*Roberto Rodrigues
Nesta semana a CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento) e o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) anunciaram suas respectivas previsões de colheita da safra de grãos 2010/2011.
Salta à vista a diferença entre as duas previsões: a CONAB, órgão ligado ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, fala em um novo recorde, 154,2 milhões de toneladas de grãos, um crescimento de 5 milhões de toneladas sobre o ano passado. Já o IBGE, órgão ligado ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, fala em 151,2 milhões de toneladas, 3 milhões a menos que a previsão da CONAB.
Ao cidadão comum esta diferença suscita pelo menos uma dúvida: como é possível que existam duas instituições públicas fazendo a mesma coisa e chegando a resultado diferente, mesmo que esta diferença seja de apenas 2%? Afinal, porque 2 levantamentos? Não estamos gastando dinheiro público sem necessidade com duplicação de trabalho? Qual dos dois levantamentos é o mais crível? Ou, ainda pior: será que apenas um dos dois é confiável?
São questões procedentes que merecem consideração por parte das autoridades.
As equipes de ambas as instituições – CONAB e IBGE – são muito experientes, competentes, sérias e bastante afinadas entre si. As discrepâncias têm a ver com critérios para a amostragem e eventualmente até com a época em que se faz o levantamento nos locais amostrados. A pesquisa da CONAB, por exemplo, foi realizada na semana de 21 a 24 de fevereiro nas regiões Sul, Sudeste e Centro Oeste, além de parte do Nordeste e Norte. De lá para cá vem chovendo exageradamente em muitas destas áreas, e se o levantamento fosse feito hoje, seguramente já se diria que cerca de 1 milhão de toneladas de soja foram perdidas com o excesso de umidade, inibidor da colheita. Portanto, diferenças são compreensíveis.
Mas já passa da hora de unificar este trabalho, em primeiro lugar por uma questão de maior eficiência da máquina pública: os recursos são escassos e não faz sentido a duplicidade de esforços. Adicionalmente, esta diferença, mesmo pequena, gera desconfiança no mercado, do que se aproveitam especuladores e os concorrentes do Brasil no mercado global: há consequências de caráter comercial, o que implica renda para os produtores rurais, para os consumidores e para o país, sobretudo quanto à sua segurança alimentar e ao saldo comercial externo.
Estes pontos exigem segurança absoluta nos levantamentos, para que os dados publicados gerem tranquilidade a todos os atores do mercado. Não deve ser tão complicado unificar o trabalho de CONAB e IBGE. Talvez haja interesses corporativos postergando esta unificação, mas o interesse nacional está acima disso, é claro, e, sendo instituições competentes, talvez falte apenas uma decisão política mais consistente na direção da sua harmonização. O mesmo deve ser feito com outras excelentes entidades públicas, que devem se relacionar ainda com organismos similares ligados a universidades ou governos estaduais. O que interessa é o dado confiável, sem nenhuma mácula determinada por razões corporativas, vaidades pessoais ou idiossincrasias históricas.
Seja como for, e esta é a boa notícia, estamos colhendo mais uma safra recorde. E de novo com lastro na tecnologia moderna criada por nossos extraordinários pesquisadores, difundida por nossos heróicos extensionistas e aplicada pelos competitivos produtores rurais de todos os rincões deste imenso país. Esta formidável malha de homens e mulheres mergulhados 24 horas por dia na busca da eficiência, da sustentabilidade, da redução de custos e do aumento da produtividade é responsável por mais este salto: a área plantada cresceu 3,1% da safra 2009/2010 para a atual; mas a produção cresceu 3,4%. Parece pouco, mas a produção cresceu 10% mais do que a área. Isso significa mais grãos por hectare, menos demanda por novas áreas, mais segurança alimentar, mais excedente exportável e menos inflação.
* Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior de Agronegócio da FIESP e professor de Economia Rural da UNESP/Jaboticabal
** Publicado na Folha de São Paulo, 12/03/2011