Por William Koga*
As notícias da aprovação da redação final no Projeto de Lei nº 5.191 pela Câmara dos Deputados, nas últimas sessões de 2020, e no dia 10 pelo Senado foram muito bem recebidas pelo mercado. Após a sanção presidencial será criado no Brasil o Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro).
Esse veículo permitirá a captação de recursos de investidores, nacionais ou estrangeiros, destinados ao investimento no agronegócio, realizado por diversas formas, desde a aquisição direta de imóveis rurais, aqueles que pelo Estatuto da Terra possuem destinação agrícola, pecuária, extrativista vegetal, florestal ou agroindustrial, até a aquisição de participação societária, títulos ou valores mobiliários emitidos por sociedades que explorem atividades integrantes da cadeia agroindustrial ou, conforme o caso, que tenham lastro nesse segmento econômico.
O Fiagro incrementará a profissionalização na gestão de investimentos no agronegócio, uma vez que o funcionamento desse veículo exigirá a presença de agentes de mercado regulados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), tais como administradores fiduciários e gestores de recursos de terceiros, que terão atuação direta na constituição do Fiagro e nas suas decisões de investimento.
Esses agentes deverão agir de acordo com as normas que disciplinam suas atividades, que lhes exige, por exemplo, observância ao dever de diligência com relação à seleção e aquisição dos ativos que integrarão a carteira do Fiagro. A presença desses participantes especializados permitirá, ainda, a democratização do produto financeiro com lastro agropecuário, especialmente ao investidor de varejo, que poderá contar com expertise de terceiros na gestão de seus recursos.
A criação ou alteração de leis que regulam matérias afetas ao mercado de capitais invoca a regulamentação específica pela CVM, por meio da edição de resoluções próprias, a exemplo das alterações trazidas pela Lei nº 13.874, de 2020, a Lei de Liberdade Econômica, na matéria de fundos de investimento, que originou a Audiência Pública da CVM nº 8, de 2020, para discutir a minuta da nova resolução que deverá regular os fundos de investimento.
Com a lei que criará o Fiagro não será diferente. A proposta apresentada no referido projeto de lei é a de que o Fiagro seja incluído dentro do âmbito normativo dos Fundos de Investimento Imobiliário (FII), cujas disposições gerais poderão disciplinar subsidiariamente os Fiagro.
Atualmente, os FII são regulados pela Lei nº 8.668, de 1993 (que poderá ser alterada pelo Projeto de Lei nº 5.191 para prever a criação dos Fiagro) e pela Instrução Normativa da CVM nº 472, de 2008. Todo o procedimento para constituição e funcionamento do Fiagro deverá ser posteriormente disciplinado pela CVM que poderá, ainda, criar categorias específicas conforme o seu público-alvo e a natureza dos investimentos a serem realizados.
Note-se, portanto, que após a conclusão do trâmite legislativo do Projeto de Lei nº 5.191, a efetiva disponibilização de cotas emitidas pelos Fiagro ao mercado dependerá da regulamentação desta categoria pela CVM. Em 10 de dezembro de 2020, a CVM divulgou sua agenda regulatória para 2021, indicando os seus principais objetivos, dentre eles a finalização da audiência pública para discussão da nova norma sobre fundos de investimento.
Essa proposta, especificamente, envolve substituir a atual Instrução CVM nº 555, de 2014, por uma nova resolução disciplinando de modo geral o funcionamento dos fundos de investimento. Os tipos específicos como fundos de investimento em direitos creditórios (FIDC), fundos de investimento financeiro (FIF), fundos de investimento em participações (FIP) e os FII, serão regulados na forma de anexos normativos à resolução mencionada.
Essa audiência pública, nessa data aberta para discussão, apresentou minutas da resolução e dos anexos normativos referentes aos FIF e FIDC, sendo que as normas relativas aos FIP e FII deverão ser tratadas em um segundo momento.
Nesse sentido, é razoável antecipar que antes da regulamentação dos Fiagro o regulador privilegie a definição da nova norma geral de fundos de investimento – visto que, inclusive, ela poderá ter impactos na disciplina do próprio Fiagro – sendo oportuno, ainda, que a disciplina dos Fiagro seja tratada juntamente com a revisão da Instrução CVM nº 472, que regula os FII, âmbito regulatório dentro do qual os Fiagro pretendem ser incluídos.
A criação dos Fiagro é, de fato, um importante passo para o desenvolvimento do agronegócio. Mas depende de diversos passos (legislativos e regulatórios) até se tornar uma realidade para o mercado.
*William Koga é formado em Direito pela Universidade Federal do Paraná, mestre em Desenvolvimento Econômico pela mesma instituição e sócio do escritório Koga Advogados.
Fonte: Valor