Frigoríficos adiam investimentos no país

Se depender dos frigoríficos brasileiros, a retomada dos investimentos no país não acontecerá antes de 2018. Com o consumidor combalido, os custos de produção nas alturas e um real que teima em tirar rentabilidade das exportações, a indústria de carnes dificilmente desengavetará os projetos de expansão tão cedo.

Enquanto no setor de carne de frango há muita capacidade ociosa para ocupar, dado o drástico corte na produção feito desde julho para contornar os impactos negativos da alta dos preços do milho, no setor de carne bovina há dezenas de frigoríficos fechados desde o ano passado.

“Há muita capacidade que a gente precisa preencher (antes de investir)”, admitiu a presidente da JBS Foods, Joanita Karoleski, em entrevista em Paris, no mês passado, durante o Salão Internacional de Alimentação (Sial). Mas reduzir a ociosidade depende, entre outras coisas, da recomposição da safra brasileira de milho.

Para ela, isso tende a acontecer no segundo semestre de 2017, com a colheita da safrinha do cereal. Se tudo correr bem, a produção de frango do país iniciaria uma recuperação gradual a partir de então.

A avaliação é corroborada pela gaúcha Alibem Alimentos, que tem dois abatedouros de suínos. De acordo com o diretor-superintendente da companhia, José Roberto Goulart, o consumo de carnes pode se recuperar no próximo ano. No entanto, isso não é suficiente para a empresa retomar os investimentos.

Em Paris, o diretor comercial da catarinense Aurora Alimentos, Leomar Somensi, disse que a retomada também ficará para 2018. Afetada pela disparada do milho, a cooperativa vem adotando desde julho um sistema de rodízio de férias coletivas.

A cada mês, um abatedouro diferente é paralisado, reduzindo a produção de carne de frango em 8% sobre o que vinha sendo produzido. Em tese, o sistema de rodízio, que evita demissões, seria mais propício para retomar a atividade rapidamente, mas Somensi crê que a recuperação será demorada. Também na Aurora, é o milho que dita as regras.

Embora tenha uma dinâmica diferente de aves e suínos, dada a menor dependência de grãos, a indústria de carne bovina também trabalha com recuperação mais consistente em 2018, disse ao Valor o presidente do Frigol, Luciano Pascom.

Em sua avaliação, os abates devem ter crescimento moderado em 2017, mas só no ano seguinte a oferta de bovinos será boa o suficiente para impulsionar o setor. “Diria que é algo mais provável para 2018”, concordou o presidente da JBS Mercosul, Miguel Gularte.

 

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A lenta recuperação também fez o Frigol, que faturou quase R$ 1.3 bilhão no ano passado, engavetar o projeto de expansão pelo qual previa ingressar na área de carne de frango. “O negócio foi postergado”, acrescentou Pascom.

“Não estou vendo nenhuma força maior de investimentos”, afirmou o analista César Castro Alves, da MB Agro – braço da consultoria MB Associados. Segundo ele, as indústrias de aves e suínos estão em plena “ressaca” da fase mais crítica, quando as margens do setor chegaram ao vermelho devido à disparada dos preços do milho. “O tranco foi muito grande e ainda há sequelas”, resumiu Alves.

Conforme a Associação Brasileira de Produtores de Pintos de Corte (Apinco), os alojamentos de pintos de corte – indicador da produção futura de carne de frango – caiu 10,36% em setembro ante igual intervalo de 2015, para 497.7 milhões de aves. Nesse cenário, a ociosidade das granjas cresceu.

Segundo o secretário-executivo da Apinco, José Carlos Godoy, o setor está muito longe da capacidade total de alojamento, que é de cerca de 590 milhões de pintos de corte por mês. No auge da produção, em março de 2016, 560 milhões de aves foram alojadas.

Para o vice-presidente global de operações da JBS, Gilberto Tomazoni, que também esteve no Sial, as dificuldades enfrentadas neste ano pela indústria brasileira de carne de frango despertaram a atenção para a necessidade de mudanças estruturais no setor, dentre as quais a adoção das compras antecipadas de milho talvez seja a mais relevante.

Pegas no contrapé com a combinação entre a quebra da safra de milho e o intenso fluxo de exportações do cereal na primeira metade do ano, as empresas de aves e suínos tiveram de lidar com uma situação praticamente inédita: o milho brasileiro ficou caro demais, a ponto de concorrentes como Rússia e Ucrânia, pouco expressivos até então, ficarem mais competitivos que o Brasil no mercado internacional de frango.

Para reverter esse cenário, não basta contar com a recomposição da safra brasileira de milho. “O mundo descobriu o milho do Brasil”, disse Tomazoni. Na prática, se o cereal não for comprado antecipadamente, ele será exportado.

Além da necessidade de mudança na estratégia de aquisição de insumos, Tomazoni também reconheceu que a indústria brasileira é culpada pela sobreoferta de frango que inundou importadores relevantes na passagem de 2015 para este ano, derrubando os preços do produto.

“Exportamos demais quando o dólar estava a R$ 4”, afirmou. Com o dólar valorizado, a indústria podia até mesmo reduzir os preços da carne de frango em dólar, que obtinha margens extremamente positivas.

“Vendíamos frango no Oriente Médio a US$ 2,20 o quilo e passamos a vender por US$ 1,30”, disse Tomazoni. No entanto, a depreciação do dólar mostrou que a competitividade brasileira era artificial. “Nunca haveria frango a US$ 1,30 se não fosse essa loucura da moeda. Você cria competitividade artificial de uma hora para outra.”

 

Fonte: Valor Econômico

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