Por Marcos Fava Neves*/
Quais são os fatos e impactos na cana?
De acordo com a Unica, a moagem acumulada desta safra até o dia 1º de junho foi de 111 milhões de toneladas, contra 141.37 milhões de toneladas na safra passada. Estamos atrasados em quase 30 milhões de toneladas. Resultado da safra que começou atrasada com menos cana bisada e condições climáticas menos favoráveis à moagem. Estamos também com ATR bem mais baixo (118,36 contra 122,31) e a produtividade de 79,98 toneladas por hectare, o que dá 9% a menos que na safra anterior.
O clima aparentemente ajudou um pouco neste mês, mantendo as projeções ao redor de 585 milhões de toneladas (3,65% menor) com produção de açúcar de 35.2 milhões de toneladas (1,2% menor) e de 24.7 bilhões de litros de etanol (3,71% menor). Isso tudo para uma capacidade de moagem no Centro-Sul ao redor de 630 milhões de toneladas.
Em relação a resultados, a Copersucar na safra 2016/17 teve faturamento de R$ 28.3 bilhões (31% com açúcar e 65% com etanol), aumento de 7,3% e deixou lucro líquido de R$ 254.4 milhões. A Tereos anunciou um faturamento de R$ 10.2 bilhões e lucro líquido de R$ 191 milhões, contra um prejuízo de R$ 180 milhões na safra anterior, vindos de um processamento de 20.1 milhões de toneladas com produtividade de 78 ton/ha e ATR de 134,9 kg/ton. A alavancagem caiu de 4,2 vezes para 2,9 vezes. O CTC anunciou também lucro de R$ 12.5 milhões na safra 2016/17.
Boa notícia também foi a aprovação da cana transgênica pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). É a primeira no mundo e, finalmente, a Zilor processou na safra 11.341 milhões de toneladas (sendo 38% para açúcar), obtendo receita líquida de R$ 2 bilhões e lucro líquido de R$ 167.4 milhões. Sua alavancagem também caiu de 3,8 para 2,5 vezes.
Quais são os fatos e impactos no açúcar neste mês de junho?
O mês no açúcar não foi bom. Um conjunto de notícias ajudou a derrubar as cotações mais do que eu acreditava. Vamos aos fatos: aspectos como a entrega física de açúcar por um grande produtor em março, o câmbio (movimento de desvalorização do real derruba os preços do açúcar), expectativas de aumentos de produções em concorrentes, queda do preço do petróleo e da gasolina no Brasil (mesmo com desvalorização do real), organizações (fundos) que investiram esperando valorização, elevação do imposto de importação na China (a taxa além da cota de 1.95 milhão de toneladas por ano foi elevada de 50% para 95%) e o consumo de hidratado que não reagiu como deveria.
O preço chegou a ser o menor em 20 meses, tocando menos de 13 cents/libra peso. De acordo com a Archer Consulting, o valor do início de junho (R$ 1.027,00 por tonelada) foi o menor desde setembro de 2015. E pensar que neste ano já tivemos 21,49 cents (06/02) quando bons analistas e alguns sortudos aproveitaram para vender.
Maio foi muito bom para as exportações. Enviamos 2.440 milhões de toneladas de açúcar (bruto e refinado), o que representa crescimento de 50,4% em relação ao mês anterior e 21,3% acima de maio de 2016. Entraram US$ 1.036 bilhão, 43,2% a mais que os US$ 723.7 milhões de abril e quase 55% maior que os US$ 671 milhões de maio passado. Até o final de maio, o volume total vendido (acumulado do ano) atingiu 9.693 milhões de toneladas (cerca de 1,5% a menos), mas a receita está 40,5% maior, atingindo US$ 4.239 bilhões.
