Márcio Lopes de Freitas

Foto: Sistema OCB
Por, Marcelo Sá
Equipe SNA

Agropecuarista e cooperativista há quase 30 anos, Márcio Lopes de Freitas, 64 anos, é natural de Patrocínio Paulista, interior de São Paulo (SP). A paixão pela agricultura e pelo cooperativismo vem de família. A primeira está concretizada em uma propriedade localizada na região de sua cidade natal, onde cultiva café, produção de olerícolas orgânicas, além da criação de gado.

Freitas é graduado em Administração pela Universidade de Brasília (UnB). Por acreditar e defender os valores e princípios do cooperativismo, buscou na atividade cooperada uma melhor alternativa de vida. Sua participação direta no cooperativismo teve início em 1994, nas diretorias da Cooperativa de Cafeicultores e Agropecuaristas (Cocapec) e da Cooperativa de Crédito Rural (Credicocapec), nas quais atuou como presidente.

Sua contribuição para o desenvolvimento do cooperativismo teve continuidade na gestão frente à Organização das Cooperativas do Estado de São Paulo (Ocesp), entre 1997 e 2001, e, finalmente, como representante máximo do setor, no exercício de presidente da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) e do Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (Sescoop), desde 2001 e da Confederação Nacional das Cooperativas (CNCoop) desde 2005. Sendo também, desde 2008, vice-presidente pelas Américas da Internacional Co-operative Agricultural Organisation (ICAO), organização setorial da ACI e eleito em julho/2022 como membro do Conselho de Administração da Aliança Cooperativa Internacional (ACI).

Ele conversou com a SNA sobre a importância do cooperativismo agrícola e como essa vertente desempenha papel fundamental no setor, escoando a produção de pequenos produtores e fornecendo assistência técnica e apoio logístico. Além disso, discorreu sobre como a reforma tributária e o Plano Safra 23/24 contemplaram as associações. Confira a seguir:

 

SNA: As cooperativas agropecuárias constituem um alicerce para a produção de gêneros alimentícios no Brasil, com aumento de 20% no faturamento em 2022, segundo dados do Anuário do Cooperativismo Brasileiro. De que forma elas alavancaram o crescimento nas últimas décadas, período que marcou de expansão do agronegócio nacional para o interior do País e o grande salto de produção, exportação, fomento e pesquisa?

A resiliência e constância são sinônimos de cooperativismo quando analisamos os resultados econômicos desse modelo de negócios coletivo, focado não somente no retorno financeiro, mas também nas pessoas. E, quando o foco de um negócio é a cooperação, não existe outro resultado que não seja prosperidade e desenvolvimento regional. Assim, os crescimentos apresentados pelas cooperativas agropecuárias nos últimos anos são uma consequência dos atributos gerados por essa estrutura societária diferenciada.

A participação ativa dos cooperados nas decisões da cooperativa, junto a planejamentos estratégicos de médio e longo prazo, criam combinações para gestão compartilhada do negócio que direciona os caminhos do movimento para as demandas dos cooperados e, consequentemente, para resultados crescentes como os apresentados em 2022.

Aspectos como a expansão do agronegócio para o interior, saltos de produção, elevação das exportações, fomento e pesquisa também contam com contribuições significativas dos produtores rurais cooperados e suas cooperativas para o Brasil, uma vez eles potencializam o crescimento do interior, promovem a prosperidade local, acessam mercados internacionais, além de incentivarem, produzirem, difundirem e adotarem novas tecnologias e boas práticas no campo.

SNA: O cooperativismo agropecuário permite que os pequenos e médios agricultores tenham acesso a crédito, insumos, assistência técnica e possam participar dessa indústria pujante, escoando sua produção. Os novos números indicam que esse contingente passou de coadjuvante a protagonista desse cenário. De que maneira essa projeção ajuda no debate nacional para aperfeiçoamento das políticas públicas direcionadas ao setor e solução de desafios logísticos e estruturais? 

Quando o assunto é voltado para desafios logísticos e estruturais, as cooperativas agropecuárias são parte da solução. É por meio delas que pequenos e médios agricultores acessam esses serviços, diluem custos e conseguem o que não conseguiriam individualmente, ou seja, competitividade por meio da cooperação.

Nesse sentido, o cooperativismo agropecuário representa hoje quase ¼ da capacidade estática instalada no país para armazenagem agrícola. Assim como é para 72,1% do quadro social do perfil da agricultura familiar, inserido nas cooperativas, o meio para acesso à infraestrutura, que permite melhor tomada de decisão de comercialização, organização da cadeia produtiva e da cadeia de suprimentos, principalmente por meio da geração de poder de escala e da redução de custos fixos, que permitem maior eficiência e margem para a atividade desse público.

