O Globo: Arábia saudita suspende compra de frango de 11 frigoríficos

A Arábia Saudita, segundo maior comprador de carne de frango do Brasil, suspendeu as exportações de aves de 11 unidades brasileiras, das quais sete pertencem ao grupo JBS. Com isso, a JBS fica fora desse mercado, segundo a Reuters. A rival BRF não foi afetada pelo veto.

A medida entra em vigor a partir do dia 23 e pegou o governo brasileiro de surpresa. Segundo comunicado conjunto do Itamaraty e do Ministério da Agricultura, a medida poderá ser contestada por meio de uma ação a ser movida contra os sauditas na Organização Mundial do Comércio (OMC), se não houver acordo bilateral.

“Não houve contato prévio das autoridades sauditas, tampouco apresentação de motivações ou justificativas que embasem as suspensões”, diz a nota. O governo brasileiro diz ainda que a notícia foi recebida com “consternação”.

Ainda de acordo com autoridades brasileiras, a decisão saudita só foi conhecida a partir da publicação de uma nova lista de unidades autorizadas a exportar para o país, publicada na quinta-feira pela Saudi Food and Drug Authority (SFDA).

Dessa lista, foram excluídos 11 frigoríficos. Apenas o Brasil foi afetado pela atualização do rol de exportadores.

Integrantes do governo afirmam que não houve uma explicação formal para o bloqueio aos produtos brasileiros. Na avaliação de fontes, a medida foi tomada por “puro protecionismo”. De acordo com uma dessas fontes, a Arábia Saudita tem uma meta de chegar a um nível de autossuficiência na produção de frangos, o que teria motivado a imposição da barreira.

O Brasil é o maior exportador de frango do mundo, tendo alcançado 4,23 milhões de toneladas comercializadas no exterior em 2020. Os Estados Unidos, que vêm na sequência, alcançaram 3,39 milhões de toneladas, segundo números da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).

A Arábia Saudita é o segundo destino do frango brasileiro, perdendo apenas para a China. No primeiro trimestre deste ano, as exportações para o pais árabe somaram 120,8 mil toneladas, gerando US$ 205,8 milhões em receita, expansão de 8,5% e de 15,6%, respectivamente, na comparação com janeiro a março de 2020.

Busca por produção local

A suspensão ocorre na mesma semana em que a companhia saudita Almarai, uma das maiores do país, anunciou um investimento de US$ 1,8 bilhão para dobrar sua produção de frango.

Com isso, o grupo JBS fica fora deste mercado no segmento de aves, segundo a Reuters.

Em nota, a companhia disse que já procurou a autoridade sanitária saudita para dialogar e entender as motivações para o bloqueio dos embarques da proteína. “A produção antes destinada à Arábia Saudita já foi redirecionada para outros mercados”, afirmou a empresa, que é uma das maiores processadoras de carnes do mundo.

Das exportações da JBS em 2020, foram 30,7% para a China; 11,4% para o Japão e 10,5% para África e Oriente Médio. A companhia não conta com uma unidade produtiva na Arábia Saudita.

O grupo Vibra Agroindustrial teve três unidades suspensas e a Agroaraçá teve uma unidade barrada, de acordo com o documento.

A concorrente BRF disse que não foi afetada pela decisão. No entanto, a companhia já contava com suspensões temporárias para o mercado saudita em duas unidades, aplicadas no ano passado.

Agora, o mercado da Arábia Saudita continua sendo acessado somente pela BRF, com quatro unidades, e outras cinco empresas exportadoras menores, quando comparadas às gigantes do setor.

Risco de impacto para exportadores

Para José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), a decisão da Arábia Saudita foi recebida com surpresa, principalmente pela falta de justificativa.

— O Brasil sempre teve um bom relacionamento com a Arábia Saudita, que é destino importante das nossas exportações: segundo maior destino para frango, quarto em açúcar, sétimo em carne bovina. É uma surpresa, que pode ter alguma ligação com a questão ambiental ou, talvez, ruído político — avalia ele.

O movimento dos árabes, contudo, adverte Castro, pode ter outros desdobramentos negativos para os exportadores brasileiros:

— A Arábia Saudita tem um peso político e econômico enorme na região. Então, pode trazer um impacto negativo indireto, levando outros países a fazerem o mesmo, pela grande influência que tem no Oriente Médio e na África. É um destino muito grande. Acaba abrindo espaço para concorrentes do Brasil. E nós não podemos dar chance para isso sem fazer esforço.

Márcio Sette Fortes, professor de relações internacionais do Ibmec e diretor da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), pondera que já se sabia há tempos que os sauditas queriam reduzir importação de frango.

— Não se trata de retaliação ambiental nem política, porque os sauditas seguem comprando uma série de outros produtos do Brasil. A medida, apesar de não ter havido justificativa, não é novidade. Jà sabíamos que a Arábia Saudita tiinha a intenção de ampliar produção local de frango, reduzindo a dependência externa.

Pode haver impacto social no Brasil, continua ele:

— Tem a dinâmica social. No Brasil são gerados cerca de 1,5 milhão de empregos pelo mercado halal. Tudo passa pela relação comercial. Brasil e Arábia Saudita são parceiros comerciais. Uma contenda na OMC não seria o melhor. O entendimento bilateral é o melhor caminho — avalia Fortes.

Aves são o principal produto exportado

Autoridades brasileiras iniciaram, nesta quinta-feira, contatos com o governo da Arábia Saudita e com a embaixada do país em Brasília. O objetivo é esclarecer o episódio.

Dados do Ministério da Economia mostram que as carnes de aves, com destaque para frango fresco, refrigerado ou congelado, lideram a pauta de exportações para a Arábia Saudita, com uma participação de 38% do total.

No primeiro quadrimestre deste ano, as vendas desses produtos ao mercado saudita somaram US$ 275 milhões, montante 18,3% acima do registrado no mesmo período de 2020.

Segundo um integrante do governo, a suspensão desses 11 estabelecimentos não inviabiliza as exportações para aquele mercado, mas certamente terá impacto negativo nas vendas.

A ABPA avalia que a suspensão dos embarques de frango desses 11 frigoríficos não terá impacto significativo no saldo geral das exportações brasileiras, com redirecionamento da produção para outros mercados com o mesmo perfil.

Setor diz cumprir critérios técnicos

Em nota, a ABPA destacou que apoia o governo brasileiro na busca por mais detalhes sobre a “surpreendente decisão unilateral” tomada pelas autoridades sauditas.

A entidade reforçou seu compromisso de parceria estratégica com aquele mercado, um dos mais longevos e importantes importadores de carnes de aves do Brasil.

“A entidade reitera, ainda, a sua plena confiança e o reconhecimento internacional das empresas brasileiras, seja pelo cumprimento de critérios técnicos, pela qualidade e por todos os demais pontos estabelecidos pelas nações importadoras”, destacou a ABPA.

 

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