A China concedeu US$ 292.6 bilhões em subsídios agrícolas em 2014, 10,7% mais que em 2013 e montante 22,4% superior ao total oferecido pelos 34 países ricos e emergentes que formam a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Nesse grupo, o total (US$ 239 bilhões) foi 5,8% menor que o do ano anterior, mas chamou a atenção o incremento de 44,1% registrado nos EUA, para US$ 41.5 bilhões, na contramão do movimento observado na União Europeia (UE) e no Japão, por exemplo.
Os dados são do relatório “Políticas Agrícolas: Monitoramento e Avaliação 2015”, que a OCDE publicou ontem. São baseados nas Estimativas de Apoio ao Produtor (Producer Support Estimate, ou PSE) da entidade, indicador do valor monetário bruto anual transferido por consumidores e contribuintes como ajuda aos produtores rurais.
Os resultados apontados para o ano passado vieram em meio a uma queda média de 11% dos preços dos alimentos monitorados pela FAO, puxada por retrações observadas nos mercados de cereais, oleaginosas, açúcar e algodão – as carnes subiram. Os lácteos também recuaram, mas no segundo semestre.
Nesse cenário, a China voltou a mostrar o quanto vem ampliando não só sua participação no tabuleiro global do setor, mas também sua política de apoio para garantir esse maior espaço. Em meados da década de 1990, sua fatia no PIB agrícola conjunto dos países cobertos pelo relatório da OCDE era de 18%, mas agora equivale a mais de 43%. Em contrapartida, a participação da União Europeia caiu de 28% para 15%, a dos EUA passou de 18% para 11% e a do Japão recuou de 9% para 2%. Já a do Brasil ficou estável em 6%.
No período 1997-1999, a ajuda chinesa aos agricultores foi, em média, de US$ 5.1 bilhões por ano, enquanto nos países da OCDE o valor alcançou US$ 253 bilhões. Do intervalo 1995-1997 ao período 2013/14, o apoio de Pequim cresceu 22% por ano, em média. Agora, os subsídios chineses ao setor agrícola excedem o gasto médio dos países da OCDE, mas, proporcionalmente, ainda ficam abaixo dos patamares observados em países como Noruega, Suíça, Coreia do Sul, Japão e Islândia.
Certo mesmo é que, hoje, 20,2% da renda do agricultor chinês vem de subvenções, quase o dobro do que acontece nos EUA e ligeiramente acima do registrado na Europa, em média. Pequim subsidia principalmente produtores de açúcar, que garantem 46% de sua renda com o apoio oficial. Em seguida vêm os produtores de lácteos (40%) e de algodão (38%). Os preços internacionais do algodão, por exemplo, seguem sob pressão dados os elevados estoques chineses.
Em boa medida, o que move o aumento dos subsídios agrícolas na China é o objetivo do país de alcançar 95% de autossuficiência alimentar, o que tem um custo elevado. Com quase 20% da população mundial, o país tem apenas 7% da água potável e 8% de terra agricultável do planeta. Tornou-se um grande importador líquido de produtos agrícolas, sobretudo soja, algodão, óleos vegetais e açúcar.
A comparação entre o aumento dos subsídios na China com a queda do apoio nos países da OCDE como um todo não ficou pior para os asiáticos graças aos americanos. Depois de uma queda no período 2012-2013, no ano passado as ajudas de Washington voltaram a crescer e passaram a representar 9,8% da renda do agricultor contra 6,9% em 2013.
No caso dos produtores de açúcar, o apoio dos EUA passaram a representar 26% da renda. Não por acaso, em passagem por Genebra recentemente a ministra brasileira da Agricultura, Kátia Abreu, observou que a “Farm Bill”, a política agrícola americana aprovada no Congresso, “é pior do que a Política Agrícola Comum [PAC] europeia” e pode ser “arrasadora” pelos volumosos subsídios em potencial que podem representar.
Na UE, os subsídios transferidos aos produtores rurais alcançaram US$ 106, 9 bilhões em 2014 contra US$ 121.3 bilhões em 2013 – um sinal do aperto fiscal na região. A ajuda garantiu 17,3% da renda dos agricultores, em ligeira baixa. Os maiores subsídios foram distribuídos a produtores de carne bovina – equivaleram a 25% de sua renda -, de frango (13%) e de açúcar (12%).
O relatório da OCDE coincide com o acirramento das disputas entre EUA, China e Índia nas negociações agrícolas na OMC. Os EUA mostram ambição quase nula, alegando que não veem concessões do lado da China e da Índia para cortarem seus subsídios internos aos agricultores. Chineses e indianos, por sua vez, dizem que precisam de espaço para se contrapor aos subsídios dos países ricos. Mas Washington insiste na importância da “visibilidade” das cifras chinesas. Alega que os números absolutos são tão elevados que reduzem o espaço de convencimento no Congresso por um acordo de Doha.
Fonte: Valor Econômico