A árdua missão da ministra Tereza Cristina nos EUA

Às vésperas da visita do presidente da República, Jair Bolsonaro, aos EUA, o Ministério da Agricultura ainda tenta convencer o Departamento de Agricultura americano a reabrir seu mercado à carne bovina in natura do Brasil.

No setor privado, há grande esperança de que o maior alinhamento entre o presidente brasileiro e o americano Donald Trump facilite as negociações, que se arrastam há quase dois anos. No entanto, sinais emitidos por autoridades americanas indicam que a reabertura pode demorar mais.

A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, integrará a comitiva do presidente Bolsonaro, que viaja no próximo dia 17 de março a Washington, e terá a árdua missão de negociar a reabertura do mercado americano, que havia sido prometida, mas não cumprida, por seu antecessor, Blairo Maggi.

Em entrevista concedida em seu gabinete ao Valor, a ministra disse nutrir esperanças de que esse comércio seja restabelecido ainda neste ano. Mas ela preferiu não fazer qualquer previsão de datas para evitar uma eventual frustração por parte dos frigoríficos, que esperavam ter voltado a exportar carne bovina in natura aos EUA ainda em 2018.

Durante a visita a Washington, há a expectativa, ainda não confirmada, de um encontro de Tereza com Sonny Perdue, o secretário de Agricultura dos EUA. Nos bastidores, há quem diga que o americano não estará na capital do país, o que indica a dificuldade das negociações. Não seria a primeira a vez. Perdue já cancelou encontros e até conferências telefônicas com o ex-ministro Maggi.

Para Tereza, o sucesso na empreitada depende de outras negociações em torno da pauta agrícola brasileira com os EUA.

O Brasil pretende pedir uma cota maior de exportação do açúcar brasileiro ao país, abertura do mercado americano para o melão e frutas cítricas brasileiras e o reconhecimento pelos americanos de todo o território do Brasil como zona livre de febre aftosa com vacinação.

Atualmente, Washington reconhece apenas 14 estados brasileiros como livres de aftosa, enquanto a Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) reconhece todo o território nacional como livre do vírus desde 2018.

Ao Valor, a ministra afirmou que, por parte de Washington, também há uma pauta de quatro produtos prioritários, chamada pelos próprios americanos de “assuntos irritantes” e cujas exportações ao Brasil eles desejam alavancar ou destravar: carne suína, açúcar, etanol e trigo.

Depois da eleição de Bolsonaro, os EUA voltaram a pedir ao Itamaraty uma cota de 750.000 toneladas isenta de tarifa para o trigo americano. Washington também deseja o fim do limite às exportações de etanol livre de tarifas. Atualmente, há uma cota de 600 milhões de litros, que vai expirar em setembro.

“Eles querem que a gente abra esses mercados. Não tem expectativa nenhuma até agora. Tudo vai depender do que eles vão pedir. Vão colocar os interesses deles e nós vamos colocar na mesa vários assuntos também, inclusive a reabertura para nossa carne”, disse a ministra.

No caso da carne bovina in natura, o Ministério da Agricultura e os frigoríficos exportadores já tratavam como resolvidas as negociações no âmbito técnico com as autoridades americanas, só restando a decisão política, os pecuaristas dos EUA fazem pressão contrária.

Segundo uma fonte do setor privado, o Brasil já respondeu a todos os questionários feitos pelos americanos e corrigiu as falhas do sistema sanitário que provocaram o embargo à carne bovina, em junho de 2017.

Na ocasião, os americanos detectaram abscessos (acúmulo de pus) no produto brasileiro. No Brasil, o problema foi associado à reação dos bovinos à vacina contra o vírus da febre aftosa. Para resolver esse problema, o Ministério da Agricultura reduziu a dose a e alterou a composição da vacina.

Mesmo com todas as respostas de Brasília, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos passou a sinalizar a possibilidade de novos obstáculos técnicos que, até o ano passado, não estavam no radar. Segundo uma fonte do governo brasileiro, Washington sinalizou recentemente que ainda poderá enviar uma auditoria de técnicos de seu serviço sanitário em abatedouros brasileiros antes de efetivar a reabertura.

Um negociador do governo também afirmou que, até agora, somente o Brasil tem dado declarações mais firmes de que está disposto a ceder em negociações com os EUA, enquanto o mesmo ainda não está claro do lado americano.

Mesmo em busca da abertura do mercado americano, a ministra minimizou o potencial dele. “Nunca tivemos muita esperança de exportar carne in natura para os Estados Unidos. Vender carne bovina para lá é grife, não é volume. Tudo que pudermos vender para qualquer país do mundo é muito bom, mas a gente sabe que exportar carne aos EUA, que têm um rebanho grande, é complicado”, afirmou Tereza.

Para os frigoríficos brasileiros, porém, os EUA são um destino estratégico para equacionar as vendas dos diferentes cortes de carne. Ocorre que no mercado doméstico há grande consumo dos cortes do traseiro bovino, mas sobra de cortes do dianteiro, que são demandados nos EUA para a produção de hambúrguer.

 

Valor Econômico

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