“O agronegócio precisa assumir um protagonismo no combate a irregularidades como a grilagem de terras e as queimadas. Não podemos ser lenientes com essa situação”, declarou o presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG), Marcello Brito, ao participar da segunda videoconferência “Amazônia: Ocupação Sustentável”, organizada na última sexta-feira pela Sociedade Nacional de Agricultura (SNA).
O coordenador do debate e presidente da Academia Nacional de Agricultura, Caio Carvalho, observou que, além da necessidade de o País retomar sua liderança na área ambiental, “a pandemia tem propiciado um entendimento de que as questões relativas ao meio ambiente terão um papel muito relevante nos próximos anos”.
“O que percebemos é que, após o ‘novo normal’ criado pela crise, entraremos numa fase de reinvenção, onde a sociedade terá o cuidado de escolher produtos e marcas com preocupação sócioambiental.
Tecnologia, créditos de carbono e estratégias de comunicação foram alguns dos assuntos debatidos durante o webinar.
O presidente da Abag salientou que, se por um lado o agronegócio evoluiu notadamente com tecnologia, oferecendo sistemas de rastreabilidade via satélite, que garantem transparência às cadeias de produção, por outro não avançou na solução das irregularidades do setor. “Temos um problema clássico de desmatamento ilegal na Amazônia e não podemos negar seu tamanho, pois tudo pode ser monitorado”.
Capacidade técnica
Brito destacou que o Estado brasileiro tem capacidade e técnica para combater os desmatamentos, mas precisa unir as informações disponíveis, com transparência. “Nos últimos dez anos, poderíamos ter resolvido por sensoriamento remoto 95% dos problemas de regularização em propriedades da Amazônia”, afirmou.
Paulo Hartung, presidente da Indústria Brasileira de Árvores (Ibá) declarou que “a ilegalidade na Amazônia saiu do controle”, e relacionou a responsabilidade pelos crimes praticados na região a um grupo pequeno. “Precisamos combater esse problema com energia, para a defesa dos brasileiros”.
Segundo o executivo, a Amazônia é um forte ativo para o mundo, mas o País não mostra o potencial da região em matéria de serviços ambientais. “O regime de chuvas da Amazônia permite a pujança do agro brasileiro”, disse ele, lembrando que a conservação do solo e a retenção de CO2 são também aspectos positivos.
“A economia mundial de baixo carbono é uma grande oportunidade para o Brasil, e não podemos perder posição por conta daqueles que estão cometendo irregularidades”.
Hartung defendeu o estabelecimento de metas claras para a diminuição do desmatamento e acrescentou que essa iniciativa “será um grande atrativo para que o País possa ter acesso aos créditos internacionais e gerar empregos e outros benefícios”.
Código Florestal
Por sua vez, o presidente da Abag, ao comentar sobre sobre a importância do Cadastro Ambiental Rural (CAR) como ferramenta governamental, afirmou que 11 milhões de hectares de terras no cadastro permanecem em áreas públicas federais. “Por que isso não foi cancelado?”, indagou Brito.
“Os estados brasileiros ainda não validaram, em sua totalidade, os dados do CAR. Temos o maior Código Florestal do mundo, mas até hoje ele não foi implementado em nosso benefício”.
No campo das emissões de CO2, complementou Brito, “por conta da regra de reservas legais, a soja hoje carrega um percentual de sequestro de carbono que nenhum país tem. Pelo uso de energia limpa, o Brasil carrega outro percentual de sequestro. Precisamos aprender a valorizar isso”, ressaltou Brito.
Na defesa
Para ele, “não adianta para o País ter o agro mais tecnificado do mundo” quando não há inteligência estratégica e comercial para aprimorar a produção”.
“Temos todas as ferramentas, e ficamos na defesa quando deveríamos estar no ataque. O momento atual é de rearranjo de lideranças. Estamos perdendo pra nós mesmos”, concluiu Brito, acrescentando que o País já iniciou um diálogo para a implementação de um novo paradigma de acesso a mercados. “O agro está inserido nesse contexto. Precisamos ser ávidos por liderança”, disse.
