As idas e vindas de um projeto inovador

Bernardo Gradin se viu nos últimos quatro anos enredado nos sucessivos reveses de seu projeto de etanol de segunda geração, produzido a partir de resíduos da cana (palha e bagaço). Mas os principais nós parecem, enfim, desatados.

Após levar disputas com fornecedores a câmaras arbitrais e gastar dezenas de milhões a mais para desenvolver soluções tecnológicas próprias, o que levou os investimentos totais a superarem US$ 220 milhões, o sócio da GranBio se sente seguro em anunciar para janeiro próximo a retomada da operação da usina que produzirá a inovação, agora já em escala comercial.

A volta à ativa da Bioflex, que foi inaugurada em 2014 no município de São Miguel dos Campos (AL) e começou a enfrentar sérios problemas em 2016, se tornou viável porque a GranBio passou os últimos anos destrinchando e reinventado cada etapa de seus processos.

O alento, diz Gradin, é que os percalços foram tantos que deverão credenciar a unidade a se tornar também uma fornecedora de tecnologia a outros empreendimentos de etanol celulósico.

A “reinvenção tecnológica” da planta foi juridicamente assegurada depois que a GranBio fechou um acordo com o principal fornecedor de equipamentos do projeto, o grupo italiano Mossi Ghisolfi (MG), e encerrou uma disputa que se arrastava desde 2014.

Diante de problemas apresentados já naquele ano com as soluções elaboradas pela italiana, a GranBio inicialmente reclamou com a própria parceira. A MG, porém, vivia um momento turbulento, com problemas financeiros agravados pela morte de seu controlador, Guido Ghisolfi, em 2015.

Para poder promover ajustes na tecnologia sem ter que pedir autorização ou compartilhá-las com a MG, a GranBio entrou com um pedido de arbitragem na Inglaterra em 2016, mesmo ano em que suspendeu a operação da Bioflex. Em 2017, a empresa italiana pediu concordata nos EUA e na Itália, o que aprofundou as incertezas.

Parte da solução chegou no início deste ano, quando a seguradora inglesa contratada para garantir o funcionamento da tecnologia da MG, e que assumiu as rédeas da empresa com o andamento da concordata – propôs um acordo.

Segundo Gradin, ela abriu mão do compartilhamento das novas tecnologias e aceitou arcar com um ressarcimento. Após a concordata da MG tramitar na Justiça italiana, a GranBio recebeu, no mês passado, um depósito de US$ 25 milhões, de acordo com documentos anexados ao processo, de acesso público.

Gradin ainda reivindica um ressarcimento de seguradoras brasileiras, que haviam garantido o funcionamento da engenharia e da tecnologia da planta. O valor requerido, diz Oswaldo Dalla Torre, diretor da GranBio, está na casa das “centenas de milhões de reais”. Se as conversas não chegarem a um consenso, Gradin afirma que poderá entrar com um processo.

Outra frente de batalha da GranBio foi com a TRLLC, sua sócia na American Process Inc. (API). Em junho de 2015, a API, na qual a GranBio tinha 25% de participação, firmou acordo para fornecer à brasileira uma tecnologia para a produção de açúcares a partir da celulose quebrada da biomassa.

Em novembro de 2016, em meio a diversas intervenções na planta alagoana, a API, sob o comando da TRLLC, entrou com um processo na Justiça americana contra a GranBio acusando-a de apropriação de segredos comerciais e quebra de contrato.

Segundo documentos públicos do processo, a GranBio defendia que o contrato garantia que melhorias na tecnologia seriam suas. Para evitar uma longa briga nos tribunais, a brasileira convenceu o juiz americano Mark Cohen, em 26 de julho de 2017, a manter a disputa em processo arbitral. Mas o processo foi encerrado depois que a GranBio exerceu seu direito de compra dos demais 75% de ações na API, em março deste ano.

Mas, enquanto travava essas disputas, a GranBio contratava especialistas e consultorias para reinventar processos desde a fase de pré-tratamento da biomassa até a etapa de fermentação dos açúcares.

“A curva do pioneirismo foi muito mais árdua do que a gente esperava. Não esperávamos que os processos estivessem tão distantes da escala. Acreditávamos que a tecnologia estava muito mais pronta do que realmente estava”, afirma Gradin. Os aportes adicionais para resolver os problemas tecnológicos da planta atingiram R$ 170 milhões, que se somaram aos R$ 600 milhões investidos para erguê-la.

Entre 2016 e 2017, após uma primeira etapa de intervenções, a GranBio conseguiu rodar a Bioflex por 120 dias ininterruptos. Antes, com a tecnologia italiana, o máximo havia sido seis dias. Os investimentos foram mantidos inclusive em 2017, quando a GranBio ligou sua unidade de cogeração de energia anexa à Bioflex e ao menos aproveitou os altos preços da energia na época.

Para 2019, o empresário acredita que será possível produzir 30 milhões de litros de etanol e faturar cerca de R$ 120 milhões, somando os ganhos com a cogeração.

Mas os planos de Gradin para o futuro foram redimensionados. Ele já não cogita erguer outras biorrefinarias, como queria. Mas acredita que a Bioflex poderá dar lucro operacional já em 2019 e não descarta construir uma segunda planta de etanol “2G” em 2022. Paralelamente, procura parceiros para licenciar a tecnologia desenvolvida pela GranBio.

 

Fonte: Valor Econômico

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