso da água com o tratamento de efluentes (taninos modificados).”

Amanda é autora do projeto e responsável pelo acompanhamento da implantação e capacitação dos associados beneficiados com o empreendimento, juntamente com o engenheiro ambiental João Gabriel Bertoli, responsável pelo licenciamento ambiental. A capacitação dos associados está prevista para o período de 28 de abril até 12 de maio.

Consultora de e peles da Cooperativa de Trabalho e Assessoria Técnica e Extensão Rural (Coater) de Paraguaçu Paulista (SP), Amanda Hoch ressalta que, além de ser um subproduto de baixo custo de produção, a pele de peixe tem alto valor agregado e baixo impacto ambiental. Foto: Divulgação Coater

OFICINA

Para aproveitar esse mercado promissor, a Estação de Piscicultura da Unoeste, em parceria com a Coater, promoverá, nos dias 25 e 26 de abril, a oficina “Agroindústria: curtimento de pele de peixe”. Serão abordados processamentos de peixes, noções básica de filetagem, curtimento ecológico e acabamento de peles de peixe e tratamento da água utilizada no processo.

O programa é voltado para produtores, piscicultores e alunos dos cursos de Zootecnia, Agronomia, Medicina Veterinária e Agronegócio. Os interessados podem se inscrever pelo telefone (18) 3229-3213.

Por equipe SNA/SP

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