Dinheiro Rural: E agora, a China

Nos últimos anos, todas as vezes que a China, seu maior parceiro comercial, espirra, o Brasil fica esperando por uma pneumonia. No início do mês passado, o país asiático deu mais um susto, desta vez por conta de suas principais bolsas de valores, o que obrigou as autoridades de Pequim a intervir fortemente nos pregões de Xangai e Shenzen, para conter a maior queda de seus índices, desde os anos 1990.

Cerca de 760 empresas tiveram seus papeis suspensos para negociações. Além disso, as autoridades centrais entraram no mercado, comprando papeis, através dos bancos oficiais. Mas o que tem a ver o mercado financeiro com as commodities agrícolas? Tudo. O fato é que se a economia chinesa se enfraquece, o país importa menos soja e minério de ferro do Brasil, e com isso entram menos dólares nos cofres do País.

De acordo com o economista Helio Sirimarco, vice-presidente da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA) e diretor da Sirimarco Consultores Associados, do Rio de janeiro, o estouro de uma bolha acionária chinesa poderia ser o tiro de misericórdia na economia brasileira, em 2015, assolada por toda a sorte de dificuldades, e que já trabalha com uma queda do Produto Interno Bruto (PIB) superior a 1,5%. “Os impactos sobre o Brasil seriam sentidos nas exportações, gerando uma situação fortemente baixista para a maioria das commodities”, diz Sirimarco. “O pessoal da soja sentiria mais, pois é a comodity com a maior dependência da China, que absorveu mais de 70% de nossas exportações, nos últimos três anos”.

Para entender o que ocorre na China é preciso voltar no tempo. Até aqui, o país vinha crescendo com base em um modelo exportador, em detrimento do consumo interno de seus 1,4 bilhão de habitantes. No entanto, desde o início dos anos 1990, a principal fragilidade dessa economia tem sido a baixa rentabilidade na produção industrial , associada ao aumento do custo da mão de obra.

Assim, a queda do lucro vem provocando uma constante fuga de investimentos para setores especulativos, principalmente o imobiliário, para rentabilizar os capitais. O complicador é que a queda no preço dos imóveis tem balançado a economia chinesa. Em 2014, o crescimento do país foi de 7%, ante taxas próximas de 10% em anos anteriores. Para a economia mundial, e mais especificamente para os exportadores de commodities, o principal receio é de que o governo chinês seja obrigado a desvalorizar sua moeda, o yuan, afetando os preços de insumos básicos.

Para o Brasil, essa não seria uma boa notícia. De acordo com o Ministério da Agricultura, a China foi o principal destino das exportações do agronegócio brasileiro, no primeiro semestre de 2015.

Em commodities agrícolas as compras chinesas foram de US$ 11,7 bilhões, valor que representa 27,2% dos US$ 43,3 bilhões exportados para toda a Ásia. O complexo soja, com grãos e farelo, liderou as vendas, com US$ 9,64 bilhões. No entanto, o desempenho das commodities no primeiro semestre deste ano já foi 17,5% inferior ao mesmo período de 2014, quando o País exportou US$ 14,2 bilhões. O recuo se deu em função do preço da soja, que caiu de US$ 506 a tonelada, em 2014, para os atuais US$ 387.

“Na medida em que os preços da soja já se encontram em níveis mais baixos, devido à ampla oferta, poderão sofrer novas quedas se a situação econômica chinesa não melhorar”, diz Sirimarco. “Isso pode significar para o Brasil um acirramento da concorrência com os Estados Unidos e a perda de participação no mercado internacional”. Além da soja, o açúcar é também muito vulnerável a uma crise no gigante asiático. Nos últimos três anos, os chineses foram os maiores importadores do produto brasileiro, posição que nunca haviam ocupado.

De acordo com o especialista em mercado de capitais e sócio do escritório Leite, Tosto e Barros Advogados, Flávio Maldonado, de São Paulo, apesar das instabilidades na China, ainda é difícil determinar se há de fato uma bolha asiática e se ela realmente está prestes a arrebentar. “Pode ser que essa bolha não se materialize, apesar de haver uma forte correção geral de preços nos mercados da China”, diz Maldonado. “O governo está atuando muito para corrigir desvios”. Maldonado lembra que, desde a crise financeira internacional de 2009, a ideia de deixar o mercado se ajustar por si só vem perdendo apoio no mundo. “A China parece estar fazendo a lição de casa”.

Para o presidente da SNA, Antonio Alvarenga, em função dessas correções de rumo, para o médio e longo prazo as expectativas em relação à China não se alteram. “As demandas por alimentos vêm do crescimento da população, do processo de urbanização e da elevação da renda chinesa”, diz Alvarenga.

De acordo com Maldonado, é preciso não perder de vista a potência na qual a China se tornou. “O governo está colocando muito dinheiro para não deixar que sua indústria seja contaminada”, diz. Ou seja, é muito difícil que país perca seu status de neo-superpotência. Em abril deste ano, o Fundo Monetário Internacional (FMI) colocou a China à frente dos Estados Unidos, pela primeira vez, no ranking das maiores economias mundiais. Segundo o FMI, o PIB chinês, somou US$ 17,6 trilhões ante US$ 17,4 trilhões dos Estados Unidos. O Brasil está em sétimo lugar, com US$ 3,3 trilhões. Além disso, os chineses possuem US$ 4 trilhões em reservas cambiais, as maiores do planeta. É o valor equivalente ao PIB do Mercosul.

 

Fonte: revista Dinheiro Rural, nº 128, agosto/2015

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