A cidade que ganhou fama como a maior produtora de feijão do Brasil espera um salto sem precedentes do lucro agrícola com as safras deste ano.
Unaí, no noroeste de Minas Gerais, é movida pelo agronegócio e tem o feijão, a soja e o milho como suas principais culturas.
Fazendeiros que estão começando agora a colheita do feijão tiraram a sorte grande e aproveitam como nunca a alta dos preços da leguminosa. Outros esperam capturar ao menos parte desses ganhos na safra de setembro e outubro.
“Eu vendi a saca a R$ 450,00. Nunca tinha vendido a esse preço”, diz, sem esconder o espanto, Antônio Geraldo Mesquita, de 45 anos, produtor na região. “Geralmente, a gente vende só depois de colhido, mas o mercado está tão escasso que agora antes de colher já tem comprador.”
Agricultor experiente e um dos pioneiros da onda de imigrantes gaúchos que chegaram a Unaí na década de 1970, Dirceu Gatto começa a colher o feijão de suas terras dentro de 15 a 20 dias.
Imagina que até lá o preço deverá ter recuado um pouco, mas ainda assim acha que terá um prêmio: espera vender a saca por R$ 300,00. O patamar considerado normal é de R$ 180,00 a R$ 200,00.
Mesquita e Gatto são alguns dos produtores de maior porte de Unaí. Preveem alguma retração dos preços nos próximos meses, mas creem que só no início de 2017 voltarão aos níveis de alguns meses atrás.
De acordo com o IBGE, nos últimos anos Unaí tem sido o município que mais produziu feijão no Brasil.
Em 2012, foram 112.200 toneladas. Em 2013, 90.000 toneladas. E em 2014 (último dado consolidado), 91.600 toneladas. O produto enche pacotes de marcas vendidas principalmente em Minas, São Paulo, Distrito Federal e alguns Estados do Nordeste.
Em 2014, produtores da cidade sentiram um baque. Naquele ano, a produção nacional chegou a um pico de 3.3 milhões de toneladas e o preço despencou. Em Unaí, vários produtores venderam a saca – a mesma que agora oscila de R$ 450,00 a R$ 500,00 – por R$ 40,00.
Antonio Mesquita foi um deles. O resultado não poderia ser outro. Na “capital” brasileira do feijão – assim como em outras regiões – os produtores perderam (além de dinheiro) o entusiasmo que tinham com o grão e decidiram investir mais em soja e milho.
Carlos Oberto Corrêa da Costa, 58 anos, dono da fazenda Santa Matilde, que há 33 anos produz na região, fez isso. “Eu não plantei feijão em abril. Estaria colhendo agora em julho. Optei pelo milho, porque o preço estava bom”, conta ele.
Essa é uma das explicações para o valor do feijão atualmente no País – preços que de R$ 4,00 ou R$ 5,00 o quilo nos supermercados chegaram a R$ 10,00 ou R$ 12,00. Na semana passada, um supermercado movimentado no centro de Unaí, o Armazém do Elinho, vendia um quilo de feijão carioquinha a R$ 11,90.
Desestimulados pelos preços da saca em 2014 e estimulados com os da soja e do milho, muitos produtores reduziram o plantio de feijão. Este ano, a seca castigou as lavouras do grão em Unaí e nas terras do Planalto Central dominadas por grandes fazendas.
“A safra entre 2013 e 2014 foi normal. Mais de 40 sacas por hectare, no período das chuvas. Em 2014 e 2015 caiu para 25 sacas e entre 2015 e 2016, para 22 sacas. Isso em toda a nossa região”, conta Costa. Além disso, houve seca no Centro-Oeste, chuva em demasia no Paraná, granizo em São Paulo. Com a oferta menor, os preços subiram.
Claro que com os preços atuais, o feijão voltou a ser uma cultura atraente para os produtores – ainda mais porque houve também quebras significativas na soja e no milho safrinha. Mas quem acha que Unaí vê o grão com o mesmo entusiasmo de antes, se engana.
Costa resume assim o sentimento de muitos produtores da região: “Eu tenho medo de plantar muito agora porque todo mundo pode inventar de plantar, e os preços despencarem de novo”.
Para piorar, o insumo básico também está escasso. “Agora está faltando até semente. Teve quebra na produção de semente”. Seu plano é plantar cerca de 1.500 hectares de feijão por agora. A semeadura começou há cerca de 15 dias para uma colheita prevista para setembro.
Há também outra questão em jogo. “Não dei conta de aumentar a área de feijão este ano por limitação hídrica”, completa Dirceu Gatto. Ele ocupou 15 pivôs com feijão que vai colher entre julho e agosto.
Gaúchos, catarinenses, paranaenses – que representam cerca de 70% dos produtores rurais da cidade – e também mineiros e paulistas em Unaí precisam irrigar as terras quando plantam fora do verão. Contam com a chuva no plantio de outubro e novembro. A maior safra de feijão do Brasil é essa, colhida em janeiro.
Como choveu menos do que o necessário neste ano e nos anteriores, em muitas localidades no Brasil Central não há água abundante nos reservatórios e rios para alimentar os pivôs de irrigação nesta temporada de seca. Tudo isso deve pesar na oferta de feijão deste ano.
A supervisão agropecuária do IBGE em Minas Gerais informa que a previsão de produção para este ano em Unaí é de 63.600 toneladas de feijão – ante a produção de 91.000 toneladas de 2014.
As estimativas citadas pelo órgão para o País refletem uma queda generalizada. Enquanto o Brasil produziu as 3.3 milhões de toneladas em 2014, o número estimado para 2016 é de 2.9 milhões.
Unaí vive basicamente do dinheiro da agropecuária. Produtores costumam investir em imóveis na cidade e em Brasília, que fica a pouco mais de uma hora de carro. O feijão, que já foi um negócio de produtores familiares, é hoje na região assunto para empresários do agronegócio.
O cálculo repetido em Unaí é que a próxima safra representativa do país é a que será plantada em fins de julho no Estado de São Paulo e colhida em fins de setembro. A do Paraná começa a chegar aos distribuidores e empacotadores em janeiro. E aí então, no início de 2017, os preços voltariam ao normal.
Ninguém em Unaí parece estar levando muito a sério a decisão do governo federal de zerar a alíquota de importação de feijão de fora do MERCOSUL para derrubar os preços.
A opinião geral ouvida pela reportagem é que ou os fornecedores já conhecidos, como Argentina e Bolívia, não teriam fôlego para garantir uma elevação significativa de oferta no Brasil a ponto de mexer nos preços. E que o produto de eventuais fornecedores do México ou China esbarram ainda em questões sanitárias.
Fonte: Valor Econômico