Os dilemas da inovação no agro brasileiro

O finlandês Juha Leppänen, Diretor-Executivo do Demos Helsinki, consultoria que ajuda empresas e governos no desenvolvimento de projetos em áreas como inovação e sustentabilidade, acha que existe uma desconexão crescente entre aquilo que se apresenta como algo inovador e a real necessidade das pessoas. Para desenvolver seu argumento, o especialista menciona a mobilidade. Os carros elétricos, por exemplo, são inovações lustrosas, e, a julgar pela fortuna do multibilionário Elon Musk, dono da Tesla, também bastante rentáveis, com um certo apelo ambiental, já que não consomem derivados de petróleo. Mas esses veículos não são uma solução para o ir e vir das multidões que povoam as grandes cidades, a não ser para os afortunados que podem gastar, em alguns casos, mais de R$ 1 milhão por um exemplar.

É claro que não há qualquer coisa errada com o desejo de construir ou comprar um carro elétrico. A questão, disse Leppänen, é que temos hoje muita inovação tecnológica de negócios e poucas “inovações sociais”, e o ideal, ele defende, é que essas duas frentes caminhem juntas. Se, por um lado, carros elétricos poluem menos que os velhos modelos a gasolina, eles mantêm abarrotadas as ruas das grandes metrópoles. Dito de outra forma, eles atendem à demanda de indivíduos, mas nada fazem para melhorar o trânsito das cidades em que vão circular. Na verdade, mais carros são sempre sinônimo de mais congestionamento.

Essa é uma discussão bem urbana. Mas e o campo, onde entra no debate? O agronegócio é um dos campos da atividade humana que têm mais potencial de unir o que Juha Leppänen chama de inovações tecnológicas e sociais. Para citar um caso concreto, drones que monitoram o desenvolvimento de lavouras destinadas à alimentação humana são uma peça tecnológica que ajuda a aumentar a oferta de alimentos, uma necessidade coletiva.

No Brasil, o número de startups, um sinônimo de inovação, tem se multiplicado. No ano passado, havia 1.700 empresas iniciantes de base tecnológica no País, segundo o relatório Radar Agtech, elaborado pela Embrapa, pela gestora SP Ventures e pela consultoria Homo Ludens. O contingente é 51% maior do que o de 2019, ano da primeira edição da pesquisa.

O estudo atesta que o agro é um dos setores mais dinâmicos e inovadores da economia brasileira, o que não o deixa imune a problemas. Um deles é a forte concentração das startups nos Estados mais ricos. Do total de agtechs, 47% estão em São Paulo. Na capital paulista, que pode ser superlativa em muita coisa, mas está longe de ser um polo agrícola, estão 347, número quase dez vezes maior que o de Mato Grosso, líder nacional na produção de grãos. E, de todas as 1.704 startups do agronegócio brasileiro, apenas uma fica no Maranhão, um dos vetores de expansão da agricultura no Cerrado.

Outra questão é que, a despeito de o agro ser um forte gerador de riquezas para o país, o dinheiro para inovar no setor é curto. A maior dificuldade, dizem os empreendedores, é conseguir capital, especialmente para negócios que estão em fase inicial.

Aqui, é preciso fazer a ressalva de que o funil do crédito é um desafio para empreendedores de todo o mundo. Não existe dinheiro infinito. E é justamente por ser essa a realidade que é preciso refinar o debate sobre quais são os grandes diferenciais competitivos do Brasil e quais são as prioridades nacionais. Inovar em um setor vital como o de produção de alimentos não pode ser obra do acaso ou de uma apresentação persuasiva a investidores.

A Nova Zelândia entendeu esse raciocínio. Um estudo de mercado feito recentemente pela embaixada do Brasil em Washington, em colaboração com a consultoria Agritech New Zealand, informa que as agtechs são vistas como prioridade tanto pelo governo quanto pelo setor privado local, uma posição “associada essencialmente à relevância socioeconômica da agricultura para o País”. Guardadas as proporções, pode-se dizer isso também do Brasil.

Por Patrick Cruz
Fonte: Valor
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