Em relação às perspectivas da safra, a Copersucar já acredita em queda na produção de açúcar na safra 2017/18 devidos aos preços baixos e etanol mais competitivo. De 36 milhões, esperam agora 35.5 milhões de toneladas. Quanto maior a distância em relação ao porto, mais a conversão para etanol tem sido observada. Esperam também mudança no superávit de dois a três milhões de toneladas, a depender deste movimento que já alertei na coluna de maio, para menor. Tal como a Copersucar, a Archer acredita que a produção de açúcar pode ser 1.5 milhão de toneladas menor.
Para a Datagro, a produção global de açúcar em 2017/2018 passa de um déficit de 200 mil toneladas para 640 mil toneladas de superávit. Também caiu o déficit do ciclo 2016/2017, de 7.85 milhões para 6.78 milhões de toneladas, devido ao aumento de produção na Índia (de 19.2 milhões para 20.5 milhões de toneladas em 16/17 e 23.5 milhões para 24.2 milhões de toneladas em 17/18). A produção também cresceu na China de 9.8 milhões para 10.47 milhões. Também deve aumentar o açúcar europeu de beterraba, puxado pela Ucrânia.
A Organização Internacional do Açúcar (OIA) mudou a sua estimativa para o déficit global da commodity na safra 2016/2017 para 6.465 milhões de toneladas, superior ao último relatório que estimava 5.869 milhões de toneladas. A produção deve ser de 165.928 milhões (0,3% maior) e o consumo de 172.393 milhões (1,22% maior). Em relação a 2017/18, acreditam em superávit de três milhões de toneladas, que deve ser mantido também em 2018/19.
Pela Sucden, na safra 2017/18, o mundo produzirá 183 milhões de toneladas e consumirá 179.5 milhões (1,4% maior), deixando um superávit de 3.5 milhões. Produção puxada por União Europeia, Índia, Tailândia e China. São menores também as probabilidades de eventos climáticos. Como sempre digo que “preço muito bom não é bom”, vamos colher agora os resultados dos excelentes preços em alguns momentos de 2016. Porém, o Rabobank estima valores maiores até o final deste ano, devido aos fundos de investimentos, pois acredita que os preços estão baixos demais, observando a relação entre estoque e consumo.
Ponto negativo para nós foi a estimativa da Unica, ao informar que a taxação da China pode reduzir as exportações do Brasil em 800 mil toneladas de açúcar neste ano, e também o acordo entre os governos de Estados Unidos e México, que permite a este continuar a vender açúcar aos EUA. Porém o México terá de alterar a proporção de 50% para 30% de açúcar refinado nas vendas totais, permitindo mais refino nos EUA. Os preços mínimos e nível de pureza também aumentaram.
Minha leitura no açúcar está alinhada com o Rabobank, de preços maiores para o açúcar em breve e média de preços entre 16 a 17 cents/libra peso nesta safra, a menos que o petróleo caia mais e não consigamos escoar mais cana via hidratado, o que neste momento não é minha aposta, apesar dos resultados não estarem bons, como veremos a seguir.
Quais são os fatos e impactos no etanol neste junho?
Pela ANP, o consumo de combustíveis em gasolina equivalente cresceu nos últimos 12 meses 0.14%. Etanol anidro e gasolina A (sem mistura) aumentaram 5.78%, e o hidratado caiu 19,49%, trazendo a proporção para 44.4% de etanol e 55.6% de gasolina. Em maio também a venda de etanol pelas usinas caiu 12,15% em relação a maio de 2016, para 2,10 bilhões de litros. Desde o início da safra, as vendas diminuíram 14,26%, somando 3.82 bilhões de litros. O anidro caiu 9,18% e o hidratado 17,79%.
Foi aprovada pela Comissão Especial da Câmara Federal uma proposta que permite aos municípios colocar uma Cide municipal para custear transporte público. Falta agora ser aprovada pelo plenário. Portanto, pode ter chances de ser aplicada, nos municípios canavieiros, apenas para a gasolina, ajudando no consumo de hidratado. O governo volta a falar em Cide com a queda da arrecadação, o que pode ser um alento neste momento de queda dos preços do petróleo.
