Em tempos de ajuste fiscal e arrecadação tributária em franco declínio, o governo decidiu avançar com um projeto que pretende encorpar a arrecadação com o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR), que incide sobre o valor do imóvel declarado e o grau de utilização da terra. Estimativas preliminares da Receita Federal são de que a receita com o imposto pode saltar de R$ 1 bilhão para até R$ 8 bilhões já em 2017, só com aumento de fiscalização e criação de uma malha fina com faixas de arrecadação que estão sendo definidas para combater a sonegação, considerada alta nesse imposto.
O presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Leonardo Góes, antecipou, em entrevista ao Valor, que o órgão e a Receita devem assinar um termo de cooperação técnica até o fim deste ano para melhorar a eficiência na cobrança do ITR. O acordo, que já foi acertado com o secretário-geral da Receita, Jorge Rachid, prevê um reforço na fiscalização que seria viabilizado pelos peritos federais agrários do Incra, com expertise em definir valores de terra nua (valor original da terra, sem contar área plantada ou valores de produção) e em fiscalizar propriedades rurais.
Isso será feito, no entanto, sem aumentar a base de arrecadação nem as alíquotas do imposto – que variam de 0,3% a 1,6% do valor declarado da terra pelo proprietário rural. O imposto não ficará mais alto para produtores rurais ou proprietários rurais, mas deverá ser cobrado de quem não paga, informou o presidente do Incra. A medida também não depende de lei.
“Já fizemos as discussões com a Receita e vamos encaminhar a proposta à Casa Civil nos próximos dias”, disse Góes. “Queremos que haja presunção de fiscalização, ou seja, o dono do imóvel rural precisa saber que ele será fiscalizado com certeza, o que não acontece hoje e gera uma situação de subarrecadação”, destacou. Ele salientou, contudo, que em tese, quem não paga hoje o imposto está sujeito a multas e a ficar sem acesso ao crédito rural dos bancos.
Góes explicou que a baixa fiscalização leva a uma assimetria entre os dados declarados e os dados reais (grau de utilização), quadro que causa distorções para a apuração do imposto. Por isso, a intenção é replicar o modelo adotado pelo Fisco na Declaração do Imposto de Renda Pessoa Física, em que se observa a média das despesas e se traça parâmetros de dedução do imposto ou se detecta eventuais abusos cometidos.
“Se a pessoa sabe que não haverá malha fina sobre uma despesa médica, por exemplo, ela tenderia a colocar o que acha melhor, mas atualmente ela sabe que, se exagerar, vai pagar multas, e isso faz com que as declarações sejam as mais reais possíveis e é o que queremos com o ITR”, esclareceu o titular do Incra.
Mas além do aspecto arrecadatório, o imposto sobre a propriedade rural também exerce um papel de desestimular a concentração de terras no país e a baixa produtividade agropecuária, tendo em vista o princípio de que quanto mais produtiva for a terra, menos ITR ela pagará. Contudo, o foco da nova proposta também é incrementar a arrecadação do imposto, que gerou apenas R$ 1.2 bilhão em 2015, e girou em torno de uma média anual de R$ 850 milhões nos últimos anos.
“Ainda que a gente tenha R$ 8 bilhões, o ITR é um imposto de menor monta hoje na composição da arrecadação federal total. Ele só representa 0,08% da arrecadação total da União, enquanto chega a 6% na Europa e nos Estados Unidos e entre 3% e 4% na América do Sul”, disse o presidente do Incra.
Góes, que é perito federal agrário de carreira e assumiu o cargo no governo de Michel Temer, contou que a iniciativa de uma cooperação com a Receita nasceu de um projeto piloto executado no ano passado no Mato Grosso do Sul, que usou a experiência de peritos do Incra em parceria com fiscais da Receita, com base nos princípios que agora serão replicados em âmbito nacional. Como resultado, a arrecadação de ITR no estado cresceu cinco vezes em um mesmo ano.
A iniciativa também foi cobrada por prefeitos da região, que sugeriram ao governo federal entrar em campo para estabelecer parâmetros mais claros de fiscalização. Houve também um empurrão da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), entidade máxima de representação do agronegócio brasileiro, que exigiu uma padronização nos procedimentos de aferição das propriedades e de fiscalização do imposto.
De acordo com Góes, muitos municípios, principalmente os de menor porte, não têm estrutura para fiscalizar fazendas ou mesmo experiência na definição de valores comerciais de terra, o que leva à estipulação de preços de terra subestimados. Na prática, as prefeituras são responsáveis por metade de tudo que é arrecadado com o ITR, sendo que a outra metade compete à União, e uma nova sistemática de cobrança do imposto traria mais recursos tributários para os municípios com vocação agropecuária.
Fonte: Valor Econômico