Evaristo de Miranda: “Brasil precisa de uma grande coalizão para comunicar suas ações ambientais”

Amazônia Legal: na região há mais de um milhão de agricultores. Foto: Pixabay

“Os dados sobre preservação ambiental no Brasil, incluindo a Amazônia, precisam ser comunicados da melhor forma no exterior, por meio de uma grande coalizão, envolvendo governo e setor privado, pois isso é uma responsabilidade nacional”, declarou Evaristo de Miranda, chefe-geral da Embrapa Territorial e membro titular da Academia Nacional de Agricultura da SNA. Segundo ele, “há uma grande incapacidade do governo e de representantes do agro em comunicar”.

Defensor da substituição das queimadas por soluções tecnológicas e de um plano de metas para a Amazônia, Evaristo afirmou que “não há ninguém mais interessado” em preservar o solo, a água e a biodiversidade do que o próprio agricultor. “É ele que também combate incêndios, se organiza em brigadas, e no entanto continua a ser alvo de um discurso de criminalização generalizada”, destacou o acadêmico.

“Quem costuma atacar são organizações que foram criadas originalmente para a comunicação e nós ainda estamos pensando como vamos comunicar. Há também um desconhecimento geral sobre a agricultura brasileira em outros países”, acrescentou Evaristo.

As críticas a respeito da preservação do meio ambiente, divulgadas por instituições e veículos de comunicação, muitas vezes seguem na contramão dos dados oficializados pela Embrapa, que desde o final da década de 80 realiza o monitoramento via satélite para detectar ocorrências de queimadas, contando ainda com o respaldo da NASA (Agência Espacial Americana).

Estatísticas

“A queimada é uma técnica agrícola ainda muito utilizada, mas o incêndio é algo sem controle que destrói o patrimônio público e privado. A média de queimadas na Amazônia nos últimos cinco anos, segundo a NASA, foi de 100.000, mas quase 90% das queimadas praticadas por agricultores ocorrem em áreas já desmatadas”, disse o especialista.

No entanto, completou Evaristo, “às vezes as queimadas podem escapar ao controle, como no caso de períodos mais secos, como ocorreu esse ano, mas isso não é o normal”.

Na América do Sul, de primeiro de janeiro até primeiro de dezembro de 2020, o número de queimadas registradas pelos satélites da NASA aumentou 23% em relação ao ano passado. “Na Argentina foi mais de 150% de aumento e no Brasil, 13%, ou seja, menos da metade da América Latina. No entanto, só se fala do Brasil”, disse o chefe-geral da Embrapa.

Na Amazônia Legal, observou Evaristo, “há mais de um milhão de agricultores, e essa informação é invisível para a mídia brasileira. Cerca de 25 mil imóveis rurais fazem queimadas na região a cada ano. Esse dado, comparado a um milhão, resulta em menos de 3%. Ou seja, cerca de 97% dos produtores rurais na Amazônia não usam fogo”.

Tecnologia

Ao mesmo tempo, a Embrapa conta com tecnologia para substituir as queimadas em qualquer contexto, informou o especialista. Porém, segundo ele, é um processo que depende de recursos ou créditos a serem oferecidos aos agricultores para que essa troca se torne viável.

No caso da Amazônia, muitos não podem ter acesso a essa tecnologia porque não possuem título de terra. “A maior batalha naquela região é a regularização fundiária”, admitiu Evaristo. “Queremos substituir as queimadas, que é uma técnica do período neolítico, mas não é multando os agricultores que vamos resolver essa questão”.

Plano estratégico

O chefe-geral da Embrapa Territorial também voltou a defender a adoção de um plano estratégico para a a Amazônia, com  um planejamento de metas para os próximos cinco anos, e a publicação de um relatório anual com informações sobre a região, incluindo desde aspectos relativos ao quadro natural do bioma – que segundo a Embrapa tem 84% de sua área composta por vegetação nativa, até dados sobre o setores agrícola e de infraestrutura.

“Não há uma visão sistemática da Amazônia”, disse Evaristo. “A agricultura no bioma, apesar de ser irrelevante em termos percentuais (representa menos de 3% da agricultura brasileira), é essencial para abastecer a população local, distribuída em quase 800 cidades”.

Desmatamentos

O especialista também ressaltou o problema do desmatamento ilegal, mas chamou a atenção para a necessidade da devida qualificação de dados sobre ocorrências para divulgação.

“Na Amazônia Legal foram registrados cerca de 30 mil desmatamentos nos últimos dez anos, segundo dados da Embrapa, sendo a grande maioria em áreas pequenas. De 10% a 12% desses desmatamentos ocorreram fora do meio rural”, disse.

“O setor agrícola soma cerca de 28 mil desmatamentos por ano. Nesse sentido, em termos de desmatamento realmente ilegal, deve haver algo próximo a mil por ano. Esses dados precisam ser qualificados da forma correta”, destacou Evaristo.

Outros aspectos

Nesse contexto,  disse ele, outros aspectos devem ser considerados. “Segundo a lei (Código Florestal), 20% de uma área pode ser desmatada e 80% tem de ser preservada. Passando de 20% é ilegal, mas isso também não é absoluto, porque se estivermos em um assentamento e o módulo fiscal, ou seja, a área mínima para uma família viver, é de 60 hectares na Amazônia, por exemplo, e se esse módulo tem 50 hectares ou menos que o mínimo, o agricultor vai acabar desmatando mais de 20%, senão ele morre de fome”.

Há também casos em que o produtor desmata áreas que não são dele, ressaltou Evaristo. “Ao mesmo tempo, há um grande número de pedidos de autorização às secretarias de Meio Ambiente para desmatamento de áreas sobre as quais o agricultor tem direito de acordo com a lei, mas que estão há anos sem resposta”, fazendo com que ele desmate por conta própria.

Além disso, completou o especialista, muitas vezes, devido às distâncias, os produtores têm dificuldade de acesso aos órgãos competentes para obter a autorização.

Proteção e inovação

Dados mapeados pela Embrapa indicam que países similares ao Brasil em termos de área protegem apenas 10% de seu território com vegetação nativa, e o Brasil preserva 30%, sem considerar os agricultores que conservam 26% da vegetação em áreas privadas. No total, 66,3% do território brasileiro (ou 2/3) são dedicados à preservação ambiental.

Já a área cultivada no Brasil corresponde a 7,8% do território nacional, segundo a Embrapa. Nesse sentido, reforçou Evaristo, a tecnologia continua a mostrar sua relevância. “O papel da inovação é essencial. Graças à tecnologia agrícola, estamos preservando áreas, produzindo mais em áreas menores e cuidando do solo e da água”.

 

Fonte: Jovem Pan/Direto ao Ponto

Equipe SNA

 

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