A queda nos preços do açúcar e a possibilidade do Brasil fazer mais etanol já afetam as expectativas com exportações do etanol de milho dos EUA, mostrando como as coisas são interrelacionadas no complexo agronegócio mundial.
A Nissan conclui neste mês um primeiro momento de testes do projeto e-Bio Fuel Cell, o carro elétrico que usa etanol com fonte geradora de hidrogênio e que é transformado em eletricidade. Mas a empresa acredita que, somente após 2020 esta tecnologia estará disponível, o que foi triste, pois eu achava que poderia vir antes.
Um caso de sucesso é o Protocolo Agroambiental do Setor Sucroenergético, segundo estudo apresentado pela Secretaria do Meio Ambiente, que reduziu praticamente dez milhões de toneladas de gás carbônico, equivalente entre as safras 2006/07 e 2016/17. Também deixamos de lançar 56 milhões de toneladas de poluentes, entre eles o CO (monóxido de carbono). O número de colhedoras saltou de 753 em 2006/07 para três mil em 2016/17. A queima hoje está restrita a apenas 2,5% do território paulista com cana. Trata-se de um presente dado pelo setor à sociedade paulista, praticamente sem cobrar.
Finalmente foi atingido o limite de etanol que pode ser produzido à partir do milho nos EUA desde que a lei passou no Congresso em 2007, que estipulou 15 bilhões de galões em 2017. Como a lei coloca que devem ser produzidos 36 bilhões de galões até 2022, outros tipos de biocombustíveis precisam acelerar o passo para atingir esta produção até lá, o que não vem acontecendo. Para crescer, a indústria de etanol dos EUA precisa das exportações e do crescimento de combustíveis que levem mais etanol, como o E85.
Os preços do petróleo, que mês passado foram favoráveis ao etanol por terem subido, voltaram a cair, mesmo com anúncios de corte da produção feitos pela Opep. Esta variável vem atrapalhando bem a cana nos últimos 30 dias. A Petrobras abaixou o preço da gasolina – ação justificada por uma necessidade de recuperação de participação de mercado, pois as importações de diesel e gasolina aumentaram bastante em seus concorrentes, em detrimento das compras nas refinarias da empresa, trazendo, com isso, maior ociosidade nos ativos de refino da empresa. Pela ANP, as importações de diesel saltaram 47% no bimestre, motivadas por um prêmio de 16,4% e de quase 3% na gasolina. Esta queda atrapalhou o retorno do hidratado.
A Epe (Empresa de Pesquisa Energética) publicou sua nova análise dos próximos dez anos no Brasil. Entre as principais conclusões estão uma queda de participação de mercado da Petrobrás na produção nacional de petróleo de 78% para 70% até 2026. Nossa produção deve dobrar para algo entre 4.7 milhões e 5 milhões de barris diários em 2026.
Na visão da Epe a demanda (Ciclo Otto) não acompanha a oferta, pois crescerá apenas 9,25% até 2026 e o Brasil passará a exportar 1.5 milhão a 2 milhões de barris/dia. A boa notícia é o aumento na participação do hidratado dos atuais 30% para 46% em 2026, com expansão de uma a duas novas usinas por ano a partir de 2021. A Epe está mais verde recentemente.
Os valores caíram muito (6% desde o início da safra e 28% desde o início do ano) graças à queda do preço do petróleo, mas o consumo não reagiu, ficando pouco acima de um bilhão de litros. Concluindo, o etanol hidratado precisa recuperar espaço no mercado para ajudar no preço do açúcar. Continuo crendo que como temos menos cana e a economia começa a dar sinais de vida, eu não venderia agora.
*Marcos Fava Neves é professor titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP), campus de Ribeirão Preto. Em 2013 foi professor visitante internacional da Purdue University (EUA), e desde 2006 é professor visitante internacional da Universidade de Buenos Aires.
Fonte: Notícias Agrícolas