Algodão: manejo inadequado e falta de monitoramento nas lavouras podem elevar ataques do bicudo

"Dependendo da infestação, o inseto-praga pode limitar a cotonicultura se boas práticas de manejo não forem adotadas.", orienta o entomologista do IMAmt, Miguel Soria
“Dependendo da infestação, o inseto-praga pode limitar a cotonicultura se boas práticas de manejo não forem adotadas”, orienta o entomologista do IMAmt, Miguel Soria

Ataques do inseto conhecido como bicudo-do-algodoeiro (Anthonomus grandis) podem causar perdas de até 100% da produção de algodão, se o manejo da praga não for realizado da maneira correta na lavoura, fato que é favorecido pela falta de monitoramento no campo. O alerta é do entomologista e pesquisador do Instituto Mato-grossense de Algodão (IMAmt), Miguel Soria.

“Dependendo da infestação, o inseto-praga pode limitar a cotonicultura se boas práticas de manejo não forem adotadas. É preciso conformidade quanto ao manejo a nível regional, pois se um agricultor não fizer o controle adequadamente na sua lavoura, o inseto pode se dispersar e atacar também a lavoura daquele produtor que  faz o manejo correto do bicudo”, explica o especialista.

Conforme Soria, o manejo adequado inclui ações de combate à praga em todas as etapas: na pré-safra, durante a safra e na pós-safra (entressafra).

“Orientamos até mesmo para que o transporte da produção seja feita de maneira adequada, para que  não ocorra o derramamento de algodão em caroço nas estradas. Emitimos alertas e fazemos recomendações de medidas importantes de combate à praga ao longo do ano agrícola, por meio de circulares/notas técnicas, reuniões e treinamentos.”

Em Mato Grosso, a praga é encontrada em todos  os núcleos de produção em níveis de infestação variáveis. O Estado é, atualmente, o maior produtor brasileiro de algodão do país.

Apesar da preocupação, os agricultores mato-grossenses já estão habituados a lidar com  a praga e as perdas deste ano não devem passar dos 5%, até o final da atual safra (2013/2014), segundo prevê o diretor executivo do IMAmt, Alvaro Salles.

“Temos realizado ações no Mato Grosso desde quando o IMAmt foi criado (em 2007). O primeiro caso de ataque do bicudo no Brasil, originário nos Estados Unidos, ocorreu em 1983, em São Paulo (na região de Campinas). Hoje, este inseto é a principal praga que ataca o algodoeiro em todo o Brasil”, salienta Salles. “O bicudo foi responsável por dizimar os algodoeiros algodoais dos estados do Paraná, São Paulo e do Nordeste”, informa.

 

“Hoje, o bicudo é a principal praga que ataca o algodoeiro no Brasil”, informa o diretor executivo do IMAmt, Alvaro Salles
“Hoje, o bicudo é a principal praga que ataca o algodoeiro no Brasil”, informa o diretor executivo do IMAmt, Alvaro Salles

De acordo com o diretor do IMAmt, o órgão tem fornecido informações aos cotonicultores (leia abaixo), por meio de circulares e notas técnicas,  orientando no combate  ao bicudo.

“Nosso monitoramento e orientação têm sido constantes, em especial nas regiões que chamamos de Núcleo Sul, no município de Rondonópolis e vizinhos; e Núcleo Centro, em Campo Verde. Nas duas localidades, os casos de ataques deste inseto têm sido mais preocupantes”, destaca Salles.

Outro fato ressaltado pelo entomologista do Instituto é de que o cultivo de algodão Bt (geneticamente modificado) não implica que o monitoramento de pragas na lavoura (o que inclui o bicudo) possa ter seu rigor diminuído ou seja abandonado.

“As tecnologias Bt de algodoeiro têm como alvo de controle apenas espécies de lagartas-praga; é preciso ficar claro que o bicudo e espécies sugadoras de pragas não são alvo de controle do algodão Bt, o que sempre demandará o uso de táticas de controle cultural e por meio de inseticidas químicos respaldado pelo monitoramento”, explica.

Para levar mais detalhes sobre o problema fitossanitário, entre outros que incidem a cotonicultura no Mato Grosso, o IMAmt realizará no sábado, dia 21 de junho, o Dia de Campo do Algodão, no município de Campo Verde. Na mesma ocasião, o Instituto fará o lançamento comercial de novas variedades de algodão para o plantio da safra 2014/2015.

 

OUTRAS REGIÕES

Os ataques do bicudo-do-algodoeiro não são exclusividade do Mato Grosso – hoje,  são constatados em todos os estados brasileiros. A região do Vale do Paranapanema, no Sudoeste do Estado de São Paulo, por exemplo, está em alerta.

Por lá, especialistas mais pessimistas estimam que as perdas da safra 2014/2015 podem chegar a 50%, principalmente em relação às negociações do algodão, já que os produtores têm gastado mais dinheiro com a aplicação de defensivos agrícolas. Em relação à safra anterior, é prevista uma elevação de 10% nos custos de produção.

Para alertar sobre o problema na região, a Associação Paulista dos Produtores de Algodão (APPA) lançou o Projeto Bicudo, com o objetivo de orientar os cotonicultores associados. Informações pelo site www.appasp.com.br.

Em Mato Grosso do Sul, Estado onde o ataque de bicudo também é comum, relatório da Associação Sul-Mato-Grossense dos Produtores de Algodão (Ampasul), divulgado no último dia 4 de junho, aponta o bom desenvolvimento e adequado controle das pragas e doenças em áreas onde a colheita e destruição de soqueira ainda não foram realizadas.

