Futuro da Vigor causa apreensão em polo de leite do Rio de Janeiro

A turbulência que atinge o grupo J&F, após a delação de executivos da holding que controla a JBS, gerou apreensão na cidade de Barra do Piraí, no sul fluminense, que teme cortes na fábrica da Vigor. A unidade da empresa de lácteos, também controlada pela J&F, é hoje a principal indústria local, após o fechamento da metalúrgica BR Metals em 2016, e já vinha perdendo trabalhadores por causa da crise econômica. Segundo a prefeitura do município, agora são 120 empregados diretos no local.

Produtores que fornecem leite para processamento na unidade da Vigor também estão preocupados. Nos bastidores, demonstram receio em relação a um possível aumento no prazo para o pagamento do leite que poderia chegar a 90 dias, segundo fonte ligada às cooperativas.

Por enquanto, segundo a Associação Empresarial de Barra do Piraí, não houve mudança relevante na linha de produção, embora a operação já tenha sido afetada pela crise econômica e não opere com a capacidade máxima. Apesar da crise desencadeada na semana passada, houve até abertura de vagas para a contratação de trabalhadores.

A prefeitura de Barra do Piraí descarta qualquer tipo de mudança em relação aos benefícios concedidos à unidade da Vigor na cidade. Em sua delação, Ricardo Saud, executivo do grupo J&F, indica que a negociação com o ex-governador do Rio Sergio Cabral (PMDB) para ficar com a fábrica de laticínios em Barra do Piraí, começou no mesmo período em que a BRF, antiga dona da unidade, anunciou investimentos de R$ 70 milhões para sua construção.

A negociação com Cabral começou, segundo disse Saud na delação, em meados de 2012, durante um almoço no Palácio Guanabara, quando o então governador teria pedido a Joesley Batista e outros executivos investimentos no estado. Em comunicado do dia 31 de maio de 2012, a BRF informou que o planejamento era montar uma planta automatizada capaz de processar 15 milhões de litros de leite por mês na cidade.

Segundo Saud, a J&F se interessou pela fábrica, que ainda não tinha começado a produzir, e pediu que Cabral trabalhasse pela transferência: “Sérgio, arruma essa fábrica pra nós aí! Vê quanto que é isso, a gente ajuda aí, como é que faz, como é que não faz. Eu coloco essa fábrica em funcionamento dentro de seis meses”. Ficou acertado, ainda segundo Saud, o pagamento de R$ 27.5 milhões de propina, que seriam usados, em parte, na campanha ao governo de Luiz Fernando Pezão (PMDB), em 2014.

Procurada, a assessoria de imprensa do governo do Rio disse que “todas as doações da campanha foram feitas de acordo com a Justiça Eleitoral”. Uma representação no Tribunal Regional Eleitoral do Rio (TRE-RJ) aponta que a JBS foi a maior doadora da campanha de Pezão, repassando R$ 6.6 milhões no fim de julho de 2014.

Uma reunião na prefeitura de Barra do Piraí marcou a transferência da unidade, sem que tenha ocorrido pagamento de contrapartida. Ao ser questionado se a BRF não havia feito nenhuma cobrança ou entrado na Justiça pelo negócio, Saud respondeu: “Não. Eu não entendi qual foi a negociação. Posso falar que para nós foi um dos grandes negócios que nós fizemos”.

A BRF informou que “por uma mudança em sua estratégia de negócios, que passaria a não contemplar a expansão da cadeia de lácteos, desistiu de operar a unidade que havia construído para esse fim no município de Barra do Piraí. Assim, a companhia devolveu o imóvel ao governo do Estado do Rio em 2014, assumindo o prejuízo com a edificação e as benfeitorias realizadas por ela no terreno”.

De fato, a BRF saiu do negócio de lácteos em setembro de 2014, com a venda da divisão para a francesa Lactalis, por R$ 1.8 bilhão. Em junho de 2014, quando a Vigor assumiu a fábrica, o presidente da empresa, Gilberto Xandó, disse que o Estado do Rio havia recebido a unidade de volta da BRF e a cedido “em comodato à Vigor”.

Linha direta

Na lista de ligações realizadas e recebidas do celular de Joesley Batista, que faz parte dos documentos da delação premiada, não há tantos telefonemas trocados entre o empresário e executivos do mercado financeiro.

O banco J.P. Morgan se destaca pelos contatos diretos com o controlador do grupo J&F. Entre os meses de agosto de 2016 e março de 2017, há frequentes ligações com Patrícia Moraes, chefe do banco de investimento do J.P. Morgan e filha do ex-ministro da Agricultura Marcus Vinícius Pratini de Moraes, que já ocupou vaga no conselho da JBS. José Berenguer, presidente do J.P. Morgan, também foi interlocutor de Joesley no período, embora com menos frequência.

De acordo com uma fonte com conhecimento do assunto, o banco representa a PepsiCo, interessada em comprar a fabricante de produtos lácteos Vigor, controlada pela J&F. Mas a negociação não foi para frente por uma discordância de preço. Agora, os bancos Bradesco e Santander possuem novo mandato de venda da empresa de laticínios.

Os executivos do J.P. tinham linha direta, dada a proximidade do passado. Patrícia Moraes foi a banker responsável por intermediar as primeiras investidas da JBS nos EUA. Alguns outros nomes que aparecem na lista, embora com menos frequência do que os executivos do J.P., são José Vita, do BTG Pactual, e Flávio Valadão, do Santander.

 

Fonte: Valor Econômico

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