Depois de figurar por dois anos no topo do fornecimento de trigo ao Brasil, os Estados Unidos devem perder força em 2015 no mercado local. Uma das maiores importadoras do cereal do mundo, a indústria brasileira tende a se abastecer quase que em sua totalidade no Mercosul, em especial na Argentina.
Na última semana, o país vizinho elevou sua estimativa para a safra 2014/15 de trigo para 13,9 milhões de toneladas, ante as 13 milhões de toneladas previstas anteriormente. Considerando a existência de estoques iniciais de 2 milhões de toneladas, a oferta exportável do cereal no país vizinho – com manutenção de estoques nos mesmos volumes ao fim do ciclo – está estimada em 7,9 milhões de toneladas, segundo o presidente do Moinho Pacífico, Lawrence Pih.
“O Brasil deve se abastecer dentro do Mercosul. Ainda há uma oferta de cerca de 1 milhão de toneladas do Uruguai”, disse o empresário, dono de um dos maiores moinhos da América Latina.
Na estimativa mais conservadora, a Argentina deve ter um excedente exportável de até 7 milhões a ser embarcado entre janeiro e dezembro deste ano. Há pelo menos três anos-safra o país vizinho não tem uma sobra tão significativa. Conforme a consultoria Safras & Mercado, a última safra em que a Argentina embarcou volumes robustos foi em 2011/12 (de dezembro de 2011 a novembro de 2012), de 11,7 milhões de toneladas. Nas duas temporadas seguintes – 2012/13 e 2013/14, as exportações se limitaram a 3,250 milhões e 2,5 milhões de toneladas, respectivamente.
Nos últimos anos, o Brasil teve que buscar trigo fora do Mercosul para atender seu consumo interno. Isso ocorreu porque o excedente de cereal na Argentina era pequeno, reflexo de problemas climáticos e da redução do plantio pelos produtores do país devido às sucessivas interferências do governo da presidente Cristina Kirchner no mercado.
Por conta da menor oferta no Mercosul, nos anos de 2013 e 2014, o governo brasileiro isentou a importação de trigo de fora do bloco do pagamento da Tarifa Externa Comum (TEC), de 10%. Com isso, a importação de trigo americano atingiu 3,475 milhões de toneladas em 2013 – ante 2,539 milhões de toneladas adquiridas da Argentina no mesmo ano. Em 2014, foram 2,639 milhões de toneladas dos Estados Unidos e 1,569 milhão de toneladas da Argentina.
Desde o início da atual safra no país vizinho, em dezembro passado, o governo Kirchner liberou licenças para exportação de cerca de 2,2 milhões de toneladas do cereal. A sinalização dada na última semana pelo governo do país vizinho é de que pode autorizar embarque de um volume adicional entre 4 milhões e 5 milhões de toneladas.
O Brasil deve precisar comprar em 2015 ao menos 6,5 milhões de toneladas para atender sua demanda interna, na casa dos 11 milhões a 12 milhões toneladas anuais. Estimativa feita em dezembro pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) aponta uma produção de 5,9 milhões de toneladas do cereal no país, aumento de 6,8% ante 2013, apesar de um avanço de 23,6% de área na mesma comparação.
A necessidade de importação, porém, pode ser ainda maior devido aos problemas enfrentados no Rio Grande do Sul, onde as chuvas levaram à contaminação do cereal com micotoxinas. Isso inviabilizou o uso do cereal para a panificação, segmento que demanda metade do trigo consumido no Brasil. Para Claiton Luiz dos Santos, da TS Corretora, de Passo Fundo (RS), o Brasil pode ter que importar 7,1 milhões de toneladas no ano-safra 2014/15, que se encerra em junho.
Desse volume, já foram importados quase 3 milhões de toneladas (incluindo 1,6 milhões dos Estados Unidos e 498 mil da Argentina). “Faltam 4 milhões de toneladas, e acredita-se que 90% venha da Argentina”, disse o corretor.
Dos outros países do Mercosul, Santos estima que estarão disponíveis no mercado 620 mil toneladas de trigo do Paraguai e 450 mil toneladas do Uruguai.
Fonte: Valor Econômico