Outubro geralmente é o mês que as chuvas começam a cair, mas não é isso que tem sido visto, principalmente, nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, tanto na cidade quanto no campo. A estiagem prolongada tem preocupado produtores rurais, que já contabilizam prejuízos. Somente em São Paulo, as perdas podem passar de R$ 45 milhões, preveem especialistas.
De acordo com o pesquisador Daniel Pereira Guimarães, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Milho e Sorgo, de Sete Lagoas (MG), os problemas podem ser ainda mais sérios, pois a seca que atingiu o Nordeste entre 2011 e 2013 também atingiu o Sudeste, situação que reduziu a recarga dos lençóis freáticos. Ele ressalta que isto foi agravado com os veranicos de janeiro e fevereiro, que provocaram fortes quedas nas vazões dos recursos hídricos e a diminuição do fornecimento de energia hidrelétrica.
Conforme Guimarães, as chuvas de julho causaram o efeito de “seca verde” e a existência de água nas camadas superficiais dos solos mascarou, visualmente, a forte estiagem que se abateu nessa região.
“Nas regiões Sudeste e Centro Oeste, tivemos esse efeito provocado pelas chuvas do mês de julho (época de forte estiagem) e essa impressão de ‘normalidade’ em função da disponibilidade de água nas camadas superficiais dos solos.”
Guimarães pondera que os lençóis freáticos não foram abastecidos suficientemente e os resultados são claros na redução do volume de água dos recursos hídricos com os graves problemas para a geração de energia hidrelétrica, abastecimento humano, perdas na agricultura e aumento vertiginoso da incidência de queimadas.
“Muito comum no Nordeste brasileiro, a seca verde é caracterizada pela ocorrência de chuvas irregulares, que permitem uma aparência de normalidade na vegetação, mas insuficiente para atender às necessidades fisiológicas das plantas, o que afeta suas capacidades produtivas. Os produtores rurais nordestinos dizem se tratar do pior tipo de estiagem, pois são enganados e sofrem grandes prejuízos”, salienta o pesquisador.
De acordo com ele, no caso da região Sudeste, as chuvas de julho foram acima das médias históricas e as pastagens e vegetação nativa tiveram bons aspectos vegetativos que, rapidamente, mudaram com o aumento do período de estiagem. “Pode-se inferir que a manutenção da folhagem deve, inclusive, ter colaborado para a maior incidência de queimadas.”
Guimarães reforça que a estiagem, além da falta de chuva, também traz outros problemas para o campo, como índices menores de umidade do ar, ondas de calor e elevada ocorrência de queimadas. Ele destaca que Minas Gerais apresenta a situação mais crítica e as mesorregiões do Oeste mineiro e metropolitana de Belo Horizonte “são as mais castigadas”.
AUGE DO PERÍODO SECO
Para Guimarães, é certo afirmar que o auge do período seco ocorreu no final de semana dos dias 11 e 12 de outubro deste ano, quando as condições climáticas combinaram os menores índices de umidade relativa do ar – que chegaram a 10% em algumas cidades do interior de Minas; e abaixo de 15%, em grandes áreas das regiões Sudeste e Centro-Oeste – às maiores temperaturas, inclusive superando a marca de 40º C em algumas cidades, aos altos índices de radiação ultravioleta e à alta concentração de fumaça na atmosfera.
“Nos últimos dias, a ação de ventos oceânicos permitiram uma melhoria da umidade relativa do ar e redução da temperatura. A indicação das regiões mais críticas depende de cada situação a ser considerada. Para a região Sudeste, as situações mais críticas estão relacionadas ao abastecimento de água para consumo humano – veja o caso de São Paulo – e a redução na produção de energia”, informa.
“Essa diminuição de vazão dos recursos hídricos nessa região é complicada, pois Minas Gerais é conhecida como “Caixa D’água” do Brasil e a maior parte da produção e consumo de energia hidráulica brasileira ocorre nessa região”, explica o pesquisador.
Guimarães salienta também que no Centro-Oeste, o grande problema está relacionado com a redução das pastagens, influenciando o custo da carne que impactou na inflação do País, e o atraso no plantio da safra, que deveria ter sido plantada entre o final de setembro e o início do mês de outubro.
“Esse atraso de aproximadamente um mês pode ainda ter reflexos no plantio da segunda safra, conhecida como safrinha, que é importante para o abastecimento agrícola do Brasil e fonte de exportação, ou seja, poderá ter reflexos no abastecimento, inflação e balança comercial brasileira.”
Segundo o pesquisador da Embrapa, os modelos de previsão do tempo indicam que a frente fria que atua na região Sul do Brasil deverá trazer algumas chuvas para essas regiões afetadas pela estiagem, “reduzindo o desconforto térmico, melhorando a qualidade do ar e acabando com as queimadas”. “Pode-se dizer que o início da estação das chuvas nas regiões Sudeste e Centro-Oeste será, neste ano, a partir do mês de novembro”, destacou.
O que o produtor rural pode fazer?
Para tentar amenizar os efeitos climáticos na produção agropecuária brasileira, Guimarães ressalta que a pesquisa agrícola (na qual a Embrapa está incluída) tem papel importante na minimização dos problemas da seca na agricultura. E ele cita alguns exemplos, como o “Zoneamento Agrícola”, que indica as culturas, locais e épocas adequadas para o plantio.
“As técnicas de cultivo, como o plantio direto, reduzem as perdas de água por evapotranspiração. O melhoramento genético tem produzido materiais precoces e resistentes à seca. Culturas como o sorgo, algodão e girassol podem ser usadas em épocas de maiores riscos climáticos. A melhoria nas bases de dados climáticos (por exemplo, o Sistema Agritempo) permite um melhor monitoramento climático aplicado à área agrícola.”
Em relação à irrigação no campo, Guimarães afirma que os sistemas mais eficientes têm sido criados e a agricultura irrigada cresce substancialmente no País. “No entanto, a agricultura irrigada no Brasil é muito baixa em comparação a outros países. Enquanto nossa área irrigada fica em torno de 6 milhões de hectares, os Estados Unidos têm uma área de cerca de 30 milhões de hectares irrigados; a China tem 60 milhões; e a Índia cerca de 66 milhões de hectares.”
Guimarães informa ainda que a Embrapa está desenvolvendo projetos de pesquisa, em conjunto com a Agência Nacional de Águas (ANA), pelos quais as áreas de agricultura irrigada serão mapeadas pelo uso de satélites.
“O georreferenciamento dessas áreas permitirá que sejam criadas ferramentas de gerenciamento dos recursos hídricos, nas bacias hidrográficas, e a formulação de políticas públicas para a irrigação, que permitirá dobrar a área irrigada, até 2020, sem comprometer o uso da água para as demais finalidades a que se destina.”
Por equipe da SNA/RJ