Diante do horizonte sombrio que, no fim de 2014, pautava as perspectivas para o agronegócio brasileiro em 2015, é possível afirmar que o setor enfrentou menos turbulências do que esperava no primeiro semestre e iniciou a segunda metade deste ano com a clara sensação de que dias melhores virão.
Não que a tendência de queda dos preços das commodities agrícolas tenha se revertido, ou que as incertezas e dificuldades no front econômico e político sejam parte do passado. O consumo doméstico dá sinais de fraqueza e o crédito está mais escasso e caro, ao mesmo tempo em que as margens diminuíram, sempre com as exceções de praxe.
Mas a valorização do dólar, que superou as expectativas e vitaminou as principais cadeias exportadoras ligadas ao campo, até agora evitou o debacle de economias regionais dependentes da agropecuária e já voltou inclusive a acalentar planos de expansão em alguns mercados.
“O câmbio aumentou a competitividade do setor”, repetiram cinco analistas do Rabobank Brasil em encontro com o Valor. Segundo eles, grãos, algodão, café, açúcar, suco de laranja e carnes foram, em maior ou menor escala, beneficiados pelo dólar mais forte em relação ao real, ainda que insumos como fertilizantes e defensivos, a maior parte importada, tenham ficado mais caros.
Como trabalhava, no fim de 2014, com uma projeção de dólar entre R$ 2,70 e R$ 2,80 para este ano, e a moeda americana caminha no momento para R$ 3,50, a equipe da subsidiária brasileira do banco de origem holandesa revisou os cenários traçados e passou a ter uma visão de curto prazo mais otimista para o campo.
Termômetro dessa mudança de humor é a soja, carro-chefe do agronegócio nacional. Mesmo que as margens dos produtores tenham sido mais magras na safra 2014/15 e que as cotações na bolsa de Chicago estejam 15% mais baixas que no mesmo período do ano passado, o Rabobank já passou a dar como certo, em linha com outras estimativas, que o avanço do grão vai continuar.
“A conjuntura atual deverá permitir uma nova expansão da área plantada de soja em 2015/16”, diz o analista Renato Rasmussen. E, segundo ele, os investimentos dos produtores da oleaginosa em tecnologia serão mantidos – ainda que seu colega Victor Ikeda pondere que incertezas perduram e que, nesse contexto, é de se esperar uma “otimização” desses investimentos.
De acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a área plantada de soja ocupou 31.9 milhões de hectares em 2014/15, quase 6% mais que em 2013/14, e a colheita alcançou 96.2 milhões de toneladas, 11,7% mais na mesma comparação. Números recordes, que, na visão do Rabobank, tendem a ser superados na nova temporada.
Além do dólar, pesou a favor dos sojicultores, nas últimas semanas, um surto de alta das cotações em Chicago, por conta de adversidades climáticas nos EUA. Essa valorização, que já perdeu força, estimulou a aceleração das vendas antecipadas da nova safra, enquanto a demanda da China, ainda bastante aquecida, evite tombos maiores dos preços.
Rasmussen destaca, ainda, que graças ao câmbio o Brasil ganhou competitividade no mercado de soja em relação a seus principais concorrentes (EUA e Argentina), e que parte da escassez de crédito tem sido compensada pelo aumento das operações de “barter”.
Conforme o analista, o mercado de milho também foi favorecido pela combinação entre o dólar forte e a alta – até certo ponto inesperada – das cotações em Chicago entre junho e julho, e aponta o forte ritmo das exportações como outro sinal de que a situação está melhor que a inicialmente prevista.
De acordo com a Conab, os embarques brasileiros do produto deverão somar 21 milhões de toneladas em 2014/15, mesmo patamar da safra anterior, mas no começo do ciclo havia sérias dúvidas se seria viável manter esse desempenho. Além disso, a demanda das empresas de frango e suínos continua firme.
Andy Duff, analista do Rabobank que acompanha o setor sucroalcooleiro, observa que a valorização do dólar beneficiou o açúcar – cuja oferta global continua amplamente confortável e cujos preços internacionais seguem baixos -, mas lembra que o mercado interno melhorou para o etanol e que a cogeração de energia se firmou como um bom negócio.
Em sua análise sobre o mercado de café, Jefferson Carvalho destaca, além dos reflexos favoráveis do câmbio para os produtores e exportadores brasileiros, sua expectativa de que os estoques globais recuem nos próximos meses diante de um consumo ainda forte, o que pode abrir espaço para uma alta das cotações internacionais.
Fonte: Valor Econômico