Bradesco quer avançar em crédito ao produtor com E-agro

Não satisfeito em ser o maior banco privado em concessão de crédito ao agronegócio, com mais de R$ 100 bilhões aplicados no setor, o Bradesco quer abocanhar uma fatia das transações financeiras hoje feitas por indústrias de insumos, revendas e cooperativas com produtores rurais. Para ter espaço nesse universo de operações que superam R$ 600 bilhões ao ano no País, criou o E-agro, o primeiro “marketplace” com oferta de produtos e de serviços financeiros para o agricultor.

“Mais de 95% do dinheiro disponível no setor vem dos bancos, seja por meio de recursos livres ou subsidiados. O restante vem dessa relação entre produtores e empresas, que ao longo do tempo precisou ser criada para aumentar o financiamento, mas cuja construção não faz parte do core das companhias”, disse ao Valor o Vice-Presidente do Bradesco, José Ramos Rocha Neto.

Agilidade do digital

Uma das mais relevantes dentre essas operações é o “barter”, que envolve a troca de insumos por colheitas futuras.

O lançamento do E-agro não significa que o banco queira eliminar as operações de “barter” ou os empréstimos via revendas e cooperativas. “Queremos ser complementares, trazendo para o sistema financeiro as duas pontas das negociações, ofertando taxas diferenciadas e com a rapidez do digital”, disse Roberto França, Diretor de Agronegócio do Bradesco.

Soluções de crédito

Desenvolvido em parceria com o Inovabra, ambiente de inovação do Bradesco, e com a IBM Consulting, a plataforma funciona como um ecossistema, que oferece soluções de crédito para produção agrícola, pecuária, empréstimo pessoal, modalidades de seguros, produtos como máquinas e equipamentos, ferramentas de gestão agrícola e de sustentabilidade. Também permite contratação de Cédula de Produto Rural (CPR) de forma totalmente on-line.

“Na semana passada, uma operação de CPR de R$ 2.3 milhões foi feita em seis horas, sem que o cliente tivesse que ir ao banco. É inédito”, disse Nadege Saad.

Em um movimento atípico do Bradesco, a executiva foi contratada no mercado para ser a chefe do E-agro. “Precisávamos de alguém com expertise em agronegócio, “marketplace” e sistema financeiro”, disse Rocha. A executiva já trabalhou na Monsanto, Agrify e em outros setores.

54 Bilhões em crédito pré-aprovado

Neste momento, o E-agro tem R$ 54 bilhões em crédito pré-aprovado, com expectativa inicial de atender 2 milhões de clientes, principalmente pequenos e médios produtores, com operações entre R$ 20.000,00 e R$ 5 milhões. O tíquete médio esperado por evento é de R$ 150.000,00.

“A intenção é ir aos poucos até o agricultor bem pequeno, que poderá comprar três sacas de fertilizantes, emitir uma CPR e ter o dinheiro em conta e poucos minutos”, disse Rocha.

Sem dar detalhes, o executivo disse que o Bradesco está negociando com cooperativas agrícolas e de crédito para que façam parte da plataforma, e a “aceitação tem sido ótima”. Segundo França e Nadege, é possível criar um ambiente exclusivo para cooperativas dentro do E-agro.

Produto transacional com crédito integrado

A executiva disse que a indústria também tem acolhido bem a iniciativa do Bradesco, apesar de a área de insumos ter uma preocupação com a distribuição. “Mas vemos um movimento hoje de eles quererem integrar a distribuição com a gente. Em termos de tecnologia somos o único produto transacional com crédito integrado”.

Ainda em 2023, o E-agro começará ofertar crédito com recursos obrigatórios e, no ano que vem, crédito verde e ligado à sustentabilidade. “No futuro, nada impede que todo o portfólio do banco esteja na plataforma para atender o produtor”, disse França.

O Bradesco tem hoje como parceiras na plataforma as empresas de máquinas agrícolas Massey Ferguson, Jacto, Stara e Valtra. No setor de insumos e implementos agrícolas, tem parceria com Boa Safra Sementes, DSM | Tortuga, Neogen, Nitro e Latina Seeds, Cibra, Jumil, KWS Sementes e Tecnomyl e, no de serviços, Agrosmart e Sapiens Agro. A previsão é ter mais de 50 parceiros na plataforma até o fim deste ano.

Banco prevê retomada de financiamentos

A escassez cada vez maior de recursos do governo e as taxas de juros elevadas têm provocado uma retração nos investimentos na agropecuária. Mas o Vice-Presidente do Bradesco, Jose Ramos Rocha Neto, enxerga uma retomada do ânimo a partir do 3º trimestre, com a inflexão da Selic. “Na safrinha, acredito que teremos taxas menores e com tendência de queda, o que deve incentivar a retomada de empréstimos com recursos livres”, disse, se referindo à segunda safra de milho.

Setor robusto e resiliente

Além disso, afirmou, o setor é robusto e resiliente e continuará a se expandir. “Nos últimos 20 anos, as taxas subiram e desceram muitas vezes e o agronegócio continuou a crescer. Por isso estamos otimistas e investindo ainda mais no segmento com ações como o E-agro [leia mais acima].”

Para o Diretor de Agronegócios do banco, Roberto França, o Plano Safra 2023/24 terá os R$ 400 bilhões solicitados pelo setor, mas esses recursos vão atender entre 40% e 50% da necessidade dos produtores. “O financiamento do agro já vai muito além de linhas subvencionadas. Só os 25% do depósito à vista dos bancos devem somar uns R$ 300 bilhões”.

O “funding” virá das Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), Cédula de Produto Rural (CPRs), Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) e Certificados de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCAs) e Fiagros. No caso do Bradesco, dos R$ 100 bilhões em sua carteira total de agro, dois terços são empréstimos com recursos próprios do banco.

Embora considerem que os financiamentos atrelados a critérios ESG (boas práticas ambientais, sociais e de governança) sejam uma tendência, os executivos do Bradesco dizem que taxas de empréstimos ainda estão mais vinculadas à capacidade de pagamento do tomador. Na ponta do investidor, também se procura o que é mais remunerador. “Mas vem crescendo o interesse”, resumiu Rocha.

O Bradesco, segundo o executivo, é interessado nas ações ESG desde seu nascimento nos anos 1940. “Temos a Fundação Bradesco desde 1956, quando ninguém falava em questões sociais. E simplesmente não emprestamos dinheiro se há qualquer restrição ambiental com o cliente”, disse.

Para garantir a comprovação de boas práticas sociais e ambientais, o banco usa ferramentas como monitoramento com geolocalização, informações das Secretarias de Agricultura e do Ministério do Trabalho. E aguarda que o Cadastro Ambiental Rural (CAR) tenha seus instrumentos de checagem modernizados, disse ele.

Fonte: Valor
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