Exportação anima pecuária, mas alta dos custos preocupa

Embalados pela alta do dólar, a conquista de novos mercados e o aumento de vendas para os destinos tradicionais, os produtores de aves, suínos e bovinos estão otimistas. Apenas no primeiro semestre, Estados Unidos, Rússia e China anunciaram fim dos embargos à carne brasileira e Japão, Arábia Saudita e países do Golfo Pérsico estão em vias de liberação.

O presidente da Associação Gaúcha de Avicultura (Asgav), Nestor Freiberger, observa que o cenário é favorável à carne bovina, já que o Brasil exporta para vários países e está em vias de abrir novas fronteiras.

O setor comemora a abertura do mercado americano porque a liberação da carne in natura servirá como um passaporte para acessar mercados exigentes como o japonês. A China também abriu recentemente as fronteiras para o produto. O momento é de negociação e busca de autorização para entrar no país asiático.

Nos primeiros meses deste ano, as exportações de carne bovina do Rio Grande do Sul recuaram 7,2% em volume (para 26.200 toneladas) e 6,7% em receita (para US$ 108.9 milhões). Embora o desempenho tenha sido negativo, ainda assim foi melhor que o total das vendas externas brasileiras de carne bovina, que recuaram 15% em volume (para 770.000 toneladas) e 19% em receita (para US$ 3.2 bilhões), devido aos problemas financeiros enfrentados por clientes como a Rússia e a Venezuela.

Apesar das dificuldades impostas pela queda dos preços do petróleo, nos primeiros sete meses deste ano a Rússia importou 51.500 toneladas de carne suína do Rio Grande do Sul, volume 71% acima do importado em igual período do ano passado.

Graças ao mercado russo, as exportações de carne suína gaúcha neste ano cresceram 14% (para 96.800 toneladas), enquanto a receita se manteve praticamente estável, em R$ 247 milhões, por conta da queda de 12% no preço médio. O desempenho foi melhor que o resultado total das exportações brasileiras de carne suína, que recuaram 18% em volume (para 283.000 toneladas) e 16% em receita (para US$ 701 milhões).

Custos altos

Ao mesmo tempo em que apostam no aumento das vendas externas, os produtores proteína animal estão preocupados com o aumento dos custos. A alta de preços da energia elétrica, combustíveis e da ração, entre outros, vem corroendo a rentabilidade das cadeias produtivas de proteína animal.

“No mercado interno, estamos empatando”, revela Freiberger, representante das indústrias de aves. “É preciso assegurar o fornecimento de milho e soja, o que representa 70% dos custos. Sem uma produção suficiente, o setor avícola precisa comprar de outros Estados, o que reflete na competitividade.”

O custo de produção dos suínos foi corrigido, mas o setor não consegue repassar ao consumidor, segundo o diretor-executivo do Sindicato das Indústrias de Produtos Suínos do Estado do Rio Grande do Sul (Sips), Rogério Kerber. “Precisamos de uma demanda estável, o que não ocorre em função da economia nacional”, diz.

A pressão nos custos não é o único fator que afeta a competitividade do setor de proteínas animais. “Há uma extensa agenda interna relacionada à macroeconomia, burocracia, segurança jurídica em questões tributárias, ambientais, trabalhistas e investimentos em infraestrutura que precisa melhorar’, afirma o diretor executivo da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), Fernando Sampaio.

Estados Unidos e China

Há um consenso entre os produtores de bovinos. A abertura dos Estados Unidos para a carne in natura brasileira é um importante balizador para compradores de outras regiões que se pretende conquistar. Mais do que impactar nas exportações do produto, a aprovação dos americanos ratifica a qualidade do que é produzido aqui.

De acordo com a Abiec, Estados Unidos representam um mercado de cerca de 1 milhão de toneladas anuais de carne bovina in natura. O Brasil iniciará a exportação dentro da cota direcionada a “outros países”, o que totaliza 64.000 toneladas anuais. A Abiec estima que, num primeiro momento, o Brasil deve preencher parte desta cota. Mas a expectativa é que as exportações brasileiras de carne bovina in natura para o mercado americano possam chegar a 100.000 toneladas/ano.

“Qualquer novo mercado é positivo, evidente que o processo é devagar”, destaca o presidente da Associação Brasileira de Angus, José Roberto Pires Weber. Segundo ele, mesmo que os americanos comprem carne de cortes menos valorizados, valerá como uma vitrine para outros países. “Veio em boa hora, servirá para escoar carne represada em função do aumento de custo”, concorda Lopa, da Associação Brasileira de Hereford e Bradford (ABHB).

As boas notícias de fora não se restringem àquele país. Neste ano, a China reabriu suas fronteiras após dois anos de embargo, quando ocorreu o caso atípico no Paraná da doença da vaca louca. Estima-se que nos próximos anos os chineses importarão cerca de 490.000 toneladas ao ano de carne. Considerando o que o Brasil exportou nos primeiros embarques em junho, a estimativa da Abiec é que as vendas atinjam 120.000 toneladas anuais.

