Há apenas 14 gargalos no comércio mundial de alimentos, mas eles são fundamentais para a segurança alimentar de toda a população do planeta. São portos e pontos de comercialização fundamentais para a compra, a venda e a distribuição de alimentos, de acordo com um recente relatório da Chatham House, centro de estudos com base no Reino Unido.
Três deles estão na América Latina: o canal do Panamá, as rodovias do interior brasileiro e os portos do sul e sudeste do Brasil. Outros desses pontos de gargalo incluem o estreito de Gibraltar, as ferrovias do interior dos Estados Unidos, o estreito de Hormuz (no Oriente Médio) e o estreito de Dover, no norte da Europa, por exemplo.
Mas as mudanças climáticas, a estrutura deficiente e as potenciais crises poderiam colocar em risco essas rotas de comércio.
“Há pontos de gargalo marítimos (estreitos e canais), costeiros (portos) e terrestres (estradas, ferrovias e hidrovias), e o comércio global de alimentos depende fortemente deles”, afirma o estudo.
“Interrupções em um ou mais desses pontos poderiam ter enormes impactos. Os preços globais dos alimentos, o abastecimento de mercados locais, a sobrevivência de comerciantes e agricultores e a provisão de comida para as comunidades mais vulneráveis dependem do movimento contínuo de bens por meio de fronteiras e oceanos.”
Sobre o Brasil, que é um dos maiores produtores mundiais de alimentos, o relatório lembra que “fortes chuvas tornam intransitáveis as rodovias mal conservadas em diversas ocasiões, impedindo o transporte de comida das fazendas no interior do país aos portos litorâneos”.
“Um cenário extremo – em que portos na costa americana fossem fechados por conta de um furacão ao mesmo tempo em que estradas-chave do Brasil fossem inundadas pelas chuvas – poderia reduzir pela metade o suprimento global de soja”, prossegue o estudo.
Os pesquisadores citam também os impactos políticos que crises relacionadas à distribuição de alimentos podem causar.
“Interrupções (de fornecimento alimentar) podem estimular a instabilidade política. Governos dependem do funcionamento desses pontos de gargalo para garantir o suprimento eficiente de comida para suas populações. Uma colheita fraca de trigo na região do mar Negro, por exemplo, contribuiu para a ocorrência de protestos no norte da África entre 2010 e 2011; esses protestos evoluíram para a Primavera Árabe.”
PROTEÇÃO
A Chatham House também advertiu que é preciso agir para proteger as principais rotas de transporte de alimentos, tais como o canal do Panamá, o canal de Suez e do estreito da Turquia.
Quase 25% dos alimentos do mundo são comercializados nos mercados internacionais. Isso, diz o relatório, faz com que a oferta de produtos e seus preços sejam vulneráveis a crises imprevistas ou mudanças climáticas.
A infraestrutura nesses pontos é, em muitos casos, antiga e enfrentaria dificuldades para fazer frente a desastres naturais que devem se multiplicar à medida que o planeta se aquece, diz o relatório. Seus autores também aconselham os governos a investir em infraestrutura “resistente ao tempo” e a diversificar a produção e o armazenamento de alimentos.
INTERDEPENDÊNCIA
O relatório dá exemplos de quão dependente é o mundo dessas negociações internacionais:
* Três quartos das importações de milho e trigo do Japão passam pelo canal do Panamá;
* Pouco mais de um terço das importações de cereais para o Oriente Médio e o Norte da África passam por estreitos turcos, sem rota marítima alternativa disponível;
* Mais de 25% de exportação de soja circula pelo estreito de Malaca, entre a Malásia e a Indonésia;
* Estradas do Brasil, maior exportador de soja do mundo, estão sob risco de inundações e deslizamentos de terra em caso de fortes chuvas;
* Os portos dos EUA na costa do golfo da Califórnia enfrentam tempestades impulsionadas pelo aumento das marés;
* Os países do Conselho de Cooperação do Golfo dependem de grãos da região do mar Negro que são transportados por pontos comercialização de ferrovias e portos russos e ucranianos do estreito da Turquia e do canal de Suez.
“Os riscos crescem à medida que fazemos mais interações comerciais entre os países e aumenta a presença de alterações climáticas”, disse Laura Wellesley, uma das autoras do estudo. “Existem riscos tanto para a segurança alimentar dos países importadores como para as economias exportadoras de alimentos.”
Fonte: BBC