Maior demanda de recurso leva agro a “boom” de crédito via mercado de capitais

A maior demanda por crédito agrícola em 2022/23 tem levado produtores e companhias do setor no Brasil a ir além de fontes como bancos públicos e privados para avançar cada vez mais em financiamento via emissões no mercado de capitais.

Com o aumento esperado nas safras de soja e milho do Brasil e expectativa de boa lucratividade do agronegócio, apesar de custos mais altos por juros ou insumos mais caros, muitos financiadores têm ofertado recursos por meio de mecanismos menos tradicionais, enquanto o setor também buscado novas alternativas, como o Fiagro.

“Há uma redução dos níveis de crédito controlado (Plano Safra, do governo) para agricultura comercial e agroindústria, e também tivemos um aumento na necessidade de capital muito grande, com os próprios aumentos dos custos de produção”, disse o gerente da Consultoria Agro do Itaú BBA, Guilherme Bellotti.

O Ministério da Agricultura estima que a necessidade de financiamento agrícola do Brasil é de R$ 800 bilhões, enquanto os recursos do governamental Plano Safra 2022/23, que inclui crédito subsidiado, totalizam R$ 340 bilhões.

Aproximação

De fato, “não tem dinheiro (do Plano Safra) para todo mundo”, disse à Reuters, na última semana, o secretário de Política Agrícola do ministério, Guilherme Soria Bastos, acrescentando que o governo fomenta a aproximação do setor com agentes financeiros privados.

“Isso fez com que os players se aproximassem dos bancos e mercado de capitais, seja através de CRA (Certificado de Recebíveis do Agronegócio), fundos, Fiagros (Fundos de Investimento em Cadeias Agroindustriais), etc.”, completou o especialista do Itaú BBA.

As emissões de CRAs, por exemplo, mais que dobraram no acumulado do ano até julho, em relação ao primeiro semestre de 2021, somando cerca de R$ 26 bilhões, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), levantados pela Nexgen Capital, que tem ampliado sua atuação neste segmento.

Negócios

Operações com novos mecanismos de financiamento, como os Fiagros, lançados no ano passado, também estão acontecendo.

Na quinta-feira passada, a Vinci Partners, controladora de uma plataforma de investimentos no Brasil, anunciou o fechamento de R$ 360 milhões para o Vinci Crédito Agro Fiagro Imobiliário (VICA).

Trata-se do primeiro produto da Vinci Partners no âmbito da joint venture com a Chrimata, empresa de investimentos focada no setor do agronegócio, anunciada em maio de 2021.

Já o Itaú BBA desembolsou R$ 57 milhões na semana passada para financiamento de duas emissões de Cédulas de Produto Rural (CPR), por revendas de insumos, uma de Mato Grosso e outra do Pará, em operações atípicas junto ao setor de distribuição.

No início do mês, a companhia de sementes Boa Safra e a gestora de investimentos independente Suno Asset lançaram seu primeiro Fiagro, cujo IPO bateu um recorde de liquidez em sua estreia na bolsa de valores brasileira, a B3. O ativo movimentou R$ 10.39 milhões no seu IPO, o maior volume de negociação para um Fiagro em um lançamento.

Em julho, foi a vez da Caramuru Alimentos, uma das principais processadoras de soja do país, emitir um CRA de R$ 600 milhões.

Atratividade

Bellotti ressaltou que o aumento substancial na taxa básica de juros (Selic) eleva o custo de capital de todas as operações privadas, o que, em tese, deveria reduzir a atratividade das emissões no mercado de capitais. No entanto, elas seguem crescendo mesmo nesse cenário.

“Apesar desse aumento do custo de capital, quando você se defronta com aumento da necessidade de dinheiro para fazer frente a capital de giro, vemos que a coisa tem girado mesmo assim”, comentou sobre os emissores.

Na ponta investidora, a resiliência do agronegócio comparado a outros setores da economia faz com que os ativos de companhias agrícolas sejam vistos com bons olhos pelo mercado.

“Esse estreitamento do agronegócio com o mercado bancário e com o mercado de capitais acaba passando também por uma melhora nos níveis de governança das empresas”, disse Bellotti.

Agentes autônomos

Lucas Oliveira, cofundador da Nexgen Capital, um escritório de agentes autônomos associados à XP Investimentos, também atribui o avanço destas relações entre o campo e a “Faria Lima” à atuação dos agentes intermediários.

“O segmento dos agentes autônomos vem contribuindo muito para isso, faz com que bons ‘cases’ sejam levados a fundos de investimentos, que hoje estão com o olhar muito mais atento a essas oportunidades no país inteiro”, disse Oliveira, ressaltando que a capilaridade trazida por estes escritórios tem papel fundamental no processo.

Somente em CRA, a Nexgen espera fechar 2022 com sete emissões somando R$ 800 milhões, contra quatro no ano passado, de R$ 300 milhões. “E para o ano que vem, já temos mandatado volume próximo de R$ 1.2 bilhão, com 8 emissões”.

O que poderia tirar competitividade do mercado de capitais seria a volta de linhas com subsídios do governo muito grandes, o que não tende a acontecer ao menos em um futuro próximo, enquanto a União lida com problemas fiscais, disse o fundador da gestora de investimentos Charles River Capital, Camilo Marcantonio.

Fonte: Reuters
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