Às vésperas de colher mais uma safra recorde de grãos, o Brasil deve novamente enfrentar problemas para escoar sua produção. Tradings que operam terminais nos portos brasileiros reclamam que os problemas se agravaram, antes mesmo de a produção da nova safra chegar. Amanhã, os exportadores de grãos, que ano passado tiveram US$ 2,5 bilhões em perdas por custos não previstos de frete e multa de sobre-estadia de navios nos portos (demurrage), devem se reunir com o ministro da Agricultura Antonio Andrade para discutir o escoamento da nova safra e tentar evitar mais um ano caótico.
A associação que representa as tradings de commodities agrícolas, a Anec, vai apresentar ao ministro um estudo detalhado com os problemas de cada um dos portos. Segundo o diretor-geral da Anec, Sérgio Castanho Teixeira Mendes, há alguns portos, como o de São Francisco do Sul (SC), que não têm fiscais para emitir certificados aos fins de semana. Outros, sequer têm fiscais, como o porto fluvial de Itacoatiara (PA), que embarcou no ano passado cerca de 3 milhões de toneladas de grãos. “Nessas localidades, a emissão de certificados fitossanitários depende da vinda de um fiscal de Manaus”, afirmou.
Em outros grandes portos, como Paranaguá (PR), que é referência no escoamento de grãos no país, a deficiência se arrasta há anos. “Uma década atrás, havia nesse porto 17 fiscais. Hoje, mesmo com a demanda infinitamente maior, há apenas 10 fiscais”, cita Mendes. Além disso, acrescentou ele, falta padronização no procedimento dos fiscais que, muitas vezes, fazem exigências diferentes de documentação, mesmo se tratando de situações idênticas.
Neste momento, lembra Mendes, algumas empresas ainda estão exportando milho da safra passada. “O porto de São Francisco do Sul, por exemplo, ficou pelo menos uma semana de janeiro sem nenhum fiscal disponível para emitir os certificados fitossanitários”, lembra o diretor da Anec. Três navios que somam o carregamento de 100 mil toneladas de milho saíram do porto catarinense ainda na semana do Natal e estão chegando ao destino – Ásia e Oriente Médio – sem o certificado fitossanitário, essencial para descarregamento da carga no país de destino.
Em 2013, o Brasil exportou mais de 75 milhões de toneladas de grãos e farelo em meio a um caos com mais de seis quilômetros de filas de caminhões nos portos. Em 2014, o volume embarcado de grãos deve se repetir, pois haverá um aumento nos embarques da oleaginosa, que sairá de 42 milhões para 44 milhões de toneladas, no entanto, tende a haver um recuo no volume de milho. “Mas se as cotações desse grão se recuperarem, as exportações vão aumentar”, alerta Mendes.
O problema não é novo e nem deve melhorar a curto prazo, segundo o presidente do Sindicato Nacional dos Fiscais Federais Agropecuários (ANFFA Sindical), Wilson Sá. De acordo com ele, o governo federal assiste impassível à falta de organização do Ministério da Agricultura. “Não temos um concurso para fiscal há nove anos. É claro que temos falta de pessoal. Hoje temos 2.950 fiscais quando deveríamos ter 10 mil”, disse Sá.
Sá informa que no caso específico de São Francisco do Sul um fiscal se aposentou, outro saiu de férias e outro teve problemas de saúde. “Aí entra um problema de gestão. Seria simples deslocar um colega de Florianópolis. A situação é caótica, mas o Ministério da Agricultura está preocupado com outras coisas”, disse. Procurado, o Ministério da Agricultura não se manifestou. A Secretaria Especial de Portos informou que não compete a ela a fiscalização de mercadorias seja no âmbito agropecuário, sanitário ou aduaneiro.
Fonte: Valor Econômico