Tamanho da propriedade é irrelevante para definir a eficiência produtiva e a rentabilidade das terras
Estive na semana passada andando pelo norte do Mato Grosso, a convite do CAT (Clube Amigos da Terra), situado em Sorriso. Pude observar, mais uma vez, o incrível processo de desenvolvimento que se espraia pelo Centro-Oeste do país.
Composto por 16 jovens municípios, criados na década de 1970, liderados por Sinop, Sorriso e Lucas do Rio Verde, o norte mato-grossense está crescendo rapidamente, puxado pela expansão do agronegócio. Junto a outras regiões como, a Leste, Rondonópolis e, a Oeste, Tangará da Serra, o dinamismo de tais polos levou o Mato Grosso a se tornar o maior líder do agro brasileiro.
Na paisagem, entre Sinop (MT) e Sorriso (MT), enchem os olhos as lavouras de soja, que logo em fevereiro serão colhidas, cedendo seu lugar ao cultivo do milho, realizando uma sucessão produtiva que, em muitos casos, será ainda complementada pela pecuária bovina. Trata-se do revolucionário sistema ILP (integração lavoura-pecuária), uma espécie de moto rural contínuo. Surgirão também, mais esparsas, grandes lavouras de algodão.
À beira da rodovia BR-163, que liga Cuiabá (MT) a Santarém (PA), destacam-se enormes silos, fundamentais para garantir a logística da safra. Indo e vindo, é incessante o fluxo de caminhões. Notáveis destilarias de milho (e não de cana-de-açúcar) se instalaram na região para produzir etanol. Você percorre o trecho e enxerga o gigante crescendo.
Inúmeros condomínios residenciais espicham os limites das cidades, caracterizando um boom imobiliário impressionante. Largas avenidas, modernas lojas, tudo é novo por lá. A criação de empregos e as novas oportunidades estão atraindo expressivo fluxo de migrantes, fazendo a população regional dobrar a cada 10 anos. Sinop já tem 240 mil habitantes, Sorriso está com 130 mil e Lucas do Rio Verde beira os 100 mil habitantes. Lembre-se que, no total, o Estado do Mato Grosso tem, ainda, só 3,8 milhões de habitantes.
Mais gente significa mais refeições. Distante dos tradicionais mercados atacadistas, a demanda alimentar está aquecida e impulsiona a pequena agricultura local. Frutas, hortaliças, queijos, ovos, frangos, mel, o que produzir, vende fácil por ali mesmo, com baixo custo de transporte. Aberta pela grande e média propriedade, a região começa a incluir os pequenos agricultores no ciclo do desenvolvimento.
Acompanhei o trabalho do CAT Sorriso no apoio a um grupo de 15 produtores rurais familiares, a maioria instalada nos assentamentos de reforma agrária existentes na região de Sorriso (MT) a Vera (MT). Eles toparam adotar um conjunto de boas práticas agrícolas, qualificando-se para receber um selo de identificação de origem. O projeto soma o apelo de marketing com o requisito tecnológico, capaz de garantir qualidade aos alimentos locais.
Visitei 6 dessas pequenas propriedades, com áreas exploradas de 2 a 14 hectares. Todas progridem notavelmente. Fiz aos produtores uma pergunta comum: qual a razão do sucesso de vocês?
A resposta foi unânime, transmitida em linguagem simples:
Primeiro, você tem que sair do modo tradicional e investir para adotar as novas tecnologias de produção e de comercialização;
Segundo, não ficar batendo cabeça sozinho e buscar assistência técnica de agrônomos e outros profissionais;
Trabalhar muito, dedicar-se 100% na atividade, ficar em cima para fazer a correta gestão da propriedade.
Não encontrei nenhum deles choroso, submisso, reclamando da vida, xingando o governo e sentindo-se vítima da sociedade. Pelo contrário. Encontrei só gente feliz, empreendedora, com atitude colaborativa e olhando para a frente. Humildes e trabalhadores, sabem que é o conhecimento, e não o assistencialismo, que abre caminho para o progresso. Investem em sua própria competência.
Nesses mesmos dias, fui a duas grandes fazendas produtoras de grãos, uma com 10.000 hectares e outra com 1.500 hectares. Ao lado de outras dezenas de propriedades, são certificadas, continuadamente há 10 anos, pelo CAT Sorriso, dentro do padrão de sustentabilidade RTRS.
Ambas cumprem rigorosamente o Código Florestal e implementam programas de recuperação de áreas degradadas. Adotam insumos biológicos em suas lavouras, seja para controlar pragas, seja para melhorar a qualidade dos solos. Seguem a cartilha agroambiental.
Todos os agricultores que conheci, pequenos, médios ou grandes, se inserem no mundo do agronegócio sustentável, disputam o campeonato da competitividade e cuidam da gestão produtiva de seus negócios. Ou seja, o tamanho da propriedade se mostrou irrelevante para definir a eficiência produtiva e, consequentemente, a rentabilidade.
Conclusão: erra redondamente quem opõe a agricultura familiar ao agronegócio, e vice-versa. A prova está ali, no coração do Mato Grosso, onde vi surgindo a riqueza do agronegócio familiar, alicerçada no avanço tecnológico e no acesso aos mercados.
Duvida? Vá ver….
Xico Graziano é engenheiro agrônomo e doutor em administração
Artigo publicado anteriormente no Poder360 e gentilmente cedido pelo autor a SNA.