Por fim, no que tange o debate nacional para aperfeiçoamento de políticas públicas voltadas ao setor e à infraestrutura de escoamento nacional, é necessária priorização, principalmente para um dos alicerces do desenvolvimento sustentável do setor agropecuário, com foco no aprimoramento constante, mensuração para alocação de recursos humanos e financeiros de maneira eficiente além de direcionamento para a solução do problema.

SNA: Qual sua avaliação sobre o Plano Safra, divulgado recentemente, no tocante às cooperativas? Analogamente, considera que a reforma tributária, ainda em tramitação, contemplará as necessidades das cooperativas, mediante atuação das entidades representativas que estão coordenando o diálogo no Congresso?

Primeiramente, é importante relembrar que a política agrícola de crédito é estruturada a cada ano safra e desta forma mudanças positivas e negativas ao cooperativismo sempre acontecem. E, para o Plano Safra 2023/24, não foi diferente, modificações ocorreram, muitas favoráveis e outras que necessitam de atenção.

A respeito dos pontos de destaque, é válido mencionar que a arquitetura da política agrícola foi mantida, os volumes de financiamento foram aumentados e pontos específicos e necessários ao cooperativismo agropecuário foram levados em conta. Por outro lado, apesar de compreensível frente ao cenário econômico, as taxas de juros se mantiveram nos patamares, exigindo de aspectos de gestão e governança das cooperativas para tomarem a melhor decisão no momento da tomada do crédito rural.

No que diz respeito a reforma tributária, é importante ressaltar que um grande passo foi dado na trajetória de construção de uma política de tributos justa para o país. Inserido nesse contexto está o adequado tratamento ao ato cooperativo, prioridade do cooperativismo, e que, após conquista histórica, resultado de articulação do Sistema OCB junto aos parlamentares e outros atores-chave, foi contemplado no texto final da reforma aprovado na Câmara dos Deputados.

Existe ainda um longo caminho a ser percorrido, mas a tramitação no Senado Federal e formulação das leis complementares já estão no radar do cooperativismo e seguiremos dialogando, argumentando e construindo pontes em prol de uma reforma justa, que permita segurança jurídica para que o nosso modelo de negócios siga distribuindo prosperidade para as pessoas e para o meio social em que estão inseridas.

SNA: O que as cooperativas agropecuárias podem ensinar, com seu sucesso, às associações de outros setores?

 O sucesso do cooperativismo é consequência de um modelo de negócios com princípios claros e resilientes, que permite a perenidade e geração de prosperidade para as pessoas e para o meio social em que estão inseridas.

As cooperativas agropecuárias inseridas nesse cenário não são diferentes, e conseguem por meio de mais de 1 milhão de produtores rurais cooperados, distribuídos em 1.185 cooperativas agropecuárias, repassar esses valores e disseminar a cultura do cooperativismo.

É na capacidade de criar cultura, enraizar valores e distribuir felicidade que estão os ensinamentos e a beleza deste modelo de negócios, que consegue, por meio desses atributos, criar um ciclo virtuoso de prosperidade.

Assim, o trabalho orientado e organizado; a capacidade de escala; a participação do quadro social nas decisões das cooperativas, inclusive em relação à distribuição de sobras; a agregação de valor; o atendimento as demandas dos cooperados; e os princípios e valores são, dentre muitos outros, ensinamentos a serem aproveitados por outros modelos de negócio e pela sociedade em geral.

Em resumo, cooperar para prosperar.

SNA: As cooperativas têm sido incubadoras para teste de novas tecnologias, além de combaterem o desperdício e atraírem investimentos de empresas para projetos de cunho social. De que forma isso tem fortalecido os laços comunitários e criado um traço distintivo da cultura regional? 

O cooperativismo tem em sua origem o papel de fomentar a inovação, seja ela gerada dentro da cooperativa ou disseminada por ela. Desta forma, um movimento que nasce de pessoas para as pessoas, também tem como diretriz atender as demandas dos quadros sociais que o compõem, além de possuir como princípio o interesse pela comunidade.

Assim, a união de todos esses aspectos positivos promove iniciativas que, além de gerarem novas tecnologias, combatem o desperdício e promovem avanços de cunho social.

Dentre essas proposições podemos citar os programas de formação de profissionais fomentados pelas cooperativas, assim como ações para inclusão e atendimento aos familiares dos cooperados.  No que tange aos desperdícios, as cooperativas são vanguarda no reuso de produtos para geração de energia, na logística reversa de embalagens, assim como fomentadores de eficiência para uso de produtos e insumos.

Em relação as iniciativas voltadas ao desenvolvimento da inovação, se destacam os movimentos de intercooperação, como é o caso das redes de assistência técnica e extensão rural promovidas pelos departamentos técnicos das cooperativas. Outro exemplo são as feiras agropecuárias, muitas delas elaborados pelo cooperativismo, que tem o papel de aproximar a sociedade do que está sendo pesquisado, praticado e ofertado de mais moderno e eficiente para as pessoas e suas atividades.

 

 

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