Desenhar o panorama atual e traçar um planejamento para o futuro do agronegócio, para os próximos anos, mesmo diante das incertezas em torno da aprovação ou não da agenda reformista, proposta pelo governo federal, foram temas de um debate entre especialistas, realizado na quarta feira, 31 de maio, em São Paulo.
Sócio consultor da MB Agro, Alexandre Mendonça de Barros, que abriu o encontro com uma breve apresentação sobre o momento atual da cadeia produtiva do agro nacional, disse que “estamos novamente vivendo um momento de incertezas, mas ao mesmo tempo, somos otimistas com o que estamos vislumbrando para o setor nos próximos anos”.
“Nossa ideia foi reunir os três elos dessa cadeia para ter a visão das empresas, do mercado e também dos produtores”, justificou Carlos Mercante, diretor da Mosaic Fertilizantes e mediador da mesa redonda.
Em sua opinião, “o agro tem muitos desafios, mas também tem muitas oportunidades, e é isso que pretendemos discutir na visão macroeconômica, na visão do agronegócio, da cadeia produtiva e do agricultor, que é quem realmente sente tudo isso”.
De acordo com os debatedores, parte dos obstáculos do agronegócio brasileiro só poderá ser superada com a aprovação e a liberação das reformas estruturais pelas quais o Brasil ainda vai passar.
“Estamos atravessando um momento bastante interessante do cenário político e econômico do país. E fica claro que teremos dois caminhos a seguir: se ocorrem as reformas propostas pelo governo e se elas não ocorrerem”, comentou o sócio consultor da MB Agro.
Para Barros, houve um grande paradoxo na relação entre o agronegócio e outros setores da economia brasileira, porque o setor teve uma sobrevivência, uma resiliência surpreendente mesmo com o cenário desfavorável, independente de taxa de câmbio e custo de capital, que permitiu ganhos que o resto da economia não conseguiu.
“Por exemplo, no pior momento da presidente Dilma, quando o real chegou a R$ 4,20, foi ruim para todo mundo, mas para o agricultor não”, salientou.
Em sua visão, “a agenda reformista tem de prosseguir, caso contrário, há a possibilidade de um governo futuro recriar o Funrural (Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural) e taxar a agricultura”. Ele ainda avaliou que “o potencial de crescimento do agro é enorme, mas não pode ser o único setor a crescer”.
CENÁRIOS POSSÍVEIS
O sócio consultor da MB Agro também fez uma comparação dos cenários possíveis: “Vamos imaginar que essa agenda reformista continue, que ela seja passada para um presidente que dará sequência, provavelmente, o cenário que se desenharia seria de um real forte, juros e inflação baixos e recuperação do mercado interno muito relevante”.
Para ele, caso não ocorra a aprovação de uma agenda reformista, considerando um quadro político estático, isso resultaria em mais desempregos, riscos de retrocesso da economia nacional, que não teria condições de se recuperar muito, real fraco sem queda de juros e inflação mais alta.
“Dentro desses dois extremos, então, dá para perceber o quanto é complicado para o produtor brasileiro se adaptar diante dessa enorme volatilidade do momento atual”, ressaltou Barros.
“Acredito que, entre um cenário de real enfraquecido e juros altos, favorecendo as exportações de soja e milho, e outro, com a economia se recuperando, com real valorizado, mas taxas de juros e inflação mais baixas, entre outros indicadores favoráveis, o ideal é torcer pelo segundo”, acrescentou o executivo, usando como exemplo a Argentina, onde, com o tempo, as conquistas do agro foram sugadas pela fragilidade da economia daquele país.
VISÃO DO MERCADO
Membro do Conselho da Markestrat e professor titular da FEA/USP, em Ribeirão Preto (SP), Marcos Fava Neves também concorda que a agenda reformista é fundamental para os diferentes setores da cadeia produtiva do agronegócio. Segundo ele, os mercados externos continuam em crescimento e a procura por produtos brasileiros tendem a aumentar.
“A luz do mercado mundial, principalmente dos emergentes, continua iluminando forte. É só olhar os dados de exportação para países como a Indonésia e Vietnã, para os quais não vendíamos praticamente nada, e que, atualmente, consomem em torno de dois milhões de dólares de produtos oriundos do Brasil.”
Já a China, conforme o professor, saltou de U$ 500 milhões de compras de produtos brasileiros, há dez anos, para U$ 21 bilhões. Ainda comentou que o mercado mundial continua apresentando uma taxa de crescimento extremamente favorável.
“No caso dos grãos, por exemplo, são 25 milhões a 30 milhões de toneladas por ano a mais de demanda mundial”, citou Neves, acrescentando que “apenas a safra brasileira de soja atual seria suficiente para praticamente três anos e meio do consumo mundial”.
De acordo com o professor, exceto o suco de laranja, que compete com outros tipos de bebidas – como água, refrigerantes e chá, por exemplo –, e está com a demanda mundial em queda, e do algodão, pela forte concorrência em relação às fibras sintéticas, praticamente todos os demais segmentos ligados ao agronegócio tendem a apresentar crescimento.
Neves, no entanto, faz uma ressalva: “O que precisamos saber é se, nas condições atuais, o agricultor brasileiro tem possibilidade de expandir sua produção com os custos e preços de momento”.
Ele ainda mencionou outros fatores relacionados ao sucesso desse processo. Na questão de custo, ele citou duas variáveis: a primeira delas são as internas, como o pacote que está sob controle do produtor, que é a tecnologia, a capacidade administrativa, entre outros fatores, e que não são adotados pelo produtor. A segunda envolve as variáveis externas, como transporte, trabalho, questão ambiental e tributária e outros itens que seguram um desenvolvimento ainda maior da agricultura.
“Traçando, então, um paralelo com o que foi dito por Alexandre (sócio consultor da MB Agro, Alexandre Mendonça de Barros), quanto mais rápido caminharem as reformas, mais rápido a gente vai conseguir resolver a parte externa ao produtor para que ele construa essa margem necessária para poder aproveitar o mercado crescente ao preço atual”, enfatizou Neves.
VISÃO DO PRODUTOR
Sobre os cenários traçados durante o debate, em São Paulo, Paulo Araújo Rodrigues, diretor do Condomínio Agrícola Santa Izabel e representante dos produtores na ocasião, também se mostrou favorável à aprovação da agenda reformista. Para Rodrigues, se ela não for aprovada e colocada em prática, a agricultura brasileira, ainda assim, vai sobreviver, mas pode haver mudanças.
“Caso não ocorram as reformas e se a situação de insegurança jurídica em relação à aplicação das leis ambientais persistirem, é provável que a agricultura mude de mãos”, analisou o diretor.
Para a sobrevivência do trabalhador e produtor rural, Rodrigues acredita que seja preciso resolver, com urgência, os problemas da logística brasileira, em especial aos que envolvem a armazenagem e transporte: “As melhorias na gestão das propriedades também são fundamentais para esse desenvolvimento sustentável”.
Por equipe SNA/SP