Por Paulo Hartung*
O ano se inicia iluminado pela necessidade de novas atitudes. Um novo ciclo em que o multilateralismo seja retomado de fato, debates sejam sustentados pela razão e pela ciência e o futuro sustentável do planeta seja uma obsessão de todos.
Fica cada vez mais claro que a questão de ESG (sigla em inglês para “ambiental, social e governança”) passa a ser o cerne de uma nova atitude. Este ano será marcado por eventos que reforçam o diálogo global e o trabalho em prol de soluções conjuntas que podem ajudar a tornar viável um mundo melhor.
Em 2021 serão duas conferências das Nações Unidas no mesmo ano: a COP-15 da Convenção da Diversidade Biológica (CDB), que deve negociar a nova Estratégia Global de Biodiversidade Pós-2020; e a COP-26 de Mudança Climática, em Glasgow, que pretende abordar a criação de um mercado global de carbono, conforme o Acordo de Paris, ferramenta fundamental para incentivar a aceleração da economia de baixo carbono. Teremos também, pela primeira vez no Brasil e fora da Finlândia, o Fórum Mundial de Bioeconomia, em Belém, no Pará.
O Brasil tem de saber aproveitar essa movimentação global. Trata-se do país com a maior floresta tropical do mundo, a maior biodiversidade do planeta e um agronegócio sustentável. Temos tudo para transformar nossas potencialidades em oportunidades e para isso há urgências que não podem ser deixadas de lado.
A tarefa mais impositiva é uma resposta adequada e concreta a atos criminosos na Floresta Amazônica, como os desmatamento, as queimadas, a grilagem de terras e o garimpo ilegal.
O setor produtivo brasileiro já tem sido demandado por consultas públicas, como as abertas pelo Reino Unido e pela Comissão Europeia, com o objetivo de criar legislações internas para coibir o desmatamento ilegal nas cadeias de suprimentos.
Consumidores e varejistas têm feito movimentos buscando garantir que os produtos escolhidos sejam sustentáveis. Os alertas dos investidores internacionais são sonoros. Larry Fink, presidente da BlackRock, a maior gestora de ativos do mundo, sentenciou que países emergentes que não provarem que estão cuidando das pessoas, do meio ambiente e da governança vão pagar juros mais altos.
Para mudarmos esta percepção do mundo precisamos de ações e resultados. E sabemos o caminho a ser percorrido: implementar o Código Florestal em sua plenitude, avançar em tecnologia e transmissão de dados para monitoramento e ação contra atos ilícitos, investir no desenvolvimento da Região Amazônica, para levar infraestrutura básica aos mais de 25 milhões de brasileiros e brasileiras que lá vivem.
Estancando essa crise que prejudica o hoje e o amanhã, o Brasil tem todas as condições para reassumir seu protagonismo no debate mundial sobre sustentabilidade. Não precisamos inventar a roda. Temos dentro do nosso território exemplos claros, que podem ser estímulos e modelos para outros negócios.
O cultivo de árvores para fins industriais no Brasil é um dos faróis dentro da bioeconomia, uma agricultura que tem em sua veia a sustentabilidade e a inovação. Essa agroindústria tem os olhos voltados para o futuro. Planta, colhe e replanta, comumente em terras antes degradadas pela ação humana. No Brasil, com mais de 50 milhões de hectares previamente degradados por outros usos, há muito espaço para continuar produzindo, sem necessidade de abrir novas áreas.
Encurtando cada vez mais a distância entre o futuro e o presente, esse segmento desenvolve novas aplicações da madeira. Entre novas fábricas e expansões, o setor tem anunciado mais de R$ 35,5 bilhões, incluindo dois projetos de celulose solúvel (Bracell e LD Celulose, joint venture entre a austríaca Lenzing e a brasileira Duratex). Sua principal aplicação é na viscose, que vem ganhando espaço na indústria têxtil, um mercado ainda dominado por fibras sintéticas. A Suzano trabalha a celulose microfibrilada em parceria com a startup finlandesa Spinnova para produzir fios têxteis com ganhos de sustentabilidade, redução de uso de água e químicos.
Outro exemplo de inovação verde a partir da celulose microfibrilada (MFC) vem da Klabin. Em parceria com o Senai e a Apoteka de cosméticos, a empresa finalizou, em tempo recorde, os testes para produção de álcool em gel. O novo produto, extraído da madeira, substitui o carbopol, componente da fabricação de álcool em gel de origem fóssil.
O mundo está entrando no movimento ESG, que significa uma nota de corte crescente para produtos, empresas e países. No Brasil já temos empresas e setores que navegam nesse universo há anos. Está na hora de enxergarmos tendências, percebermos potencialidades e construirmos pontes entre a possibilidade e a realidade. Assim fortaleceremos o combate às mudanças do clima, estabelecendo perspectivas de um mundo mais saudável para as atuais e as futuras gerações, produzimos riquezas e criamos empregos para a juventude brasileira, hoje.
*Paulo Hartung é economista, presidente executivo da Indústria Brasileira de Árvores (Ibá) e membro do conselho do Todos pela Educação. Foi governador do Estado do Espírito Santo (2003-2010 e 2015-2018).
Fonte: Estadão