Importadores reagem ao ‘mensalinho’

A União Europeia, um dos grandes importadores de carne bovina brasileira, e os Estados Unidos, que recentemente suspenderam a entrada do produto in natura do país em seu mercado, reagiram rápido às informações de que a JBS pagava um “mensalinho” de até R$ 20.000,00 a fiscais agropecuários no Brasil.

Como informou o Valor, a revelação consta da deleção de Wesley Batista, CEO da empresa, que agora tem menos de 60 dias para enviar ao Ministério Público Federal uma lista com os nomes dos funcionários beneficiados, que, segundo fontes ouvidas pela reportagem, podem ser mais de duas centenas.

A preocupação do governo brasileiro é que a lista de Wesley endureça os questionamentos ou restrições de importadores justamente num momento em que se alimentava a esperança de melhorar o acesso a grandes mercados, como a China.

Para Eumar Novacki, secretário-executivo do Ministério da Agricultura, “não há dúvida” de que países importadores, como os europeus, vão aumentar a pressão, mas ele reiterou que Brasil “está firme no propósito de mostrar que, em nenhum momento, a qualidade da carne (brasileira) foi colocada em xeque”.

O próprio Wesley, no “Anexo 24” de sua delação à Procuradoria-Geral da República, afirma que a prática não colocava em risco a qualidade dos produtos. O “mensalinho”, segundo ele, funcionava como uma hora-extra, já que o ministério não dispunha de funcionários suficientes para cobrir integralmente o horário de funcionamento dos abatedouros da empresa. Nesse processo, contudo, regras sanitárias foram flexibilizadas.

Logo na manhã de ontem, a delegação europeia em Brasília pediu explicações ao governo sobre o caso. E no fim da tarde, em Bruxelas, a porta-voz de Saúde e Segurança Alimentar da Comissão Europeia apresentou a reação oficial da UE, colocando em dúvida a credibilidade da certificação brasileira de exportação, que já está abalada desde a operação Carne Fraca, deflagrada pela Política Federal em 17 de março.

“A Comissão Europeia continua a seguir os desenvolvimentos, incluindo a evolução da investigação policial (no âmbito da Carne Fraca) e continuará a tomar as medidas necessárias para proteger os cidadãos da EU”, afirmou a porta-voz.

Para a Comissão, o sistema de controle oficial brasileiro para a produção de carnes bovina, de cavalo e de frango – e derivados – destinada à exportação ao mercado europeu é capaz de fornecer as garantias necessárias. Mas “deficiências detectadas durante a auditoria (feita pela UE recentemente no Brasil) demonstram que, para todos os setores, com exceção da carne bovina, o sistema não está totalmente ou efetivamente implementado, e isso compromete a confiabilidade da certificação de exportação”.

A revelação do “mensalinho” pegou o secretário-executivo do ministério no fim de uma maratona de reuniões com alguns importadores, em Genebra, durante as quais ele tentou desmontar temores sobre o controle sanitário brasileiro. Num primeiro momento, Novacki admitiu que a prática não se restringia à JBS. “Parece que eram várias empresas”.

Ele confirmou que, depois da Carne Fraca, o ministério recebeu outras denúncias sobre práticas pouco ortodoxas de fiscais. Mas pouco depois ressalvou que, até agora, o “mensalinho” estava restrito à JBS, única a admitir o problema.

Conforme Novacki, a preocupação dos importadores é com procedimentos, e o Brasil defende que a “auditoria tem de ser no produto, não no procedimento”. Ele garantiu que o sistema de controle sanitário brasileiro continuará sendo modernizado, mas que “não há a mínima possibilidade de contratar 100 mil veterinários”.

O secretário disse que a ideia em Brasília é criar um sistema de controle misto, por meio de uma agência de sanidade agropecuária mantida por recursos de empresas privadas. Essa agência poderia bancar os fiscais, mas toda a supervisão seria realizada pelo Ministério da Agricultura. Mas não há nada definido.

A União Europeia insiste, porém, que a inspeção sanitária seja feita exclusivamente por fiscais do governo, ainda que, para Novacki, isso não signifique necessariamente que a fiscalização será mais eficiente. “Encontramos resistência corporativa, porque os fiscais entendem que isso  (a revisão do sistema de controle) é perda de poder. Mas entendemos, pelo contrário, que o sistema será mais rápido e moderno”, afirmou ele.

O “mensalinho” da JBS também pode complicar a missão do ministro Blairo Maggi aos EUA para tentar remover as travas à carne bovina in natura do Brasil naquele mercado – com argumentos que incluem “vontade política” e boas relações bilaterais. Sobre a China, Novacki disse que há possibilidade de ampliação do mercado, com expectativa de habilitação de mais 40 frigoríficos.

 

Fonte: Valor Econômico

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