Uma história de sucesso na maior festa popular brasileira
O caju, um dos símbolos tropicais e espécie natural do Brasil, será cantado nos festejos que começam nesse fim de semana. A Mocidade Independente de Padre Miguel, agremiação da zona oeste do Rio de Janeiro, levará para seu desfile a história de como a fruta ganhou o mundo após sua descoberta no país pelos portugueses, que, a partir do século XVI, a levaram para seus territórios na África e Ásia. Mesmo perdendo gradualmente a liderança da produção mundial para as antigas colônias lusitanas onde o caju encontrou solos igualmente férteis, o Brasil segue entre as principais nações nesse cultivo.
Uma curiosidade é que o caju é, a rigor, um pseudofruto, já que a polpa é considerada um pedúnculo, enquanto a castanha, também muito cobiçada, é o fruto propriamente dito do cajueiro, advinda do ovário da flor. “Pede caju que dou… Pé de caju que dá!”, título do enredo, já chama a atenção com antecedência pois o samba escolhido bateu recorde de downloads nas plataformas digitais. A escola de Padre Miguel também mostrará a influência cultural e histórica do caju através dos séculos e regiões brasileiras.
Números e singularidades do caju nacional
De acordo com a Embrapa, a região Nordeste, com uma área plantada superior a 650 mil hectares, responde por mais de 95% da produção nacional, sendo os estados do Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte e Bahia os principais produtores. A importância social do caju no Brasil traduz-se pelo número de empregos diretos que gera, sendo 35 mil no campo e 15 mil na indústria, além de 250 mil empregos indiretos nos dois segmentos. Para o semiárido nordestino a importância é ainda maior, porque os postos de trabalho no campo são gerados na entressafra das culturas tradicionais como milho, feijão e algodão, reduzindo, assim, o êxodo rural.
Segundo dados do IBGE e MAPA, a castanha é a parte mais valiosa e rende muito em exportação, tendo gerado 121,2 milhões de dólares ao Brasil somente em 2019, com vendas para mais de 60 países. Cerca de 80% da produção é processada em território nacional. A casca é usada em tintas e vernizes; a amêndoa (terceira noz mais consumida do mundo) vira biscoito e pasta; e, por fim, com a polpa se faz cajuína, suco, geleias, licores, aguardentes e carne vegetal.
No Nordeste, onde se concentra a produção nacional, o caju é fonte de renda para mais de 190 mil pequenos produtores rurais, normalmente organizados em cooperativas. Particularmente mais popular em alguns lugares da região, o caju tem direito a um museu próprio, situado em Caucaia, no Ceará, tamanha a identificação com a cultura local. No estado há, inclusive, capacidade maior de processamento do que a utilizada, o que permite ampliar a produção sem trazer novos encargos ou investimento aos interessados.
Hoje, do que é processado no país, cerca de 45% são consumidos internamente, e o restante é vendido ao exterior. Uma parcela menor é exportada in natura, sem nenhum tratamento. Justamente por ser um país que não olha apenas para a castanha, o Brasil ainda é referência no cultivo, atualmente liderado por Costa do Marfim, Vietnã e Índia.
Além da popular cajuína, outros derivados ganham espaço no mercado, até mesmo um “queijo”, isto é, massa pastosa produzida a partir do uso das fibras para veganos e intolerantes à lactose. Essas variações movimentam mercados locais, mas empresários e especialistas dizem que o caju precisa sair de uma produção quase que artesanal para se tornar um setor mais comercial, visando maior consumo e exportação da castanha, da polpa e de seus subprodutos.
Caminhos do crescimento e a oportunidade de divulgação
Os desafios da cajucultura são a falta de mão de obra para a colheita, pouca assistência técnica e, principalmente, ausência de uma maior divulgação do caju. Para isso, são necessários mais capacitação, crédito e estímulo do consumo, para reduzir ainda mais o desperdício no processamento, garantindo a sustentabilidade.
Já registrada em verso e prosa por Vinicius de Moraes, Caetano Veloso e Tim Maia, o caju brasileiro segue agora para brilhar na Avenida Marquês de Sapucaí e divulgar sua qualidade diante de um público gigantesco, in loco e pela transmissão dos desfiles, numa exaltação que poderia ser mais frequente num país campeão da agricultura como o Brasil.
Em 2013, a Vila Isabel foi campeã retratando a vida no campo e o trabalho dos agricultores, com um samba particularmente elogiado que ilustrou aspectos por vezes renegados de um segmento que é tão importante para o país. É salutar que o Carnaval, assim como outras festas e manifestações artísticas, elejam esses símbolos para que figurem numa ocasião de festa, congregação e publicidade, assim como outras nações fazem com os elementos constituintes de seu tecido social e arcabouço cultural/econômico.