Juliana Sana

 A SNA conversou com a jornalista a apresentadora Juliana Sana (na foto acima), que possui mais de uma década de profissão, além de ser sócia de uma produtora audiovisual que desenvolve formatos e projetos de programas para a televisão. Seus trabalhos são destaques na grande mídia. 

Nos últimos anos, Juliana está a frente de “Belezas da Terra”, série criada por ela especialmente para a TV Globo, sendo exibida todo sábado de manhã. A ideia é narrar a história de mulheres que empreendem no agronegócio e enaltecer suas trajetórias de vida cheias de superação, aproximando campo e cidade, além de mostrar a importância da agricultura para o país na produção de alimentos e os esforços para compatibilizar as práticas com a sustentabilidade.

Nessa entrevista, ela fala sobre as experiências que viveu no programa, lembra história marcantes de quem participou e reflete sobre o impacto que uma vitrine tão grande como a TV aberta proporciona, tanto para quem assiste quanto para quem tem suas histórias contadas. Juliana aponta as mudanças que ocorreram para as mulheres no cenário rural, assim como as fortes chuvas que atingiram o Rio Grande do Sul, prejudicando muito às lavouras, o que ela cobriu in loco. Confira a seguir:

 

SNA: Em suas reportagens sobre o empreendedorismo rural das mulheres brasileiras, o que mais lhe chamou a atenção, tendo em vista a crescente inserção feminina na agricultura? Há um traço em comum entre tantas histórias de vida e superação?

JULIANA: O que mais me chama a atenção é a mudança de comportamento. Há 40, 50 anos, não era comum vermos mulheres como protagonistas de suas histórias no campo. Elas não se aventuravam a estar em frente à porteira das propriedades. Normalmente, era sempre o homem. Hoje sim. Desde a pequena produtora, que tem uma roça de temperos, até uma grande fazendeira, todas se orgulham do seu trabalho. A imagem da produtora rural atual é a de uma mulher positiva, forte e inspiradora.  Hoje as mulheres se orgulham de dizer que são do campo, que são da roça!

Outro movimento interessante que eu vejo é de jovens que foram estudar na cidade e que agora voltam para trabalhar no campo com a família. Muitas mulheres humildes que eu conheci, e que não tiveram condições de estudar, conseguiram (através de seu trabalho no campo), pagar os estudos para os filhos, que vão para faculdade e voltam com preparo, com novas ideias de sustentabilidade e produtividade. Vem aí uma nova geração consciente da importância dos cuidados com a terra, com o solo e com o planeta. O que é muito bom!

 

SNA: Qual era sua visão do setor antes de começar? Acredita que, após essa rica experiência, há nuances inerentes à agricultura brasileira que só podem ser compreendidas de perto, como você faz, percorrendo os lugares e conhecendo pessoas e suas trajetórias?

JULIANA: Eu nasci no Sul, então sempre tive contato com o campo, com sítios e com o mundo agro. Mas com certeza eu não tinha ideia da potência da mulher do campo do nosso Brasil. Hoje, milhares de mulheres de norte a sul, não só estão à frente de suas produções rurais, mas fazendo parte de grupos, eventos, feiras e negócios. Hoje, existe o mercado de empreendedorismo rural, com centenas de eventos em todo o Brasil, onde essas mulheres podem trocar informações, experiências, inspirar umas às outras. Vejo um mercado crescente nessa área, com mais profissionalismo, mais conhecimento e técnica, explorando diversos setores com matéria prima que vem do campo. Nesses eventos, já conheci designer de joias que usa crina de cavalo para fazer os adornos, profissionais de moda que desenvolvem roupas com tecidos de fibra de bananeira, bolsas a partir da pele descartada de peixes …então é um universo muito vasto e criativo.

 

SNA: Agricultores familiares e de regiões mais afastadas dos grandes polos produtivos têm no trabalho não apenas seu sustento, mas os laços sociais e comunitários que lhe formam o senso de identidade e pertencimento. De que forma percebeu isso em suas viagens?

JULIANA: O nosso Brasil é cheio de Brasis e cada canto, descubro histórias inspiradoras que envolvem toda a comunidade. Por exemplo, uma vez fui gravar com uma mulher no extremo sul da Bahia. Ela era semianalfabeta, e tinha sido agredida verbalmente a vida inteira pelo marido, até que um dia ela começou a fazer geleias com o mamão plantado no seu terreno. Quando ela viu o poder da terra e das suas mãos, começou a tirar seu sustento daí. Ela mudou de vida, largou o marido, passou a sustentar as filhas, uma neta e hoje comanda uma rede de mulheres agricultoras na Bahia chamada “Mulheres Guerreiras da Bahia”. Ela passou a ser inspiração para sua família e para sua comunidade. Contar essas histórias inspiradoras na TV Globo, uma emissora aberta, é muito importante, pois elas chegam em milhões de outras casas e mulheres que podem estar passando por algo parecido.  A ideia é inspirar não só as mulheres do campo, mas inspirar todas as mulheres! Afinal, são histórias de superação, de luta, de resiliência.

 

SNA: Você visitou e conversou com produtores afetados na recente tragédia gaúcha, mostrando pessoas de fibra e resilientes, apesar de tantas perdas, inclusive de vidas. Como avalia o futuro da agricultura dessa região no processo de reconstrução?

JULIANA: Olha, foi realmente uma tragédia devastadora. Como jornalista eu já havia estado em Brumadinho e Mariana (rompimento de barreiras), mas realmente o desastre do RS afetou todo o estado e vai demorar muitos anos para o estado se recuperar. Eu nasci no Sul, então foi ainda mais desolador.  Algumas mulheres com quem havíamos gravado ano passado, em Eldorado, por exemplo, perderam absolutamente tudo. Nem o terreno mais será aproveitado. Mas o consolo é que o povo do campo tem muita fibra e nasceu com a missão de cuidar, de cultivar a terra, então vai ser natural para eles o recomeço, porém será muito, muito duro. Com o programa no ar contando algumas histórias de perdas do RS, a gente conseguiu doações de outras empresas do agro vindos de outros estados, como alimento para o gado, ração… Isso mostra o poder da televisão e sua missão de ajudar a sociedade. Mas as perdas foram gigantescas, então não é o suficiente. O estado vai ter muito trabalho pela frente! E a gente espera poder seguir contando histórias de esperança desses agricultores, para levantar a moral RS, que é um estado muito importante para o agronegócio brasileiro.

 

SNA: Tem vontade de retratar alguma vertente mais específica da agricultura, quem sabe numa série nova, derivada das atuais reportagens?

JULIANA: Olha, eu estou sempre pensando em novas ideias, até porque o campo produz a matéria prima para quase tudo o que é consumido na cidade, desde produtos de beleza, alimentos, tecidos etc. Mas atualmente estou focando sempre em mostrar histórias de produtoras rurais que vem a natureza como aliada pelas próximas décadas. Ou seja, mulheres que praticam sustentabilidade em suas propriedades, que cuidam do bem-estar dos seus colaboradores, que cuidam da terra, que pensam no planeta. Quero mostrar que é possível conciliar uma boa produção rural e sustentabilidade para o futuro do nosso planeta. E acho que as mulheres, de uma forma geral, se preocupam bastante com isso.

Por Marcelo Sá – jornalista/editor e produtor literário (MTb 13.9
Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp