A Lavoura Online: mistura de óleos essenciais é alternativa para dieta de animais

Mix de plantas aromáticas também serve para a elaboração de produtos à base de carne de frango. Foto: Antonio Scarpinetti/Divulgação Jornal Unicamp

Por ser um alimento altamente perecível, a carne de frango e os produtos dela derivados são comumente passíveis de contaminação por salmonela (cujo nome científico é Salmonella), além de facilmente suscetíveis à perda de qualidade devido ao processo de oxidação lipídica.

A utilização de antibióticos e antioxidantes sintéticos no enfrentamento desses problemas tem sido a prática comum na indústria de alimentação animal e humana.

Os rigores, entretanto, cada vez maiores das regulamentações internacionais e mesmo nacionais, que proíbem ou restringem a utilização de aditivos sintéticos na produção alimentícia, e a conscientização crescente dos consumidores, em decorrência das mudanças nos contextos socioeconômicos e culturais, têm aumentado progressivamente a demanda por produtos mais naturais e que tendem a oferecer menores riscos à saúde.

Esses fatos têm levado a indústria alimentícia à utilização de componentes alternativos aos sintéticos. E no Brasil, que se tornou há mais de dez anos o maior exportador e segundo produtor mundial de carne de frango, apenas superado pelos Estados Unidos, essa preocupação assume particular importância, principalmente depois de a Operação Carne Fraca, deflagrada em março de 2017, ter colocado em questão a seriedade e a competência das grandes empresas exportadoras brasileiras.

Nesse contexto, as plantas aromáticas e seus óleos essenciais, que possuem pluralidades de atividades, constituem uma possibilidade de uso na ação antimicrobiana e antioxidante tanto nas dietas dos animais como na elaboração de produtos cárneos.

ANTIMICROBIANOS NATURAIS

Em trabalho desenvolvido junto à linha de pesquisa mantida pela bióloga Marta Cristina Teixeira Duarte – pesquisadora do CPQBA-Unicamp e professora credenciada junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciências de Alimentos da Faculdade de Ciências de Alimentos (FEA) da Universidade de Campinas –, que tem como foco a busca de novos antimicrobianos naturais a partir de plantas medicinais aromáticas, a zootecnista Adriana Nogueira Figueiredo utilizou uma mistura de dois óleos essenciais.

O objetivo foi obter um produto alternativo aos antibióticos e, portanto, com efeito antissalmonela, e que também atuasse como antioxidante, propiciando ampliação do tempo de vida útil da carne, quando adicionado à alimentação de frangos.

Levando em conta as reconhecidas múltiplas funções dos óleos essenciais, a pesquisadora partiu da hipótese de que uma mistura de óleos essenciais provenientes das espécies aromáticas tomilho (Thymus vulgaris) e alfavacão (Ocimum gratissimum) poderiam exercer ação em frangos de corte tanto para o controle da salmonela (atividade antibacteriana) como da oxidação lipídica da carne (atividade antioxidante).

Zootecnista Adriana Figueiredo (à esquerda), autora do estudo, e bióloga Marta Cristina Duarte, professora e coordenadora da linha de pesquisa da Unicamp: encapsulamento de óleos essenciais em produtos cárneos rendeu patente. Foto: Antonio Scarpinetti/Divulgação Jornal Unicamp

ELABORAÇÃO DE ALMÔNDEGAS

Diante dos bons resultados, a mesma composição de óleos essenciais foi também adicionada na elaboração de almôndegas, em substituição aos antioxidantes sintéticos, produzidas segundo processos industriais a partir das carnes moídas de peito e de sobrecoxa dos animais, cortes selecionados por se distinguirem na quantidade de gordura.

A mistura dos óleos essenciais encapsulados nesses produtos cárneos revelou-se verdadeiramente eficaz e esse novo processamento foi patenteado mesmo antes da conclusão do doutorado da pesquisadora.

Professora da Unicamp, a bióloga Marta Cristina Teixeira Duarte destaca a importância do trabalho quando se sabe da tendência cada vez maior da substituição de produtos sintéticos antimicrobianos e antioxidantes por produtos naturais na indústria alimentícia.

No caso dos antimicrobianos, ela lembra o perigo crescente de resistência aos antibióticos pelo seu uso indiscriminado em vários segmentos, o que aponta na necessidade de desenvolvimento de antibióticos cada vez mais potentes.

AÇÃO ANTISSALMONELA

Para verificar a ação antissalmonela da mistura dos óleos essenciais utilizados, Adriana inoculou em pintinhos, com três dias de vida, salmonelas resistentes coletadas de aves contaminadas. Esses animais foram, então, divididos em grupos e alimentados durante 21 dias com ração, que recebeu a adição da mistura encapsulada dos óleos, para facilitar a homogeneização e evitar perdas por volatilização.

Cada um dos grupos recebeu ração com uma determinada concentração da blenda para comparação dos resultados inclusive com o grupo de controle, alimentado com ração padrão.

Periodicamente, animais desses grupos eram abatidos para que pudessem ser obtidas as respectivas curvas de variação das salmonelas por meio da coleta das excretas e do conteúdo do ceco das aves, parte final do intestino em que estas proliferam.

Verificou-se, então, que os óleos essenciais efetivamente diminuíram o crescimento das salmonelas durante o período experimental bem mais do que ocorria na situação de controle, chegando essa diminuição a ser mil vezes menor.

AÇÃO ANTIOXIDANTE

Considerando que a literatura indica que esses mesmos óleos essenciais também exercem efeito antioxidantes, as pesquisadoras resolveram testá-los no frango durante o seu crescimento e depois do abate até chegar ao consumidor, de modo a abranger toda a cadeia produtiva.

À ração das aves, para tanto, foi adicionada a mesma mistura de óleos essenciais encapsulados, fornecida durante 35 dias até o abate. Nesse período, mediu-se o efeito antioxidante em dois cortes de frangos: o peito e a sobrecoxa, ou seja, partes com menor e maior quantidade de gordura.

Os resultados mostraram que os óleos essenciais retardaram a oxidação lipídica da carne e que seus efeitos foram mais efetivos na sobrecoxa, porção mais rica em lipídios. Os ensaios se estenderam até sete dias depois do abate, período em que a carne comercializada permanece na geladeira, e os resultados foram melhores, quando comparados com a adição do antioxidante sintético à ração.

PATENTEADA AÇÃO NO PRATO PRONTO

Restava testar ainda qual o efeito antioxidante da mesma mistura de óleos essenciais encapsulados, quando utilizada em substituição aos antioxidantes sintéticos, em almôndegas feitas com peito e sobrecoxa de frangos do grupo de controle, ou seja, de aves criadas com ração padrão, sem antioxidantes.

As almôndegas foram preparadas com carne moída de peito e sobrecoxa e temperadas, segundo processos industriais convencionais, e receberam a adição dos óleos encapsulados e foram então avaliados os efeitos protetores nessas almôndegas antes e depois do cozimento.

A professora Marta Cristina considera os resultados de extrema importância: “A substituição do antioxidante sintético pelo natural é totalmente viável. A mistura encapsulada utilizada tem ação efetiva quando adicionada na alimentação do frango de corte, mas, principalmente na fabricação de produtos cárneos, o que nos levou a patentear o processo”.

Embora tenham sido também produzidas almôndegas a partir dos mesmos cortes oriundos de frangos que já tinham recebido a blenda na ração, os efeitos mostraram-se muito superiores quando a mistura é adicionada diretamente à carne processada.

CUSTOS

Embora as ervas utilizadas para a extração dos óleos essenciais sejam muito baratas, os processos de extração e encapsulamento os encarecem, e os custos ainda não os fazem competitivos com os antioxidantes sintéticos.

“O apelo de produto natural, uma exigência cada vez maior em decorrência do aumento da consciência do consumidor, obriga a indústria alimentícia à oferta de produtos livres de aditivos sintéticos, pressionada inclusive por regulamentações legais progressivamente mais rigorosas e lideradas por países centrais”, afirma a zootecnista Adriana Figueiredo, autora do estudo de encapsulamento de óleos essenciais em produtos cárneos.

Fonte: Jornal Unicamp com edição d’A Lavoura

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