Oito commodities respondem por quase dois terços das exportações

De janeiro a setembro, as vendas externas de oito produtos somaram US$ 163,2 bilhões – Foto de Pixabay: https://www.pexels.com/pt-br/foto/feijao-branco-273838/

De janeiro a setembro deste ano, oito commodities responderam por quase dois terços do valor das exportações brasileiras. Nesse período, as vendas de complexo soja, petróleo bruto e óleos combustíveis, minério de ferro, complexo carnes, açúcar, milho, celulose e café somaram US$ 163,2 bilhões, uma participação de 64,5% de um total exportado de US$ 253 bilhões. É um percentual um pouco superior aos 63,5% de igual intervalo de 2022, equivalente a quase duas vezes e meia os 26,3% dos nove primeiros meses do ano 2000. Os números são da Secretaria de Comércio Exterior (Secex).

Na comparação com o mesmo período do ano passado, o aumento da fatia dessas commodities nas exportações em 2023 se deve em boa parte à alta das vendas para a China. De janeiro a setembro, os embarques para o país asiático, dominados por produtos básicos, subiram 10,8%, para US$ 77,2 bilhões. Com isso, a participação das vendas para a China alcançou 30,5%, acima dos 27,5% de igual intervalo de 2022.

O valor das exportações totais, por sua vez, caiu 0,1% no acumulado do ano até setembro, período em que as vendas para os EUA e para a União Europeia (UE) recuaram 4,5% e 11,4%, pela ordem. A fatia das vendas para os EUA baixou de 11% para 10,5%; a da UE, de 15,3% para 13,6%.

Ao longo das últimas duas décadas, o salto desses produtos na pauta exportadora se explica especialmente pelo cenário marcado pela forte demanda da China por bens que o Brasil produz com eficiência, ao mesmo tempo em que a indústria enfrenta problemas crônicos de competitividade. “É China na veia”, resume o economista Livio Ribeiro, sócio da BRCG Consultoria e pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre). “É como entramos na cadeia de insumos e suprimentos da China, oferecendo bens e produtos que eles têm que consumir e utilizar.” De janeiro a setembro de 2000, a China ficava com só 1,9% das exportações brasileiras.

“Como temos elevada produtividade no agro, foi possível atender à crescente demanda chinesa”, aponta o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, para quem “isso de certa forma vale também na mineração; privatizada, a Vale foi capaz de fornecer o minério de ferro que os chineses queriam”. Outro destaque são as vendas de petróleo bruto, que também têm a China como principal destino, e de óleos combustíveis, num quadro de alta forte da produção da commodity.

Um dos riscos da concentração da pauta exportadora em poucas commodities é o desempenho ficar sujeito às oscilações de preços desses produtos, que podem passar por flutuações expressivas. O movimento, porém, reflete as vantagens comparativas do Brasil na produção desses bens, que são quase todos muito demandados justamente pela China, a segunda maior economia do mundo, atrás dos EUA.

Mesmo com o crescimento mais fraco da economia chinesa nos últimos anos, ela continua a ser o principal destino de quase todas essas commodities (óleos combustíveis, farelo e óleo de soja e café são as exceções). Em diversos casos, é o maior destino por larga margem, como no caso da soja em grão (71%), minério de ferro (62%), carne bovina (61%) e petróleo bruto e celulose (47% nos dois casos).

O economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rafael Cagnin, destaca o papel do ritmo expressivo de crescimento da economia chinesa, associada ao processo de urbanização. “Esse dinamismo, intensivo em produtos primários para suprir o avanço da indústria de base chinesa, mas também para atender o padrão de consumo urbano das famílias, não apenas significou demanda internacional crescente, especialmente nos anos 2000, como também aumento dos preços de commodities.”