O setor dá como certa a retomada das exportações para a Arábia Saudita. Outros países que fecharam suas fronteiras em função da BSE também estão em processo de reabertura: África do Sul, Catar, Bahrein e Kuwait. Além disso, o Brasil deve focar agora na Ásia, onde está o maior potencial de crescimento do consumo. “Estamos em negociações com Indonésia, Tailândia, Camboja e Taiwan. Recentemente, conseguimos conquistar Mianmar e já estamos importando para Malásia, Vietnã e Cingapura”, conta o diretor da Abiec.

Mercado russo

O aumento das exportações de carne suína para a Rússia anima as indústrias gaúchas. O diretor executivo da Sips, Rodrigo Kerber, observa que o serviço russo de defesa agropecuária, o Rosselkhoznadzor, ampliou o número de frigoríficos habilitados em agosto do ano passado. “O Rio Grande do Sul registrou uma melhor participação em função de muitas plantas no País não estarem preparadas para aquele mercado, que tem exigências diferentes”, afirma Kerber. Ele exemplifica que a Rússia proíbe a utilização de ractopamina na nutrição animal, substância utilizada para o crescimento e engorda de suínos e bovinos.

Como o Rio Grande do Sul detém status de zona livre de aftosa com vacinação, há restrição em chegar a mais países. “O Rio Grande do Sul tem de se concentrar em participar de mercados sem restrições, já que o processo é longo, o comprador precisa atestar a qualidade, tem de melhorar a logística, entre outros fatores”, avalia o dirigente do Sips.
Mas há um gigante que pode se tornar um importador significativo no médio e longo prazo: a China, que já habilitou duas plantas do Estado. Apesar de deter 50% da produção mundial de suínos, o país asiático, sendo o líder mundial do setor, apresenta demanda crescente pela proteína animal.

Status sanitário

Na avaliação do setor, para ter acesso a mercados importantes, o Brasil precisa continuar evoluindo em seu status sanitário. Atualmente, três Estados – Amazonas, Roraima e Amapá – estão fora da área livre de febre aftosa e a inclusão de todos em um status sanitário ajudaria a vender para países que hoje são fechados ao Brasil.

“É preciso extremo cuidado com nossas fronteiras, de forma a mantermos nosso status sanitário”, alerta o vice-presidente da Farsul, Gedeão Pereira, o que também é defendido pelo presidente da Associação Brasileira de Angus, José Roberto Pires Weber. “Temos um banco genético muito qualificado e não podemos colocar em risco. Demonstramos que não precisamos deixar de vacinar para chegar a novos mercados”, afirma Weber.

Avicultura

No setor de aves também há preocupação em manter o controle de doenças. “O produtor e a indústria são qualificados, mas precisamos evoluir mais para evitar problemas de doença. Nossa sobrevivência (como setor) está na sanidade animal, que é nossa prioridade zero”, observa o presidente da Asgav, Nestor Freiberger. Ele lembra que a contaminação por influenza aviária nas fazendas de aves nos Estados Unidos, maior produtor mundial do setor, abriu novas oportunidades para o frango brasileiro.

Hoje, o Brasil é o maior exportador do produto. Os recordes seguidos nas exportações de carne de frango em junho e julho deste ano (considerando a ave inteira, cortes, processados e salgados) reverteram a tendência de queda registrada ao longo do primeiro semestre. No acumulado deste ano, até julho, o volume embarcado cresceu 5,2% para 2.392 milhões de toneladas. Devido à retração de 25% nos preços médios de exportação, a receita de janeiro a julho caiu 7,7% em relação ao mesmo período do ano passado, para US$4.141 bilhões.

No embarque recorde de julho, a exportação de carne de frango cresceu 18,7% para 440.400 toneladas, detalha o presidente da Asgav. O Rio Grande do Sul não acompanhou o índice, em função de uma menor produção, comparado a Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso.

Para crescer mais, Freiberger considera fundamental a equalização na oferta de milho e soja. Sem disponibilidade para o setor, posto que grande parte da produção é exportada, a matéria-prima tem de vir de outros Estados, com valor de frete que compromete a rentabilidade. Outra preocupação é com a possibilidade de retirada de 30% dos créditos presumidos por parte do governo gaúcho.

Dentro da porteira

Para ganhar mercados, é preciso fazer a lição de casa. E isso significa investir em gestão, controle, pesquisa, solo, alimento e melhoramento genético. As compras são globais e feitas em escala, o que faz com que as exigências cresçam exponencialmente. Pecuária de precisão, irrigação inteligente das pastagens, brinco eletrônico para rastreabilidade, correção do solo, nutrição sob medida e termografia infravermelha para verificar doenças são algumas das tecnologias disponíveis hoje e que ajudam os produtores de bovinos.

O Núcleo de Estudos de Produção de Bovinos de Corte e Cadeia Produtiva (Nespro), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), está desenvolvendo um software de medição de pastagens. Entre as aplicações, detalha o professor e coordenador do Nespro, Júlio Barcellos, a tecnologia permite uma análise da imagem e indicação de quantos animais podem utilizar e se alimentar em uma determinada área.

“Há uma necessidade de buscar novas formas de gerenciamento da propriedade e melhores desempenhos”, explica Barcellos, destacando que através de informações conectadas a um sistema de gerenciamento automático, o produtor reduz o tempo de manejo do gado, otimiza processos, o que resulta em custos menores e ganhos de produtividade. Barcellos fala com a expertise de quem estuda a cadeia frigorífica no Rio Grande do Sul.

 

 

Fonte: Globo Rural

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