Mercado de carbono
Marina Grossi, economista e presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), afirmou que é preciso transformar as vantagens comparativas do Brasil (florestas, biodiversidade, matriz limpa, etc.) em vantagens competitivas. “Temos de computar as vantagens comparativas no preço”, destacou.
Durante a videoconferência, Grossi anunciou que o CEBDS está debatendo junto ao governo a proposta de criação de um mercado para o carbono. “O carbono é precificado em mais de 20% do mundo, e isso é uma tendência em alta, assim como os títulos verdes”.
A ideia de mercado, segundo Grossi, ao contrário da implementação de taxas no setor, “será mais atrativa e transparente para a sociedade”.No caso da Amazônia, a presidente do CEBDS informou que a preservação do bioma da região pode render ao país US$ 10 bilhões por ano no setor de crédito de carbono.
Agenda
“Precisamos nos organizar da melhor forma para dar nosso recado e atrair essa agenda de títulos verdes, precificação de carbono e rastreabilidade, pensando de forma global, porque no Brasil temos oportunidades para atrair diversos mercados, a partir da busca pelo melhor planejamento”, disse Grossi. “Temos de continuar competitivos e ampliar nosso espaço”.
A economista salientou ainda que a precificação de ativos é essencial para gerar investimentos e demanda por uma economia mais limpa. “Devemos ter uma economia mais resiliente, mais estável, ou então não vamos conseguir sustentabilidade. Temos de planejar uma transformação, mas no ritmo certo. As alianças são favoráveis e temos tudo para ganhar o jogo”.
Sociedade ativa
Ao ressaltar o protagonismo do Brasil no agro, Paulo Hartung enfatizou que o País deve se qualificar para evoluir no mercado e acrescentou que “a sociedade civil já começou a se mobilizar”.
“Precisamos de liderança e de uma sociedade ativa. Empresários e instituições devem promover um diálogo colaborativo. É importante colocarmos nossos produtos no mercado global, com todas as armadilhas e oportunidades, e saber como o mundo dos negócios está vendo o Brasil”.
O presidente da Ibá também chamou a atenção para a necessidade de melhoria da qualidade de vida da população da Amazônia. “É preciso dar oportunidades para os moradores locais, garantir saneamento e infraestrutura. Temos um tesouro, que ao invés de potencializá-lo, estamos matando ‘a galinha dos ovos de ouro’”, disse.
Comunicação
Hartung defendeu ainda a elevação do nível dos debates públicos e privados a respeito da problemática ambiental. “Podemos virar esse jogo e entrar na disputa para valorizar o Brasil perante o mundo, como uma potência verde”.
Ao reforçar a necessidade de melhor diálogo no setor, o presidente da Abag afirmou que “comunicação e marketing sem ações concretas é ‘greenwashing’ (promoção do discurso ‘ambientalmente correto’, sem gerar resultados efetivos)”.
“Mais vale para o Brasil entregar 10% de redução do desmatamento no próximo ano do que fazer uma campanha de US$ 50 milhões para enaltecer o País no mercado internacional. Isso é ação de validade”, ressaltou.
“Nos últimos dois anos, perdemos US$ 100 bilhões de capital externo. Isso é mais sério que qualquer boicote que o país sofra. 98% do agro nacional, segundo um estudo da Science, é legal e está em compliance. Esta é a comunicação que estamos ganhando lá fora”, destacou o presidente da Abag. Porém, acrescentou, “se insistimos em dar voz a uma minoria contrária a isso tudo, vamos perder essa comunicação”.
“O País precisa de gestos concretos”, completou Hartung. “Os grandes bancos mostraram atitude quando anunciaram recentemente a implementação de programas para financiar a sustentabilidade na Amazônia”. Por outro lado, observou o executivo, “a melhor peça de comunicação que temos é utilizar nosso poder de polícia, com inteligência, para combater a ilegalidade”.
Acompanhe, na íntegra, a videoconferência:
Fonte: Academia Nacional de Agricultura
Equipe SNA