Bem-vindas para quem mora no campo e na cidade, as chuvas que atingem o Centro-Sul do Brasil desde o início da semana terão tiro curto e serão insuficientes para reverter os danos já provocados pela seca em lavouras como as de trigo e de cana, segundo meteorologistas e produtores rurais.
A previsão da Somar Meteorologia é de que as precipitações se intensifiquem no Paraná, São Paulo e sul de Minas Gerais a partir de sexta-feira, 3, e acumulem no mínimo 50 milímetros até a próxima quarta-feira, 8. Em seguida, porém, as chuvas já começam a se enfraquecer, e a partir do dia 10, o clima volta a ficar seco e quente, disse Celso Oliveira, meteorologista da Somar.
Diante disso, já é certa alguma quebra na produtividade esperada para a safra de trigo, que será colhida a partir de setembro. Os produtores mais preocupados são os do norte do Paraná. Se chover, dá para estimar quebra de 40%, disse Irineu Baptista, gerente da cooperativa Integrada. Cobrindo uma área com 80.000 hectares de trigo na região de Londrina, a expectativa inicial da Integrada era de uma produtividade de 3,6 toneladas por hectare. Hoje, se alcançar 2,2 toneladas, seria uma boa quantidade, disse Baptista. Esse rendimento resultaria em uma produção entre 160.000 e 176.000 toneladas.
Essa realidade se repete na Capal, cooperativa com sede em Arapoti. Por lá, é líquido e certo que a produtividade será ao menos 20% inferior às 3,5 toneladas por hectare esperado inicialmente, segundo Adilson Fuga, presidente da cooperativa. Com 20.000 hectares seus semeados com trigo no Paraná, essa quebra deve reduzir a colheita da cooperativa no Estado em cerca de 15.000 toneladas, para 55.000 toneladas.
As lavouras do norte paranaense são as mais afetadas porque foram plantadas mais cedo, no fim de abril, disse Hugo Godinho, técnico do Departamento de Economia Rural (DERAL), da Secretaria de Agricultura do Paraná. Nessas áreas, foi mais precoce o perfilhamento e a formação das espigas do trigo, mais suscetíveis à falta de chuvas.
Oliveira, da Somar, não descarta mais problemas para as lavouras de trigo entre este mês e setembro, quando as plantações estarão mais próximas da maturação e o clima seco deve voltar.
Nas áreas com cana, as chuvas atuais reduzem o estresse das lavouras que serão colhidas entre setembro e novembro. Para o meteorologista, ainda que a seca volte em seguida, o solo estará em melhores condições. O norte e oeste de São Paulo – incluindo Araçatuba, Presidente Prudente, Assis e Ribeirão Preto, bastante prejudicadas pela seca – devem receber chuvas volumosas nos próximos dias. Porém, as usinas não veem recuperação da produtividade.
As perdas provocadas pela seca nas lavouras de milho de segunda safra, ou safrinha, também são irreversíveis, uma vez que a colheita já está em curso. Entre as principais regiões produtoras, houve algumas que ficaram mais de 100 dias sem o volume mínimo adequado de precipitação, de 10 milímetros, segundo a Somar Meteorologia.
O cenário é mais incerto para a soja, já que os primeiros passos do plantio da safra 2018/19 ocorrem só em meados de setembro em Mato Grosso. Neste momento, os meteorologistas preveem chuvas fracas e irregulares para setembro, o que pode dificultar a semeadura.
No caso dos hortifrútis, as elevadas temperaturas aceleraram a maturação das culturas, aumentando a oferta e pressionando preços em plenas férias de inverno, quando a demanda diminui. O índice Ceagesp, que reúne os preços no maior entreposto do País, caiu 5,2% em julho, com desvalorização de 9,3% para as verduras e de 10,3% para os legumes. O tomate, mais sensível ao calor, recuou 19%. Segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA), os próximos dias devem ser de queda na oferta do produto após a antecipação da colheita.
Para o café, a seca recente foi favorável, uma vez que permitiu o avanço da colheita da safra 2018/19, que vinha atrasada no País. No entanto, já levanta alguma preocupação em relação ao próximo ciclo, o 2019/20, cuja floração começa em setembro. Semana passada, Silas Brasileiro, presidente do Conselho Nacional do Café (CNC), demonstrou esse temor, em relatório. Com a previsão de chuvas significativas apenas a partir da segunda metade de setembro, temos que monitorar os efeitos que esse longo período de estiagem poderá ocasionar [na safra 2019 /20]. O próximo ano será de safra baixa no ciclo bienal e as condições climáticas podem impactar ainda mais o rendimento, afirmou ele.
Mas para o agrometeorologista Marco Antonio dos Santos, da Rural Clima, é exagero dizer que a seca recente afetará a safra 2019/20. Quanto mais estresse hídrico no período entre junho e agosto, maior será a intensidade do florescimento [nos cafeeiros] assim que chegarem as chuvas de primavera. Isso porque nessas condições o amadurecimento dos botões florais é favorecido. E, segundo ele, há expectativa de chuvas no período de florada nas regiões de café do país. Para setembro, a previsão é de chuvas irregulares, mas em outubro as precipitações devem ocorrer de forma generalizada.
Fonte: Valor