No acumulado até setembro, o complexo soja (grão, farelo e óleo) respondeu por 22,6% das exportações totais do Brasil, o percentual mais alto, de longe, desde 1997, quando começa a série da Secex. Em valor, as vendas do produto em grão cresceram 9,9% em relação ao mesmo período de 2022, para US$ 45,6 bilhões, a despeito da queda de 16,7% dos preços, porque foram impulsionadas pelo salto de 23,8% nos volumes exportados. Este será mais um ano em que a safra da soja será recorde, subindo 26,5%, para 151,2 milhões de toneladas, prevê o IBGE.

A exportação do minério de ferro e de outras commodities também tem sido sustentada pelos volumes, e não pelos preços. No caso do minério, as quantidades exportadas de janeiro a setembro subiram 7,3%, enquanto as cotações recuaram 11,1%. Como resultado, o valor caiu 6% na comparação com igual período de 2022, para US$ 21,6 bilhões, o equivalente a 8,5% do total exportado pelo país nesses nove meses. O pico da fatia do minério de ferro nas exportações foram os 17,1% registrados de janeiro a setembro em 2021. Em meados daquele ano, os preços superaram os US$ 220 por tonelada.

Já nos últimos dois anos houve uma correção expressiva das cotações, o que ajuda a explicar o recuo dos valores exportados do minério, que chegaram a somar US$ 36,4 bilhões de janeiro a setembro de 2021. Os preços do produto subiram desde o fim de agosto, mas ainda estão abaixo de US$ 120 por tonelada.

O milho, por sua vez, ganhou mais espaço na pauta exportadora nos últimos dois anos. Em 2023, o Brasil se tornou o maior exportador do produto no mundo. De janeiro a setembro deste ano, as vendas subiram 27,7% em relação a igual intervalo do ano passado, para USS 8,7 bilhões, puxada pelo aumento de 40,2% das quantidades exportadas. Com isso, passou a responder por 3,4% das vendas ao exterior do país, quase o triplo do 1,2% registrado no mesmo período de 2021.

Ribeiro aponta aí também o peso da demanda da China, que reduziu as compras de milho dos EUA. Com isso, a participação do país asiático nas compras de milho do Brasil atingiu 21% de janeiro a setembro, transformando-se no principal destino das exportações do produto. Em 2022, a fatia da China foi de apenas 2,7%. A safra de milho no Brasil em 2023 também deverá ser recorde, alcançando 131,8 milhões de toneladas neste ano, 19,6% acima do ano anterior.

Nos últimos 23 anos, a evolução das exportações de petróleo bruto e óleos combustíveis é a que mais chama a atenção. De janeiro a setembro de 2000, as vendas desses dois itens respondiam por apenas 1,5% dos embarques ao exterior; no mesmo período deste ano, a fatia ficou em 15,1%. É o segundo item mais exportado pelo Brasil, posição ocupada desde 2017. A exceção foi 2021, quando o salto dos preços do minério fez o produto superar a soma de petróleo bruto e óleos combustíveis.

A China também abocanha a maior fatia do petróleo bruto que o Brasil exporta – 47% do total no período de janeiro a setembro. A ampliação da produção da commodity, decorrente da extração do pré-sal a partir de 2010, deu impulso para o país se tornar um grande vendedor da commodity no mercado global, diz Cagnin. Já os óleos combustíveis, que se encaixam como produto da indústria de transformação, tiveram Cingapura como principal destino no acumulado deste ano, com 47%.

A força das exportações de commodities vai ajudar a garantir mais um saldo recorde da balança comercial neste ano. De janeiro a setembro, o superávit atingiu US$ 71,3 bilhões, com a China respondendo por 52,8% desse resultado, segundo o boletim do Índice de Comércio Exterior (Icomex) da Fundação Getulio Vargas) deste mês. O saldo em nove meses de 2023 já é superior aos US$ 61,5 bilhões de todo o ano de 2022, que havia sido recorde.

O superávit deste ano se deve também à queda das importações, de 11,7% nos nove primeiros meses. Ribeiro projeta superávit de US$ 86 bilhões para 2023, número que, para ele, não deve se repetir em 2024. Ribeiro estima um saldo no ano que vem na casa de US$ 60 bilhões, com uma economia global mais fraca.

Fonte: Valor
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