Apesar de ter um cenário melhor, a Ampasul registrou sua preocupação com as principais pragas e doenças que atacam as lavouras em todos os estágios da cultura, como o bicudo, lagartas e fungos.

 

COMO SURGE E SE REPRODUZ

De acordo com a Circular Técnica n° 3/2013 do Instituto Mato-grossense do Algodão, estima-se que, em 2012, o bicudo causou uma perda (incluídos gastos com controle e perdas médias) de US$ 70 a US$ 130 por hectare no País. Naquele mesmo ano, a praga foi uma ameaça à exportação de até 1,06 milhão de toneladas de pluma, o que correspondeu a US$ 2,12 bilhões, considerando a arroba a US$ 30.

 

Ciclo biológico da reprodução do bicudo no algodoeiro
Ciclo biológico da reprodução do bicudo no algodoeiro

 

O bicudo é caracterizado, segundo o IMAmt, por seu elevado potencial reprodutivo e de destruição de estruturas reprodutivas da planta (alimenta-se de botões florais, flores e maçãs, e passa as fases de ovo, larva e pupa no interior das mesmas, o que dificulta seu controle); por estar associado aos restos culturais (continua a se alimentar e se desenvolver em estruturas reprodutivas remanescentes na área de cultivo após a colheita); e por ter a capacidade de, facultativamente, entrar em dia-pausa (estado de dormência reprodutiva/fisiológica) em áreas de vegetação durante a entressafra, sobrevivendo a condições desfavoráveis do ambiente nesse período (clima, abrigo e alimento).

No estágio adulto, o bicudo é um besouro com comprimento médio de sete milímetros, cuja coloração varia entre vermelho-pardo, castanho e cinza. Tem um rostro (espécie de bico) alongado, fino e encurvado, com comprimento correspondente à metade do corpo, onde ficam as antenas. Como principais características, apresenta dois esporões (tipo de espinhos) no primeiro par de pernas e tem o corpo recoberto por pelos de coloração amarelada.

O bicudo se alimenta e deposita seus ovos em botões florais, deixando suas marcas (perfurações e sinais) que evidenciam o ataque. Podem ainda se alimentar de flores e maçãs, também ovipositando nestas últimas estruturas.

Em uma safra, de acordo com o IMAmt, “não é raro ocorrer até sete gerações da praga em um mesmo talhão; com o plantio escalonado do algodão em uma região, o número de gerações pode ser ainda maior, já que o crescimento populacional tende a ser geométrico caso nenhuma atitude de controle eficaz seja adotada”.

 

SOBRE O MANEJO EM MATO GROSSO

Quanto ao manejo do algodoeiro, o IMAmt orienta o cotonicultor a:

1) Cumprir e zelar pelo cumprimento do vazio sanitário nos meses de outubro e novembro, no Estado do Mato Grosso. Neste período, ficam proibidos o cultivo de algodão e a presença de soqueiras, tigueras ou rebrota;

2) Instalar armadilhas de tipo Hardee iscadas com feromônios grandlure 60 dias antes do início do plantio, nas adjacências/bordaduras dos talhões que serão cultivados com algodão, para determinação do número de bicudos capturados por armadilha por semana, definição da zona de infestação e determinação do número de aplicações no primeiro botão floral;

3) Concentrar a semeadura na região (30 a 40 dias), necessariamente, entre talhões vizinhos, reduzindo assim a possibilidade de migração/dispersão do bicudo;

4) Aplicar defensivos agrícolas de forma adequada;

5) Eliminar plantas tigueras (voluntárias) de algodoeiro nas áreas cultivadas (áreas em rotação com soja e milho), algodoeiras e sedes das fazendas e/ou às margens de rodovias e carreadores;

6) Verificar o aparecimento de rebrotas das soqueiras e de plantas tigueras em algodoais, lavouras de soja e milho cultivados sobre soqueira de algodão. Se aparecer, eliminá-las de forma adequada;

7) Iniciar o monitoramento quando da emissão dos primeiros botões florais, com o intuito de identificar reboleiras de infestação. A partir daí, monitorar no mínimo 250 botões por talhão – 2,5 botões/ha (um botão/planta) para sintomas de alimentação e oviposição do bicudo;

8) Observar o nível sugerido de controle do bicudo para aplicação em área total, que deve ser, no máximo, de 3% a 5% de botões preferidos (com 6 mm de Ø) atacados (com sinais de alimentação e/ou oviposição);

9) Definir, cuidadosamente, as aplicações de defensivos agrícolas. Caso haja ocorrência de bicudo em reboleiras dentro do talhão, podem ser definidas aplicações localizadas em seu raio de ação. Para casos com mais de dois focos (independentemente da intensidade da infestação), sugere-se o tratamento com inseticidas na área total;

10) Realizar de três a cinco aplicações sequenciais de defensivos agrícolas, em caso de surgimento do primeiro capulho (“cut out”), a cada cinco dias, de maneira a coincidir com a aplicação de desfolhantes/maturadores/dessecantes;

11) Realizar uma colheita rápida e bem feita;

12) Destruir imediatamente a soqueira, seja mecânica ou quimicamente, no máximo 15 dias após o início da colheita;

13) Tomar cuidado especial com o transporte de algodão em caroço; cobrir completamente o fardo com lona, evitando-se a queda/dispersão de algodão em caroço nas margens de estradas e rodovias;

Para medidas complementares, acesse aqui a Circular Técnica nº 03/2013 do IMAmt.

 

Por equipe SNA/RJ

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